
O site Metrópoles tentou vender matérias pagas, “no formato Expressão de Opinião”, ao Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos, o Sindnapi, no valor total de R$ 97 mil. A página fez essa proposta após uma denúncia contra a instituição chamada de “sindicato de irmão de Lula”.
O caso é investigado pela Polícia Federal (PF) e é tema de uma CPMI no Congresso. Fundado no ano 2000, o Sindnapi tem como vice-presidente desde agosto de 2024 José Ferreira da Silva, o Frei Chico, irmão mais velho de Lula e militante histórico do sindicalismo brasileiro. Frei Chico integra o Sindnapi desde 2008 e não é alvo das investigações.
No entanto, desde o desencadeamento da Operação Sem Desconto, em 23 de abril, quando o sindicato sequer era investigado, o site busca colocar Frei Chico no centro do tema. No dia seguinte, o Metrópoles divulgou um texto com o título “quem é Frei Chico, irmão de Lula ligado a sindicato investigado”.
No dia 8 de setembro, um “executivo de negócios sênior” do Metrópoles entrou em contato por email com o Sindnapi afirmando que “temos um formato no Metrópoles chamado Expressão de Opinião, na qual vocês podem se posicionar sobre o tema”. “Gostariam de se posicionar conosco? Se sim, enviarei uma proposta!”.
O assessor de comunicação do Sindnapi, Renê Gardim, respondeu positivamente. Em um documento detalhado a que o DCM teve acesso, o Metrópoles sugere como “solução” para o Sindnapi “se posicionar” uma “matéria no formato Expressão de Opinião”, com “três dias de destaque na home” e exposição em outras mídias do grupo, como banners, painéis de LED e chamada na rádio pelo valor de R$ 97 mil.
“Ficamos surpresos com o email sugerindo que haveria uma proposta para respondermos aos ataques que eram direcionados a nós pelo portal e pedimos que enviassem para entendermos do que se tratava. E para uma surpresa maior ainda enviaram uma proposta comercial, indicando que se pagássemos poderíamos nos posicionar como bem entendêssemos em relação ao que estava sendo publicado”, disse Gardim.
Após receber a “proposta”, o Sindnapi não retornou ao contato mas recebeu uma série de emails pedindo uma resposta para “ativar a expressão de opinião”, o último deles em 3 de outubro.
Em 8 de outubro, o Metrópoles voltou ao tema, afirmando que “sindicato ligado a irmão de Lula ‘burlou’ rastreio de dinheiro“, na coluna de Paulo Cappelli. O site também afirma que a CPMI ouvirá representantes do sindicato e ressalta que “Frei Chico não comparecerá, pois sua convocação ainda não foi apreciada pelo colegiado”.
Frei Chico não é investigado, o Sindnap não foi indiciado até o momento e sequer recebeu intimação da PF. Essas informações não constam na apuração do Metrópoles.
Como foi a troca de mensagens
“Eu acho complicado e não quero chamar isso de extorsão, e no começo eu até não liguei muito para esses contatos, mas eles encaminharam essa proposta de R$ 97 mil e passaram então a insistir muito. Nós ignoramos, claro que não aceitamos, pois eles vinham publicando coisas que não eram reais contra o Sindnapi. Depois de serem ignorados, veio essa reportagem com mentiras, que diz que Porsches e uma Ferrari foram apreendidas no sindicato, algo que nunca aconteceu”, relata Renê Gardim, assessor de comunicação do Sindnapi e a quem os contatos para “vínculo financeiro” com o Metrópoles eram direcionados.
A mensagem inicial à qual Renê se refere é a que aparece abaixo, enviada e assinada por um funcionário que se identifica como “Executivo de Negócios Sênior”. Num primeiro momento, o Sindnapi pediu para ver o que seria a tal “proposta” do portal.
Dois dias depois, atendendo à solicitação para “compreender melhor” o que seria o contrato oferecido pelo veículo jornalístico, o mesmo “Executivo de Negócios Sênior” encaminhou uma mensagem com um resumo dos “serviços” e uma tabela com o que seria oferecido à entidade sindical, para então falar de valores.
Como não recebeu qualquer retorno por parte do Sindnapi, o responsável pelo setor de negócios do Metrópoles voltou a entrar em contato cinco dias depois, em 15 de setembro. O que se repetiu em 23 de setembro, pois o veículo de imprensa seguia sendo ignorado.
Outra vez sem respostas, a empresa insiste, desta vez já no dia 3 de outubro.
Seis dias após a última tentativa de “vender um espaço” para o Sindnapi para que o Metrópoles então publicasse uma reportagem com dados falsos, atribuindo ao “sindicato do irmão do Lula” a propriedade dos carrões de luxo apreendidos pela Polícia Federal, que na verdade foram confiscados em ações contra outras entidades investigadas, essas sim envolvidas em descontos criminosos contra aposentados e pensionistas.
Os veículos apreendidos, assim como outros bens luxuosos, eram de outras pessoas investigadas, como Felipe Macedo Gomes, ex-presidente da Amar Brasil Clube de Benefícios (ABCB), Anderson Cordeiro, dirigente da Masterprev, Igor Dias Delecrode, desenvolvedor de tecnologias que atuou para vários desses órgãos, e Américo Monte, presidente da ANDAP. Para comprovar a falsidade da matéria do Metrópoles atribuindo a propriedade ao Sindnapi, o auto de apreensão da PF mostra claramente que por lá foram apreendidos apenas dois computadores, duas pastas de documentos e R$ 43 mil em espécie no cofre da tesouraria do sindicato, conforme imagem acima.
O DCM entrou em contato com o Metrópoles com essas perguntas: Por que o Metrópoles propôs uma matéria remunerada “no Formato Expresso de Opinião” ao custo de R$ 97 mil ao Sindnapi, sempre associado ao irmão do presidente Lula, Frei Chico? Por que não ouvir o outro lado dentro da mesma reportagem? É procedimento padrão no Metrópoles sugerir uma proposta comercial para fontes que são criticadas em suas reportagens? Os pedidos de contato com o Sindnapi estão sendo realizados desde setembro. Vocês acreditaram que, em um mês de cobertura, o sindicato toparia uma série de matérias pagas na home do Metrópoles e em seus veículos?
A resposta foi a seguinte.
Para a primeira pergunta: “A proposta no formato Expresso de Opinião segue um modelo publicitário legítimo, utilizado por diversos veículos jornalísticos sérios no país. Trata-se de uma forma de publicidade opinativa identificada e contratada, na qual o conteúdo é de responsabilidade do anunciante, com os devidos créditos e sinalizações de que se trata de conteúdo patrocinado.
Esse tipo de formato não se confunde com reportagem jornalística, que exige a apuração e o contraditório. A proposta feita ao Sindnapi foi estritamente comercial, e a decisão de contratá-la ou não cabe ao anunciante”.
Para a segunda: “Não. A sugestão de propostas comerciais não está vinculada ao conteúdo editorial do Metrópoles. O setor comercial atua de forma independente da redação, como é praxe em veículos jornalísticos sérios.
No entanto, nosso time comercial está atento às notícias e aos temas em evidência, o que permite identificar oportunidades de oferecer formatos publicitários relevantes, como o Expresso de Opinião — um espaço publicitário identificado, opinativo e de responsabilidade do anunciante.
A proposta feita foi estritamente comercial, dentro das boas práticas de mercado, e sem qualquer relação com a linha editorial ou o conteúdo crítico eventualmente publicado”.
Para a terceira: “O contato feito com o Sindnapi pelo setor comercial foi uma abordagem pontual e legítima, com a oferta de um formato publicitário transparente e identificado, conforme práticas comuns no mercado jornalístico.
Não houve qualquer expectativa de que a cobertura editorial influenciaria uma eventual contratação publicitária. As áreas comercial e editorial do Metrópoles atuam de forma independente, como ocorre em veículos de imprensa sérios.
O objetivo da proposta foi apresentar uma oportunidade de comunicação dentro de um espaço opinativo e patrocinado — a decisão de aderir ou não cabe unicamente ao anunciante”.