Por Mateus Coutinho
Em depoimento à Polícia Federal (PF) na investigação sobre uma tentativa de golpe de Estado, o ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, negou ter participado de reuniões com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Palácio do Alvorada após o segundo turno das eleições 2022 nas quais foram discutidas minutas golpistas para reverter o resultado das eleições e manter Bolsonaro no poder.
Ele ainda negou ter repassado a minuta golpista encontrada em sua residência pela PF ao então presidente ou mesmo a algum outro integrante do governo, e disse que os documentos do tipo estavam “banalizados” na ocasião.
O relato da PF sobre o depoimento de Torres está entre os tornados públicos pelo ministro do STF Alexandre de Moraes na tarde desta sexta-feira (15). Segundo o texto, Torres afirmou: “Que reitera que suas idas ao Alvorada eram para despachar temas do Ministério com o então presidente; que afirma categoricamente que, em nenhuma oportunidade no Palácio da Alvorada naquele período (após o segundo turno das eleições), tratou de golpe de estado, abolição do Estado Democrático de Direito, Garantia da Lei e da Ordem, Estado de Sítio, Estado de Defesa, intervenção militar ou algo do gênero”.
A versão diverge da apresentada à PF pelos ex-comandantes da Força Aérea e do Exército, que afirmaram que Torres teria participado de algumas das reuniões para dar explicações sobre os mecanismos jurídicos que estavam sendo cogitados por Bolsonaro para se manter no poder.
Mais à frente em seu depoimento, Torres falou sobre a minuta golpista encontrada em sua residência. “[Afirmou] Que deseja reiterar que o texto encontrado em sua residência não é de sua lavra, não foi recebido ou repassado pelo declarante para qualquer integrante do governo ou ao então presidente da República; que naquela época tais documentos estavam banalizados e sendo entregues em diversos órgãos públicos; que viu na imprensa que a deputada Carla Zambelli [PL-SP] recebeu em seu gabinete e Valdemar Costa Neto [presidente nacional do PL] recebeu no aeroporto”, diz o texto.
O ex-ministro ainda classificou o documento, que prevê a decretação de um Estado de Defesa no Tribunal Superior Eleitoral, como uma “aberração jurídica” e disse que o texto do documento estava disponível no portal de notícias jurídicas Conjur em dezembro de 2022.
Minuta foi apresentada a comandantes
Apesar de tentar diminuir a importância do documento encontrado em sua residência, os depoimentos dos ex-comandantes da Força Aérea Brasileira e do Exército à Polícia Federal foram categóricos ao afirmar que Bolsonaro estava a par dos documentos golpistas e que apresentou e discutiu sobre eles com comandantes das Três Forças após ser derrotado nas eleições de 2022.
No caso do ex-comandante do Exército, general Freire Gomes, ele inclusive chega a confirmar aos investigadores que a minuta apresentada por Bolsonaro era a mesma que foi encontrada na residência de Anderson Torres.
De acordo com os relatos colhidos até agora e que vão de encontro à delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, somente o então comandante da Marinha Almir Garnier, dentre os comandantes das Três Forças, teria sinalizado apoio às propostas de Bolsonaro para se manter no poder.
Intimado a depor na investigação, Garnier ficou em silêncio, assim como outros militares de alta patente suspeitos de participar da tentativa de golpe de Bolsonaro.
Ao final de seu depoimento, Anderson Torres ainda afirmou, após ser indagado por seu advogado (possibilidade que foi concedida pelo delegado da PF na ocasião), que se tomasse conhecimento de qualquer medida relacionada a golpe de Estado ele pediria demissão do cargo.
Além disso, sua defesa pediu ao final do depoimento que fosse solicitada cooperação jurídica internacional com os Estados Unidos para demonstrar que Torres não teria se encontrado com Bolsonaro no período em que os dois estavam no país.
Originalmente publicado no Brasil de Fato
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