Ministro do MEC está confortável como zero à esquerda. Por Rodrigo Ratier

Atualizado em 24 de setembro de 2020 às 18:35
O pastor presbiteriano Milton Ribeiro. Foto: Reprodução/Twitter

Publicado originalmente no Ecoa do UOL

POR RODRIGO RATIER

“Não tenho como responder”, “não tenho como resolver isso”, “isso não tem nada a ver comigo”, “não temos esse tipo de interferência”, “não temos o poder de determinar”, “não foi um problema criado por nós”, “não temos recurso para atender”, “não tem como, vai fazer o quê?”.

Imagine que você é chefe numa empresa e um funcionário recém-contratado se apresenta com esse tipo de atitude: não tenho, não consigo, não posso, não é comigo, não adianta, já estava assim quando eu cheguei. Qual seria sua avaliação sobre esse funcionário? O que você faria com ele?

As frases do primeiro parágrafo são declarações de Milton Ribeiro, ministro da Educação, à jornalista Jussara Soares, de “O Estado de São Paulo”. Em entrevista, diz que volta às aulas não é tema do MEC. Que agora, decorrido meio ano de pandemia, o órgão vai apenas soltar um protocolo de biossegurança. Que não tem recurso para resolver o problema de internet nas escolas – e tudo bem, porque “não foi um problema criado por nós”. Que famílias sem acesso a aulas online são problemas sociais “de um outro departamento, de assistência”. E que o papel do Governo Federal na redução de desigualdades é “relativo”.

Em um certo sentido, eu e você somos chefes de Ribeiro: são nossos impostos que pagam o salário do novo titular do MEC, como financiam, de resto, toda a máquina pública.

Há método e inspiração na desrresponsabilização. O espelho evidente é Jair Bolsonaro. Sua postura diante da pandemia é conhecida: um misto de vitimização, ao insistir na lorota que o Supremo Tribunal Federal tirou todos os poderes da União no combate à Covid-19, e fatalismo, ao afirmar que as mortes são inevitáveis e que não há nada a ser feito para reduzi-las – outra mentira. A estratégia é seguir se apresentando como um outsider mesmo sendo governo, o homem íntegro, patriota e idealista que não pode fazer nada não por ser incompetente – o “deserto de ideias”, como definiu Rodrigo Maia -, mas porque o “sistema” não permite.

É uma falácia dizer que o MEC não tem ingerência na educação brasileira. O fato de a maior parte da rede pública estar nas mãos de estados e municípios não significa que o órgão seja um mero carimbador de recursos. Talvez a inação das gestões recentes tenha nos feito esquecer, mas o Ministério é o responsável pela elaboração da política nacional de educação e por propiciar as condições para sua execução. Transporte escolar, merenda, currículo, políticas de formação, valorização salarial, plano de carreira, acesso, permanência, planejamento, avaliação, internacionalização: há uma infinidade de aspectos ligados ao ensino e à aprendizagem de que o MEC precisa se ocupar. Sem contar o diálogo mais próximo com escolas e universidades federais, a rede direta sob responsabilidade da União. Para resumir, o MEC poderia e deveria liderar a educação brasileira.

As declarações ao Estadão parecem indicar que o novo ministro está confortável no papel de zero à esquerda em muitos aspectos que lhe diriam respeito. E, em sua inoperância, talvez lhe pareça lógico a tesourada de 8,61% nas despesas não obrigatórias no orçamento de 2021. Eis o desmonte prometido: foi Bolsonaro que disse que teria de destruir muita coisa antes de começar a erguer.

Para quem acha que é o caso de se perguntar o que Ribeiro está fazendo ali, a própria entrevista se encarrega de responder: promover o obscurantismo nos costumes (diz que não concorda com “opção (sic)” de ser homossexual, algo ligado à “famílias desajustadas”), revisar material didático (“já pedi para fazer”), criticar Paulo Freire (“transplanta valores do marxismo e tenta incluir dentro do ensino e da pedagogia”), louvar a Ditadura Militar (“o fato de o movimento militar ter impedido que o Brasil se tornasse uma Cuba eu acho perfeito”). Segue o sofrimento da Educação.