Há desfechos previsíveis para o caso dos arapongas que bisbilhotaram servidores considerados perigosos militantes antifascistas pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi).
A primeira previsão é esta. A tentativa do Supremo de enquadrar a Seopi, a partir da suspeita de atividades ilegais e antidemocráticas, como observou a ministra Cármen Lúcia, pode fracassar.
O ministro André Mendonça, da Justiça, já mandou dizer ao STF que a Seopi não faz nada de ilegal. E talvez, se forem examinar bem, não faça mesmo ao produzir relatórios com os nomes de servidores que Bolsonaro pode considerar seus inimigos.
A questão aqui talvez não seja de ilegalidade, mas de excesso de autoridade ou de autoritarismo pela tentativa de cadastrar inimigos, como a ditadura fazia.
Outra previsão. Nesta sexta-feira, Mendonça conversa com os senadores e deputados que integram a Comissão Mista de Controle das Atividade de Inteligência.
É uma reunião secreta, mas alguém poderá dizer depois o que rolou, em relação a informações elementares, sem ferir nenhuma norma de segurança. O Brasil precisa saber.
Deve se repetir nessa reunião secreta o argumento que já está no documento enviado por Mendonça ao Supremo. Tudo é normal, mas sigiloso.
Mais uma previsão. Mendonça é candidato a candidato a uma vaga no Supremo. Com o rolo da Seopi, em que ele desafia até mesmo a autoridade do Supremo (ao dizer que não irá compartilhar dossiês com a Corte), pode ser logo um ex-candidato.
O ministro desafia a instituição da qual pretende fazer parte e afronta ao mesmo tempo os senadores, se insistir na enrolação de que dossiê não é dossiê e que a Seopi faz tudo dentro da lei.
Há um argumento furado circulando desde ontem, segundo o qual a Seopi já fazia ações que poderiam ser consideradas de inteligência nos governos do PT. Poderiam, se tratassem de questões que envolvem segurança de Estado.
Inteligência, diria o conselheiro Acácio, é para quem é inteligente. E ninguém será suficientemente imbecil para achar que casos de atividades de defesa do Estado possam ser comparados a bisbilhotagens contra servidores considerados inimigos de Bolsonaro.
Isso é atividade de polícia política, e não de inteligência. Os militares sabem muito bem dessa diferença.
Por que servidores antifascistas poderiam ameaçar a segurança do governo ou de Bolsonaro? Por que seriam tão perigosos a ponto de provocarem a mobilização de arapongas e a produção de dossiês?
André Mendonça está sentado sobre a bomba. Supremo e Congresso (desse último ele depende muito, numa provável sabatina) deveriam ser bajulados, e não afrontados.
É provável que o imbróglio se esgote sem maiores consequências legais e políticas para o governo.
Mas pode ser devastador para alguém que pretende ser ministro do Supremo. Mendonça ficou, sob pressão de Bolsonaro e dos militares, com a tarefa de defender a Seopi a qualquer custo. E o custo para ele pode ser sua pulverização como candidato ao Supremo.
A não ser que o Brasil das inovações volte a inovar e o Supremo tenha pela primeira vez o que não teve nem na ditadura, um ministro que um dia chefiou arapongas encarregados de fazer dossiês sobre servidores públicos que lutam pela democracia e contra fascistas.