
Alvo dos protestos nas maiores cidades do Brasil neste domingo (21), a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Blindagem, aprovada na Câmara com apoio do Centrão, de parte da oposição e até de setores da esquerda, encontra grande rejeição no Senado, especialmente após a repercussão negativa nas redes sociais, onde foi apelidada de “PEC da Bandidagem” e rejeitada por 83% das menções.
Um levantamento do jornal O Globo aponta que 46 dos 81 senadores se declaram contrários ao texto, enquanto apenas seis se dizem favoráveis. Outros seis afirmaram ainda não saber como votar e os demais não responderam. Para ser promulgada, a PEC precisaria de ao menos 49 votos, número improvável diante do posicionamento atual dos parlamentares.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), enviou a proposta para análise inicial na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Dos 27 membros do colegiado, 17 já declararam voto contrário, três a favor e sete não se posicionaram.
O relator, Alessandro Vieira (MDB-SE), está entre os que defendem a rejeição. A PEC prevê que deputados e senadores só possam responder a ações penais mediante autorização prévia de suas Casas Legislativas. Além disso, em casos de prisão em flagrante por crime inafiançável, o plenário decidiria em até 24 horas, por voto secreto, se manteria ou não a prisão. Para críticos, a medida representa um retrocesso, já que a exigência de aval legislativo foi abolida em 2001.
O contraste entre as Casas é evidente. Na Câmara, a PEC foi aprovada por 353 votos a 134, mas a repercussão negativa levou parte dos deputados a se desculpar publicamente. No Senado, a divisão é mais clara dentro dos partidos. No PL, o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, que deu 83 votos favoráveis na Câmara, três senadores apoiam a PEC, entre eles Carlos Portinho (RJ), líder da bancada, enquanto três, como Magno Malta (ES), já se posicionaram contra.
No União Brasil, que apoiou em peso a medida na Câmara, metade dos seis senadores rejeita o texto, incluindo Sergio Moro (PR), Professora Dorinha (TO) e Jayme Campos (MT). O PSD, que teve votação dividida entre seus deputados, vê oito de seus 12 senadores contrários à PEC, entre eles Otto Alencar (BA), presidente da CCJ, e Eliziane Gama (MA).
“Torço e trabalharei para que nossos colegas no Senado não avalizem essa PEC. Creio que a Casa, em respeito à opinião pública e fiel ao compromisso com a moralidade, dirá ‘não’ a esse absurdo”, declarou Eliziane.
Na esquerda, as dissidências da Câmara, onde 12 deputados do PT votaram a favor, não se repetem. Oito dos nove senadores petistas já afirmaram que rejeitarão a PEC. Entre os defensores, há ressalvas ao texto aprovado.
Líder do governo Lula no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) classificou a PEC como um “grave retrocesso”. “Ela cria privilégios para parlamentares e atenta contra o princípio da igualdade perante a lei. No Senado, vamos lutar com firmeza para que essa proposta não avance”, escreveu no X.
A PEC da Blindagem é um grave retrocesso.
Ela cria privilégios para parlamentares e atenta contra o princípio da igualdade perante a lei. No Senado, vamos lutar com firmeza para que essa proposta não avance.
Não é justo com o povo brasileiro, que nos confiou a responsabilidade…
— Randolfe Rodrigues (@randolfeap) September 17, 2025
O senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) argumentou que a medida deve ser ajustada. “É claro que há excessos na PEC que precisam de correções, como o voto secreto e a extensão da imunidade a presidentes de partidos. Mas não podemos descartá-la em sua totalidade, já que ela responde a um momento em que decisões judiciais têm ultrapassado limites”.
Especialistas em ciência política avaliam que a diferença entre os sistemas eleitorais de Câmara e Senado ajuda a explicar o cenário. Para Gabriela Testa, da Fundação Getulio Vargas, “no Senado, a responsabilização é individual e muito mais direta, o que aumenta o risco para quem busca reeleição. Já na Câmara, a responsabilização é pelos partidos, e isso dá aos deputados a percepção de que podem se proteger atrás das legendas”.
Murilo Medeiros, da Universidade de Brasília, acrescentou que “senadores tendem a ser mais cautelosos em pautas que são malvistas pela opinião pública”.