Messer quer falar tudo que sabe, mas por que no Paraná ninguém se interessa em ouvi-lo? Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 31 de julho de 2019 às 17:39
Dario Messer, Moro e Carlos Fernando: velhos conhecidos

PUBLICADO PELA PRIMEIRA VEZ EM 24/07/2018, REPUBLICADO AGORA EM RAZÃO DA PRISÃO DE DARIO MESSER EM SÃO PAULO.

Desde que o doleiro Alberto Youssef foi preso pela primeira vez, em 2004, Dario Messer foi apresentado ao Brasil como “o doleiro dos doleiros”. Youssef, falando sobre os maiores operadores do mercado paralelo, disse:

“Um era eu, a Tupi Câmbios, a Acaray, Câmbio Real, Sílvio Anspach, o Messer do Rio, o Rui Leite e o Armando Santoni”, disse.

Youssef superfaturou sua importância no esquema ilegal de câmbio, já que era de um centro menor, Londrina, mas disse a verdade quanto a Messer.

O doleiro dos doleiros também foi citado na CPI do Banestado, no Paraná, mas, curiosamente, nunca foi denunciado pelo Ministério Público Federal no estado.

Agora que o Ministério Público no Rio de Janeiro decretou a prisão dele e o obrigou a fugir, começam a surgir os sinais de que Dario Messer pretende falar. E ele tem o que falar.

Dois operadores do esquema dele, Vinícius Claret, o Juca Bala, e Cláudio Barboza, presos no Rio de Janeiro, disseram em depoimento que os doleiros pagavam uma mesada de 50 mil dólares ao advogado Antonio Figueiredo Basto, chamado de o rei das delações na vara de Sergio Moro.

Segundo esses doleiros, a mesada foi paga durante cinco anos, para garantir proteção nas delações, na Polícia Federal e no Ministério Público Federal.

O segundo sinal de que Dario Messer quer mesmo falar foi emitido hoje, através de uma entrevista que o advogado dele deu à Folha de S. Paulo.

Disse José Marcondes de Moura: “Dario está aberto e quer falar tudo o que sabe, mas não quer ter a faca no pescoço”.

Messer não quer ser preso e, por isso, além de negociar com autoridades brasileiras, mantém tratativas também com procuradores no Paraguai, para onde se mudou em 2014, quando estourou a Lava Jato.

No país vizinho, ele é conhecido como “irmão de alma” do ex-presidente Horácio Cartes, que deixou o governo há pouco, depois que o candidato do seu partido, Mario Benítez, venceu as eleições.

Assim como não foi incomodado em 2004 pela Justiça federal no Paraná, também na Lava Jato Messer passou incólume até que, no Rio de Janeiro, o juiz Marcelo Bretas decretasse sua prisão, a partir do pedido dos procuradores no Rio.

Mas, como conseguiu fugir, juntamente com seus principais executivos, é razoável imaginar que tenha sido avisado.

O paradeiro dele é incerto. Nos bastidores, há quem diga que continua no Paraguai. Outros apostam que teria se mudado para Israel, onde desfruta de cidadania.

A investigação que colocou Messer em evidência foi resultado de um trabalho persistente do procurador Celso Três. Foi ele quem abriu o cofre secreto do Banestado, ao conseguir a quebra de sigilo de todas as contas CC5 do Brasil e descobrir que 124 bilhões de dólares haviam sido remetidos ao exterior entre janeiro de 1992 e dezembro de 1998.

Três estava lotado em Cascavel e não participou da denúncia feita pelo Ministério Público Federal em Curitiba contra os doleiros descobertos nessa quebra de sigilo.

“Na época, nós tínhamos certeza de que o TRF-4 iria barrar a investigação e, por isso, quando recebemos o resultado da quebra de sigilo, mandamos para a procuradoria do local onde as pessoas que movimentaram os recursos residiam. Em alguns lugares, a investigação prosperou, em outros não”, recorda, em entrevista pelo telefone ao DCM.

O procurador se surpreendeu quando Youssef foi apresentado ao Brasil como um dos maiores doleiros. “Ele era pequeno. Quase um despachante. Ficou grande depois que fez o acordo de colaboração homologado pelo juiz Sergio Moro”, diz.

Depois disso, livre da cadeia e com dinheiro liberado, Youssef transferiu suas operações de Londrina, no Paraná, para São Paulo, e se tornou um operador mais expressivo.

Nada que se compare a Messer, mas bem maior do que era e, nessa condição, além de operar para o deputado José Janene, do PP, começou a prestar serviços para clientes de maior peso (e até traficantes).

Com suas operações, Youssef acabou cruzando o caminho do diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, através de um posto de gasolina em Brasília que era usado para lavagem de dinheiro.

E assim nasceu a Lava Jato, no ponto em que as operações do submundo financeiro se encontraram com um corrupto que havia dirigido a Petrobras durante algum tempo, como indicação do PP. Mas no governo petista.

“Na época do Banestado, já havia uma discussão no Ministério Público Federal sobre os acordos de colaboração. Nós achávamos que era muito benéfico para os criminosos, como o Youssef. Eles ficavam com dinheiro, eram soltos e entregavam só uma ou duas pessoas, muitas vezes sem prova”, diz o procurador Celso Três.

Para ele, a Lava Jato comete o mesmo erro. “As delações da Odebrecht, por exemplo, feitas de baciada, não estão sendo aproveitadas, porque são inconsistentes e sem provas. Os inquéritos gerados por essas delações estão sendo arquivados”, afirma.

Com Dario Messer solto, apesar de operar no mercado paralelo há décadas, como sucessor de seu pai, também doleiro, por muitos considerado o primeiro do país, fica no ar o cheiro de que as delações servem para provocar muito barulho, atingir alvos definidos, mas preservar quem, de fato, controla os mecanismos de lavagem e evasão de divisas.

Cada dia que passa, fica mais evidente a necessidade que as delações sejam passadas a limpo. Uma CPI seria o caminho natural, já que, estando a sujeira no Judiciário, o Legislativo teria independência para investigar.

Seja como for, em que local for, o depoimento de Dario Messer seria um passo fundamental. Talvez o caminho para o Brasil repetir o que foi feito na Itália, com a Operação Mãos Limpas.

Quando os juízes de lá exageraram e o país foi para o buraco, a população cobrou:

Acabem com a Mãos Limpas e nos devolvam a Itália.

No Brasil, também é preciso fazer esse resgate.