Mais uma sentença de morte tardia da Lava Jato. Por Jeferson Miola

Atualizado em 7 de setembro de 2023 às 23:54
Ilustração de Dias Toffoli sendo representado como tartaruga
Ilustração: Aroeira

Por Jeferson Miola

A Lava Jato vem sofrendo mortes sucessivas desde que em junho de 2019 vieram a público os diálogos da gangue de Curitiba no aplicativo Telegram.

A decisão do ministro do STF Dias Toffoli [6/9] é mais uma sentença de morte da Lava Jato. Como as antecedentes, também mais uma sentença tardia de morte.

A rigor, no entanto, Toffoli não apresenta absolutamente nenhuma novidade em relação aos abusos e ilegalidades da Lava Jato que se denunciava desde, pelo menos, o ano de 2015 e que, se o STF de Toffoli’s da vida não tivesse sucumbido à tentação fascista-antipestista, teria esmagado na origem o ovo da serpente que ele citou na decisão.

O acordo clandestino da Lava Jato com o Departamento de Justiça dos EUA, por exemplo, foi denunciado no extinto portal da Carta Maior ainda em 23 de dezembro de 2016. O STF sabia disso.

Na Suprema Corte, antes – durante a onda lavajatista no judiciário, na mídia e na sociedade – Toffoli se posicionou contra inúmeras apelações da defesa do presidente Lula que, nesta sua última decisão, na prática ele voltou atrás – porém, com oito anos de atraso, e depois da brutal devastação acontecida no país.

Finalmente agora Toffoli tornou “nulas todas e quaisquer provas obtidas dos sistemas Drousys e My Web Day B utilizadas a partir do acordo de leniência celebrado pela Odebrecht, no âmbito da Operação Lava Jato”.

Porém, a nulidade que ele hoje reconhece poderia ter sido reconhecida por ele pelo menos em janeiro de 2018, quando a defesa do presidente Lula requereu ao STF o acesso aos sistemas Drousys e My Web Day B para exercer o direito de defesa.

Naquela ocasião, contudo, o STF – com a complacência de Toffoli – foi conivente com a mentira da gangue de Curitiba, que alegou falso “extravio” das senhas dos sistemas para impedir o acesso da defesa do Lula à prova falsa pela qual a Lava Jato operava a condenação farsesca daquele que venceria com tranquilidade a eleição presidencial de 2018.

Portanto, a decisão do Toffoli não tem nada de heróica.

E não pode apagar a memória sobre o papel nefasto que ele desempenhou neste ciclo trágico da história do país – da traição no impeachment fraudulento da presidente Dilma à colaboração decisiva para a tutela militar e o ascenso fascista, cujo saldo é dramaticamente terrível para o povo brasileiro.

Não faltou crueldade, inumanidade e perversão a Toffoli, como bem testemunha a provação que ele impôs a Lula nas perdas dolorosas do irmão Vavá e do netinho Arthur.

Toffoli não é um herói. Ele é apenas o Toffoli, o navegador sempre a favor da maré. Uma gosma, portanto.

Como disse o jornalista Mauro Lopes, “caiu o pano”: “Toffoli serviu a Lula em seu primeiro e segundo mandatos, até ser indicado ao STF; no STF serviu à Lava Jato, aos militares e a Bolsonaro; agora volta a prestar reverência a Lula. Alguém duvida que ele será prestador de serviço no próximo giro da roda do poder?”.

Em entrevista a Kennedy Alencar [13/6/2019] na masmorra de Curitiba, com a certeza própria de inocentes, Lula sentenciou, que

“o país finalmente vai conhecer a verdade. Eu sempre disse que o Moro é mentiroso, é mentiroso. Eu disse no primeiro depoimento que fiz, está gravado, que ele estava condenado a me condenar.
O Dallagnol é tão mentiroso, que depois de ficar uma hora e meia na televisão mostrando um PowerPoint, ele consegue dizer para a sociedade: ‘Não me peçam provas, só tenho convicções’. Ele deveria ter sido preso ali”.

É muito estranho, por isso tudo, Toffoli só saber hoje [!] tudo aquilo que já se denunciava desde o início da Lava Jato – quando o ovo da serpente citado por ele ainda não tinha espocado.

Esta nova decisão do STF chega, portanto, com pelo menos oito anos de atraso. Toffoli se mostraria corajoso e honesto se, além de decidir como decidiu, também tivesse pedido desculpas a Lula e ao povo brasileiro.

É improvável, contudo, que ele faça autocrítica. Mas isso, no entanto, não diminui em nada o impacto ruinoso que a decisão proferida significará para Moro, Dallagnol & comparsas.

Ganham, com mais esta decisão mesmo tardia do STF, a justiça e a democracia brasileira. E perdem com ela os procuradores, delegados, desembargadores, ministros de tribunais superiores, políticos, empresários, mídia & associados do escândalo mundialmente considerado o maior esquema de corrupção judicial da história.

Vale lembrar: a Lava Jato é um acontecimento de significado histórico equivalente ao famoso caso Dreyfus, fonte central dos estudos da historiadora Hannah Arendt sobre as origens do fascismo e do nazismo.

Por esta razão, enterrar em definitivo a Lava Jato é uma medida vital para a democracia. Mesmo que realizada tardiamente, mas desde, porém, que a tempo de impedir sua ressurreição. Uma justiça de transição seria o melhor remédio.

Publicado originalmente no blog de Jeferson Miola

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