Moro alertou para os riscos da indústria de vazamentos da Lava Jato. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 5 de fevereiro de 2016 às 12:21
Simpatizantes
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A coluna de Mônica Bergamo de hoje informa que “o batismo da operação que investiga o prédio em Guarujá em que Lula compraria um apartamento tríplex gerou desconforto entre integrantes da Operação Lava Jato”.

Os agentes estariam preocupados com as acusações de “politização”. Bem, se é verdade a queixa, é tarde demais. Muito mais provável que se trate de pura e simples mentira plantada.

A Lava Jato encampou uma narrativa que se resume a responsabilizar um partido e um líder pela corrupção no estado brasileiro. Só interessa o que se enquadra nessa história.

Uma dúvida bastante comum era quem estava por trás dos vazamentos. O Japonês? O sujeito calvo de barbicha? Um daqueles promotores que acham que fazem parte do elenco de “Os Intocáveis”? O evangélico que dá palestras em igrejas?

A resposta, me contou um delegado da PF, é mais óbvia: Sérgio Moro. O juiz escreveu sobre o assunto num ensaio de 2004 sobre a operação Mãos Limpas, da Itália, que serve de template para seu trabalho.

“Na verdade, é ingenuidade pensar que processos criminais eficazes contra figuras poderosas, como autoridades governamentais ou empresários, possam ser conduzidos normalmente, sem reações”, escreve Moro. “A opinião pública, como ilustra o exemplo italiano, é também essencial para o êxito da ação judicial”.

Prossegue: “Os responsáveis pela operação mani pulite ainda fizeram largo uso da imprensa. Com efeito: para o desgosto dos líderes do PSI, que, por certo, nunca pararam de manipular a imprensa, a investigação da ‘mani pulite’ vazava como uma peneira. Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no ‘L’Expresso’, no ‘La Republica’ e outros jornais e revistas simpatizantes. Apesar de não existir nenhuma sugestão de que algum dos procuradores mais envolvidos com a investigação teria deliberadamente alimentado a imprensa com informações, os vazamentos serviram a um propósito útil.”

Reitero: “largo uso” da imprensa; “jornais e revistas simpatizantes”.

É autoexplicativo. Com poderes plenipotenciários e uma boa dose de messianismo, Moro usa e se deixa usar pela imprensa. Quem manipula quem? Com que “propósito útil”?

Na “peneira” da Lava Jato, as mesmas matérias “exclusivas” saem em todos os “simpatizantes”. Como esses documentos já vêm mastigados, é só dar um tapa e colocar no ar. Para que apuração?

Uma turbinada vai bem. A capa da Época com Marcelo Odebrecht sobre “o fim da república” é um clássico desse tipo de indigência (lembrando que veio da revista que deu uma matéria em primeira pessoa de uma panela. Pois é).

Até blogs de extrema direita, irrelevantes, com jornalistas paranóicos e mono obcecados, frequentemente mentirosos contumazes, recebem seu quinhão de vazamentos e gritam “EXCLUSIVO!”. Dezenas de trouxas acreditam. É provável que esses blogueiros acreditem também.

Dois dias mais tarde, aquela “denúncia” sai no Estadão. Ou já havia saído no Globo. Há um revezamento de clientes. É como na cena de “Procurando Nemo” em que os pelicanos pedem sua ração gritando “Eu! Eu! Eu!”. No fim das contas, tem para todo mundo.

Isso pode ser qualquer coisa, menos “jornalismo investigativo”. Menos ainda justiça. Onde há simpatia por um lado, não pode haver isenção. É apenas a equipe da Lava Jato passando adiante as cenas para um público viciado.

O jornalista e ativista conservador americano Andrew Brietbart, responsável por espalhar fofocas políticas que viralizaram, apontou que “alimentar a mídia é como treinar um cachorro: você não pode atirar um bife para ensiná-lo a se sentar. É preciso dar-lhe pequenos pedaços várias vezes até que ele aprenda”.

Todo mundo está no jogo, executando um script só, sob o maestro da vez. Ele ganha prêmio de personalidade do ano. Eventualmente, se alguém ousa colocar a cabeça para fora e criticar o andamento da peça, é executado. Bastou Jaques Wagner falar para aparecerem dossiês nos jornais, por exemplo.

Os manipuladores estão de ambos os lados, de quem publica e de quem vaza, todos inflando a opinião pública em seu interesse. No texto sobre a Mãos Limpas, Moro alertou para o seguinte: “Daí também o risco de divulgação prematura de informações acerca de investigações criminais. Caso as suspeitas não se confirmem, a credibilidade do órgão judicial pode ser abalada.”

Nesse caso, não há problema porque as suspeitas serão forçadas a se confirmar já que os culpados estão escolhidos. Agora é apurar os fatos para distorce-los à vontade.