Lula e as mãos que fazem o Brasil

Atualizado em 10 de outubro de 2019 às 17:20

Quando três profissionais talentosos se encontram e trabalham no mesmo propósito, o resultado é perene. Ainda que não dividam o mesmo tempo nem que sequer tenham se conhecido. É o caso de Fernando Morais, biógrafo de Lula, que encontrou em Gilberto Freyre, que morreu em 1987, aos 87 anos,  as palavras precisas para um ensaio de Ricardo Stuckert, fotógrafo do ex-presidente.

Ele conhece Stuckert, mas não conviveu com Freyre, talvez o tenha entrevistado, nada além disso.

As mãos de Lula e do povo que abraça Lula inspiraram Stuckert, que inspirou Morais, que foi ao Facebook. Repórter com texto primoroso, ele mesmo poderia escrever sobre as imagens. Mas certamente viu que não é necessário quando outro já o fez, com precisão. Mas não é sobre Lula stricto sensu que Gilberto Freyre escreve — nem poderia ser, já que o texto é de 1926.

E seria sobre quem?

Sobre Lula, no sentido amplo. No sentido de que haveria um brasileiro que, depois daqueles agitados anos 20, haveria de conduzir o Brasil com soberania.

Veio Getúlio em 1930, e veio também Lula, ambos resultados das mãos que se entrelaçam. Primeiro, o texto, depois as fotos. Os brasileiros de alma entenderão que são praticamente a mesma coisa.

Segue o texto:

“Qualquer brasileiro poderá governar esse Brasil
lenhador
lavrador
pescador
vaqueiro
marinheiro
funileiro
carpinteiro
contanto que seja digno do governo do Brasil
que tenha olhos para ver pelo Brasil,
ouvidos para ouvir pelo Brasil
coragem de morrer pelo Brasil
ânimo de viver pelo Brasil
mãos para agir pelo Brasil
mãos de escultor que saibam lidar com o barro forte e novo dos Brasis
mãos de engenheiro que lidem com ingresias e tratores europeus e norte-americanos a serviço do Brasil
mãos sem anéis (que os anéis não deixam o homem criar nem trabalhar).
mãos livres
mãos criadoras
mãos fraternais de todas as cores
mãos desiguais que trabalham por um Brasil sem Azeredos,
sem Irineus
sem Maurícios de Lacerda.

Sem mãos de jogadores
nem de especuladores nem de mistificadores.
Mãos todas de trabalhadores,
pretas, brancas, pardas, roxas, morenas,
de artistas
de escritores
de operários
de lavradores
de pastores
de mães criando filhos
de pais ensinando meninos
de padres benzendo afilhados
de mestres guiando aprendizes
de irmãos ajudando irmãos mais moços
de lavadeiras lavando
de pedreiros edificando
de doutores curando
de cozinheiras cozinhando
de vaqueiros tirando leite de vacas chamadas comadres dos homens.
Mãos brasileiras
brancas, morenas, pretas, pardas, roxas
tropicais
sindicais
fraternais.
Eu ouço as vozes
eu vejo as cores
eu sinto os passos
desse Brasil que vem aí.”

Seguem as fotos:

E eu acrescento mais duas mãos: