“Maior erro do governo Lula é não criar o Ministério da Segurança Pública”, diz Pedro Serrano

Jurista acredita que o novo ministério pode ajudar o governo federal no combate ao crime organizado

Atualizado em 25 de outubro de 2023 às 7:06
Pedro Serrano, professor da PUCSP. Foto: Reprodução/DCMTV/YouTube
Pedro Serrano, professor da PUCSP. Foto: Reprodução/DCMTV/YouTube

O jurista Pedro Serrano, professor na PUC-SP, defende a criação do Ministério da Segurança para articular uma solução mais efetiva no combate às organizações criminosas.

“Segurança Pública, quando você fala em crime organizado, envolve uma articulação nacional. Não tem como você combater sem articular nacionalmente”, falou ao programa DCM Ao Meio-Dia. Serrano acredita que o crime organizado atenta contra a soberania nacional e que não é responsabilidade somente dos governos estaduais.

Confira os principais trechos.

“O maior erro”

O problema é que a esquerda fica muito perdida em questões operacionais da segurança pública. Na política, você conversa com qualquer dirigente do PT hoje e o papo é só operacional.

Qual cargo? Qual negócio? O PT era uma usina de ideias há décadas atrás. Deixou de ser porque não há espaço para debate de ideias, inclusive com a sociedade civil.

Eu sei disso porque eu estou na sociedade civil. Tive alguma contribuição no debate de ideias, por exemplo, na questão dos crimes da Lava Jato. Após a eleição do Lula, não fui mais consultado para nada, absolutamente nada.

Não há espaço de diálogo. Vou colocar aqui o que eu tenho colocado há muito tempo desde o governo Dilma. É algo que falei pessoalmente com o vice-presidente [Geraldo] Alckmin quando ele ainda não era candidato a vice.

Quando o ministro Flávio Dino assumiu a pasta, eu me segurei um pouco, porque eu acho que ele é um grande quadro político e talvez não tivesse sentido naquele momento dividir o Ministério da Justiça.

Mas eu vou colocar claramente meu ponto de vista. Falei outro dia aqui com o secretário-executivo do Ministério da Justiça. É necessário criar o Ministério da Segurança Pública.

O maior erro que o governo Lula está fazendo é não ter criado ainda o Ministério da Segurança Pública. Porque segurança pública não é política repressiva apenas.

Ela não funciona. Só enxuga gelo se for uma política exclusivamente repressiva. A esquerda precisa parar com a postura de achar que é possível construir política de segurança pública sem repressão, ainda mais no estado em que o país está.

“Perda de soberania territorial”

Nosso país está perdendo soberania territorial para o crime organizado. O que é gravíssimo. O Estado precisa defender sua soberania interna. Soberania não é só externa. Soberania interna existe também.

Então há necessidade de aparato repressivo. Mas não se equaciona o problema de segurança só com aparato repressivo e experiências mostram isso. A experiência de Nova York que a direita sempre usou é um caso. Uma pesquisa mais profunda lá vai mostrar que não foi só repressão. Foi também política pública.

Na Colômbia, a mesma coisa. Ou seja, a segurança pública tem de ser uma política transversal no governo que não que atravessa apenas várias áreas, mas sim uma política transversal numa estrutura administrativa como é a do governo brasileiro.

Você só realiza se você tiver uma unidade imediatamente ligada ao presidente da República destinada a isso. No Ministério da Segurança você não consegue realizar política transversal sozinha. O ministro Dino está se esforçando imensamente e não está conseguindo articular uma política transversal na questão de segurança. 

Esse é o maior erro do governo Lula se você me perguntar. E nós progressistas vamos ser capturados por situações como a do Rio diversas vezes sem ter resposta. É esse o problema. Nós estamos sem resposta porque nós não fizemos a lição de casa.

A lição de casa é criar o Ministério da Segurança e, embaixo dele, uma comissão composta por representantes de diversos ministérios. O que tem a ver com o problema na economia, na educação, até no Ministério das Cidades é fundamental também para as Forças Armadas.

Você tem aí todo um espaço de diálogo que tem que se criar no interior do Ministério da Segurança. E precisa desenvolver a segurança como uma política transversal. Ela tem que implicar primeiro em racionalização do Direito Penal.

Nós estamos num país com poucos recursos, inclusive financeiros, de pessoal e de tudo. Em qualquer situação em que você tem poucos recursos, tem que priorizar o investimento. Se você dividir os inquéritos policiais do país pelo número de delegados, é impossível solucionar. É impossível humanamente. O número de inquéritos é muito maior do que a capacidade do nosso corpo policial, judiciário.

Ou seja, precisa haver racionalização. No Código Penal, nós precisamos combater prioritariamente o crime violento. Precisamos reduzi-los.

O problema aqui não é só desigualdade social. É uma política pública que se instaurou desde a década de 90 de encarceramento em massa, que levou a formar exércitos para o crime organizado.

Ou seja, por conta da política de combate às drogas, nós fizemos isso nós. Precisamos rever essa política, racionalizar urgentemente. 

A necessidade de uma “usina de ideias”

A segurança pública é um problema delicadíssimo. Algumas coisas nós vamos conseguir fazer, outras não. Algumas coisas são de curto prazo, outras são de médio e outras são de longo prazo.

É preciso ter gente focada nisso. Gente do setor. Para isso é preciso desenvolver uma política transversal. E só criando uma unidade administrativa especializada a gente vai fazer isso.

O Ministério da Justiça é um ministério agigantado. Ele tem funções de cidadania, funções de defesa do consumidor e, até pouco tempo atrás, tomava conta de questões indígenas. E tem toda a atividade de segurança penitenciária, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal.

Não há quem consiga ter a concentração no assunto que o assunto merece, né? A ideia de que o governo federal tem pouco a falar sobre segurança pública e que é um problema dos estados é falso.

Segurança Pública, quando você fala em crime organizado, envolve uma articulação nacional. Não tem como você combater sem articular nacionalmente.

É um problema nosso, do governo federal. Um problema que ele tem que enfrentar claramente. Criando o Ministério de Segurança Pública e mandando para sociedade um recado.

Que a segurança pública é nossa prioridade. É um erro a segurança pública não ser uma absoluta prioridade do governo Lula. É um erro que pode custar caro.

A direita e a extrema direita se criaram em cima desse problema. A extrema direita, desde a década de 90, vem criando o ambiente. Quando eu falo de Estado de exceção, do processo penal de exceção, essa técnica migrou para a política.

No caso do Mensalão, esse processo transformou Zé Dirceu e Zé Genoíno em bandidos. E depois transformaram o presidente Lula em bandido.

É essa a técnica que se desenvolveu por conta desse ambiente. A questão da segurança é absolutamente relevante. Claro, aqui a crítica é com absoluta lealdade ao atual governo.

Sou um radical apoiador de Lula e do governo. Mas acho que o maior erro do governo Lula é ainda não ter criado o Ministério da Segurança. Lula vacila e não se pode errar nisso.

Não quero ser ministro da Segurança de jeito nenhum. Pelo amor de Deus. Me tira dessa. O mosquito azul já me despicou. Tem vários caras que podem ser ministros, ultra qualificados.

Acho que professores, gente da sociedade civil, tem que estar em constante diálogo com o governo Lula. Para que eles nos procurarem para conversar.

O governo tem que romper com o casulo. Ele fica lá em Brasília com aqueles papos curvos. Nunca vi ninguém ter papo reto naquela cidade.

O governo Lula vai se ferrando e vai se tornando um casulo. O presidente tem que romper com isso. Ele é o homem para romper com isso.

E o PT tem que retomar o PT do passado, como uma usina de ideias para o país.

Veja a entrevista na íntegra.

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