Mídia corporativa está tentando domesticar o bolsonarismo. Por Luís Felipe Miguel

Atualizado em 4 de julho de 2020 às 12:52
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POR LUIS FELIPE MIGUEL

Quando o PT começou a se tornar um partido relevante, em meados dos anos 1980, o jornalismo tratou de incentivá-lo à acomodação com a ordem.

Os petistas eram divididos em dois grupos – “PT light” e “PT xiita”.

O PT light recebia elogios por sua moderação e responsabilidade. Era até aceito como interlocutor coadjuvante no debate público.

O PT xiita era tratado como folclórico, ultrapassado e irrelevante. Só aparecia no noticiário como alvo de chacota.

Não sei estimar o peso da contribuição da mídia, mas o fato é que o petismo dito xiita foi desaparecendo e o PT se tornou um partido formado basicamente por 50 tons de light.

Há algo semelhante, na superfície, no tratamento que é dado ao bolsonarismo. Há um setor que é folclorizado e outro que é levado a sério.

Leio no noticiário, por exemplo, que o provável novo ministro da Educação está sendo bombardeado pela “ala ideológica”´do governo.

Há, portanto, uma “ala ideológica”, que é má. E uma ala “não-ideológica” que, por antítese, deve ser boa.

O fato de que Feder é um privatista radical, com ódio à educação pública, não o faz ser considerado ideológico. Como Guedes, aliás – que a imprensa trata como exemplo máximo da “não-ideologia” no bolsonarismo.

Como a ideologia é a deturpação da realidade (uma curiosa apropriação da versão mais rasa do conceito no marxismo), quem não é ideológico é realista.

O que ocorre, portanto, é o endosso à cartilha ultraliberal, apresentada não como uma opção, ideológica e interessada, mas como uma imposição da realidade dos fatos.

A equivalência com o tratamento dado antes ao PT é apenas superficial porque, suspeito, o objetivo é diverso.

No caso do PT, tratava-se de domesticar o partido, minimizando seus elementos mais radicais ou principistas.

Agora, a pedagogia é dirigida ao público, que deve ser convencido que o problema do bolsonarismo reside apenas nos olavetes e outros alucinados – e não nas violentas políticas de destruição dos direitos e do Estado social levadas a cabo com zelo por Guedes e seu grupo.