“Lula será protagonista absoluto nas eleições, seja condenado ou não”, diz jurista Carol Proner

Atualizado em 26 de dezembro de 2017 às 18:58
Carol Proner

Publicado no Brasil de Fato

A professora de direitos humanos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (URFJ), Carol Proner, organizadora de uma coletânea de artigos que analisam a sentença do caso do tríplex, veio especialmente a Porto Alegre (RS) para acompanhar as manifestações sociais contra as arbitrariedades no julgamento de Luiz Inácio Lula da Silva, que tramita no Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, na capital gaúcha.

Ela considera que independentemente do resultado do julgamento marcado para o dia 24 de janeiro, o ex-presidente será vitorioso. Em entrevista à Radioagência Brasil de Fato, a jurista observou ainda que o crescente apoio ao ex-presidente reflete a consciência popular a respeito de um processo jurídico “flagrantemente injusto”. Em sua opinião, há inclusive a possibilidade de não haver perseguição política no TRF4 e no TSE.

Leia a entrevista completa:

Brasil de Fato – Qual a sua perspectiva a respeito dos resultados de 24 de janeiro?

Carol Proner: O julgamento do TRF 4 é jurídico e pode gerar uma condenação em segunda instância que ainda estará sujeita a grau recursal. Podem ser embargos de declaração e embargos infringentes, e ainda cabe recurso no Supremo Tribunal Federal (STF). Uma coisa é o caso do triplex, que é o caso que está sendo julgado e que está mais avançado entre os vários processos contra o presidente Lula, e poderá, no primeiro semestre, alcançar uma condenação que pode gerar o pedido de impugnação a partir do registro da candidatura.

A partir de 15 de agosto, o rito perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é autônomo é próprio. Decorridos 5 dias do registro de candidatura, pode ser solicitada a impugnação. Mas há muitas possibilidades, como a dos partidos substituírem a candidatura 20 dias após o pleito. Significa que no dia 15 de agosto e 16 de setembro poderia haver substituição do pleito e Lula poderia participar dos programas eleitorais, caso fique evidente que a celeridade da Justiça é para impedi-lo de concorrer às eleições. Muitas coisas podem acontecer. Se há perseguição política no Judiciário, não necessariamente acontecerá no TRF 4, e não sabemos se acontecerá no TSE.

O PT afirma em documento divulgado na semana passada que 2017 é um marco na retomada de iniciativas políticas democráticas, e que a candidatura Lula deixou de ser apenas petista. Como a sra analisa isso?

A candidatura do presidente Lula pertence ao povo brasileiro. É importante separar o julgamento no TRF e a eventual condenação e impugnação de uma candidatura que apenas seria possível quando ele passar a ser candidato, o que vai acontecer em 15 de agosto quando haverá o registro da candidatura. Mas não importa o que aconteça, o PT acredita em sua inocência, e ele continuará sendo candidato.

Esse anúncio de antecipação no julgamento pelo TRF 4 fará com que forças políticas façam uma avaliação sobre os rumos da política eleitoral de 2018. Será possível a consolidação de amplos apoios não apenas por Lula ser o maior líder político do Brasil e pelos méritos de sua biografia, mas ele tem contra si um processo flagrantemente injusto que por si só já provocaria a união dos setores progressistas. Lula ocupará o protagonismo absoluto seja ele condenado ou não. Essa é uma realidade que o TRF 4 não poderá evitar, e que o sr. Sérgio Moro não poderá evitar.

A senhora poderia fazer um resumo didático sobre todo esse processo?

A sentença do chamado caso tríplex gerou muita perplexidade no mundo jurídico. É um caso realmente único, em todos os aspectos. As audiências, as provas geradas consideradas ilícitas, a detenção do ex-presidente Lula na chamada condução coercitiva por seis horas sem justificativa e amparo legal, as escutas ilegais relacionadas aos advogados e a conversa do ex-presidente Lula com a então presidente Dilma Rousseff, a negativa de destruição dessas escutas, inclusive do escritório de advocacia que defende o presidente e dos 25 a 30 advogados que ali trabalham. Se fosse um juízo justo, geraria nulidade processual.

Fora isso, notamos nas 238 laudas da sentença que quase 20%  são dedicados à defesa, por parte do juiz da causa, do uso de um direito excepcional. Em vez de fundamentar as medidas e o porquê da condenação sem provas, Sergio Moro se dedicou a explicar porque é importante expandir o direito, a capacidade de punição, a capacidade investigatória. São vários os abusos do magistrado, como condução de audiências com evidente pré-julgamento, publicidade seletiva para a mídia, muitas vezes antes mesmo do conhecimento dos advogados de defesa. Também a negativa de acesso a documentos do processo, negação de ouvir testemunhas para a construção de provas, violações de princípios básicos de defesa, além de delações premiadas também escandalosas.

Com todos esses absurdos jurídicos, e sem que a Justiça brasileira tome providências, há possibilidade de se apelar a cortes internacionais?

Uma sensação é comum aos professores e conhecedores de direito de outros países que acompanham tanto o impeachment da presidente Dilma Rousseff, quanto o julgamento contra o ex-presidente Lula. É um escândalo absurdo não compreendido. Diante de tanta arbitrariedade do sistema de Justiça, os advogados do ex-presidente Lula já estão recorrendo a cortes internacionais, principalmente o comitê de direitos civis e políticos das Nações Unidas que acompanham esses casos. Sem dúvida mancha a imagem do país.

É muito desagradável para quem trabalha no direito ter que chegar ao ponto de responsabilizar setores da Justiça, tentar explicar que o Judiciário pode estar equivocado ou inclusive participando de uma trama que envolve amplamente a crise institucional e politica que atinge o nosso país de forma tão brutal. Não é agradável para quem respeita a democracia, as instituições e o estado de direito. Estamos vivendo uma sentença que é apenas uma peça dessa arquitetura toda que tenta tirar um candidato forte das eleições, que poderia barrar o desmonte constitucional e econômico do país. Isso tem ficado cada vez mais evidente.