
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, voltou a defender a necessidade de uma transição energética justa e planejada, reconhecendo que o Brasil enfrenta “desafios e contradições” ao buscar reduzir a dependência dos combustíveis fósseis sem provocar um colapso energético. Em entrevista ao Globo, durante a abertura da COP30, em Belém, Marina afirmou que é preciso “usar parte do lucro do petróleo para investir na transição energética”, destacando que o país deve transformar a Petrobras em uma empresa voltada à produção de energia limpa.
Questionada sobre o aval do governo à exploração de petróleo na Margem Equatorial, a ministra disse que a decisão deve ser vista dentro do contexto global. “Você dificilmente vai encontrar um país que não esteja vivendo desafios e contradições na transição energética. A França investiu muito em energia nuclear, e 60% de sua matriz energética é fóssil. A Europa passou a considerar o gás um combustível de transição”, afirmou.
Para Marina, o importante é que o Brasil use os recursos gerados pelo petróleo como instrumento de transformação. “Foi importante o presidente Lula dizer, na cúpula de líderes, que precisamos acabar com a dependência dos combustíveis fósseis. Não basta querer sair da dependência, temos que criar as bases para isso. É preciso usar parte do lucro do petróleo para investir em hidrogênio verde e energia eólica e solar. O Brasil está disposto a fazer isso pela justiça climática”, disse.
A ministra destacou que o país tem vantagem comparativa no processo global de transição. “O Brasil é o país com maior vantagem comparativa, por já ter matriz energética 45% limpa e matriz elétrica 90% limpa. O presidente tem dito que a Petrobras precisa deixar de ser uma empresa de exploração de petróleo e se transformar urgentemente numa empresa de produção de energia”, afirmou.
Marina reforçou que abandonar os combustíveis fósseis “por decreto” é inviável e poderia causar desequilíbrios severos na economia mundial. “Não é possível abandonar combustíveis fósseis por decreto, porque haveria um colapso energético global”, disse, ressaltando que o país deve liderar o esforço de diversificação e inovação energética.

Ao mesmo tempo, a ministra criticou duramente a aprovação no Senado de novos incentivos para usinas termelétricas movidas a carvão mineral, classificando a medida como um retrocesso.
“Foi um sinal na contramão dos esforços que precisam ser feitos. Todo o debate global é de acabar com os subsídios ineficientes à energia fóssil. Nem posso dizer que a votação foi açodada, porque ela só durou seis minutos. É um absurdo que algo com essa complexidade seja votado em seis minutos, às vésperas da realização do maior evento para o enfrentamento da mudança do clima”, afirmou.
Marina também fez críticas às mudanças recentes nas regras de licenciamento ambiental incluídas na mesma medida provisória. Segundo ela, o texto favorece empreendimentos de alto impacto sem análise técnica adequada.
“O que foi proposto é que a licença não precisará nem passar pelo Conselho de Governo. O projeto já será considerado estratégico quando se tratar de hidrelétrica ou reservatório. Isso tem endereço: o hidrograma de Belo Monte, as grandes barragens de rejeitos em Minas Gerais. São interesses que vão na contramão da sociedade e que põem vidas em risco”, alertou.
Para a ministra, a COP30 é uma oportunidade de consolidar um “mapa do caminho” global para a transição energética e o fim da dependência do petróleo. “Precisamos criar um mapa para chegar ao fim do desmatamento e do uso de combustíveis fósseis. É difícil? É. Tem posições contrárias? Tem. Mas se em Dubai fomos capazes de aprovar as metas, por que não aprovar agora um mapa do caminho?”, questionou.
Marina concluiu dizendo que o sucesso da conferência depende da capacidade dos países de assumir compromissos concretos e cooperativos. “Precisamos ajudar o mundo a atacar, de forma justa, as causas e os efeitos das mudanças climáticas. Atacar as causas significa sair da dependência do uso de combustível fóssil”, afirmou.