Lula pode mesmo ser solto, e esta é uma questão de justiça e de inteligência. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 17 de junho de 2018 às 10:39
Dona Ivani, na Vigília, em frente a um cartaz de Lula

Lula pode ser solto no dia 26 de junho, caso a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal vote o pedido de efeito suspensivo apresentado pela defesa do ex-presidente.

Não é uma torcida, é a conclusão óbvia com base nos fatos e nos antecedentes de cada um dos cinco ministros que compõem aquele colegiado.

Quatro desses cinco ministros votaram a favor do habeas corpus a Lula na sessão no dia 4 de abril — quando Rosa Weber, mesmo contrariando sua consciência, negou o direito a Lula e abriu caminho para que ele fosse preso.

Rosa Weber não faz parte da segunda turma e nele estão os chamados ministros cascudos, aqueles que não tremem de medo da velha empresa — Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski.

Dias Toffoli é alinhado a Mendes e também votou pelo habeas corpus a Lula.

Fachin votou contra Lula na discussão do habeas corpus, e deve votar pela manutenção da prisão novamente, mas o simples fato de decidir levar a discussão para a Segunda Turma e não para o plenário do STF indica que algo mudou no comportamento dele.

Na opinião de alguns juristas, Fachin já deveria ter feito isso quando o habeas corpus de Lula foi apresentado.

Por esse entendimento, a segunda turma seria o juízo natural e competente para questões desse tipo.

Mas Fachin levou o HC de Lula ao plenário, porque ali Rosa Weber poderia ser convencida a negar o HC, como de fato negou, mesmo já tendo votado em outras oportunidades contra a prisão a partir de decisão de segunda instância.

Era um jogo de cartas marcadas: a prisão de Lula era uma exigência verbalizada por colunistas da TV Globo, notadamente Merval Pereira.

Se havia um plano de que, com Lula preso, ele morreria politicamente, o resultado mostrou que ocorreu o inverso.

O ex-presidente mostra vitalidade incomum em todas as pesquisas de intenção de voto. Seria este o motivo que levou Fachin a se render ao princípio do juízo natural e competente?

Jamais saberemos.

O que se tornou óbvio é que Lula é muito maior do que o cárcere na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.

Tentou-se de tudo para que Lula fosse esquecido, inclusive com a proibição judicial de que recebesse visitas.

Até o Prêmio Nobel da Paz Adolfo Pérez Esquivel foi proibido de visitar Lula.

Foi uma tentativa, não deu certo, e a Justiça se tornou mais flexível quando, aparentemente, percebeu que não conseguiria romper o cordão de solidariedade a Lula.

A força de Lula vem de muitos setores, mas nenhum deles deles é mais simbólico do que homens e mulheres anônimos que se mantêm em vigília na capital do Paraná.

Mulheres como uma senhora fotografada por Eduardo Matysiak, dona Ivani, militante da vigília. O cineasta Manoos Aristide viu a foto (que abre o texto, não é montagem) e escreveu.

O texto vale para dona Ivani, mas vale para muitas outra mulheres e homens que não arredam pé da vigília:

— Quando a vida nos presenteia com imagens que nos bate na cara e diz, — Veja, onde você está?  Veja o que esta acontecendo. Não, não  finja que pensa e isso não vai dar em nada. A esperança está entre as grades e o olhar solta na brisa do no frio que faz em Curitiba. A esperança de Dona Ivani derrama no seu rosto de vigília as orações que faltou para o povo e as partículas da névoa se agarram nos fios de bigode de uma mulher que, além da esperança, sonha com a liberdade. Quem é essa mulher? Não interessa saber quem é, o que interessa é ver e sentir essa foto de Eduardo Matysiak. Rostos que representam o povo e acredita da justiça.

Lula, como ideia, se tornou mais forte com a prisão. A liberdade dele, agora mais próxima, faz lembrar momentos épicos da história.

Sócrates, condenado à morte, não se intimidou com seus carcereiros em nenhum momento, e um deles narrou a um discípulo — diálogo registrado por Platão — que nunca havia visto um preso com tamanha confiança e esperança.

Sócrates disse a um dos discípulos, que chorava: “Pensa que Sócrates é isto?”, questionou, beliscando o próprio braço. “Engana-se”, acrescentou.

Paulo, fundador do Cristianismo, passou grande tempo na prisão e sorria quando lhe diziam que não sairia dali vivo. Sorria também quando lhe diziam que seria libertado.

Para ele, tanto fazia.

O homem, com a ideia do seu tempo, é indestrutível.

Assim se tornou Lula, muito mais pela truculência dos adversários.

Dia 26, se ainda resta um fiapo de luz nas pessoas que representam as instituições brasileiras, Lula será solto.

Primeiro porque, na sentença que o condenou, não há prova de culpa.

Mas, fundamentalmente, porque nenhuma cadeia no mundo pode conter pessoas com a estatura de Lula.