Mortes começaram antes de operação em favelas no Rio, mostra documento

Atualizado em 30 de outubro de 2025 às 12:25
Agentes da Polícia Civil durante megaoperação que resultou em massacre no Rio. Foto: Mauro Pimentel/AFP

As forças de segurança do Rio de Janeiro sabiam que a operação policial realizada na terça (28) havia vazado horas antes de sua execução. Um documento obtido pela Folha de S.Paulo mostra que, por volta da 1h da manhã, quatro horas antes do início oficial da incursão nos complexos do Alemão e da Penha, policiais já haviam se envolvido em confrontos armados com criminosos alertados sobre a ação.

Naquele momento, cerca de 20 homens em motocicletas entraram em confronto com agentes em um dos acessos aos conglomerados de favela. Dois deles foram atingidos e morreram posteriormente no Hospital Salgado Filho. O episódio, segundo os próprios registros policiais, foi o primeiro indício de que o plano da operação havia sido comprometido.

De acordo com o documento, os policiais militares realizavam patrulhamento de rotina na Estrada Ademar Bibiano, em Del Castilho, quando se depararam com o grupo de motociclistas saindo do Complexo do Alemão. Ao perceberem a viatura, os suspeitos fugiram em direção à Avenida Itaoca, disparando contra os agentes.

O confronto se estendeu até as imediações da estação de Bonsucesso, da SuperVia. No local, três policiais, um subtenente e dois sargentos, revidaram com 25 disparos de fuzil. “Após estabilização do terreno, os PMs fizeram um 360º e localizaram os referidos homens baleados/feridos, sendo que um portava um fuzil Taurus T4 cal 5.56 e o outro uma pistola Glock 9mm, além de três granadas caseiras”, diz o registro.

Os policiais afirmaram que os dois feridos “ainda apresentavam sinais vitais” e foram levados ao hospital, onde morreram. Eles ainda não haviam sido identificados até a publicação do documento. Antes de morrer, ambos se apresentaram como chefes do Comando Vermelho no Espírito Santo.

Corpos de homens que morreram durante operação no Rio de Janeiro. Foto: Eduardo Anizelli/Folhapress

“Vale ressaltar que os criminosos informaram que eram oriundos do Espírito Santo, onde eram lideranças da facção Comando Vermelho daquela unidade da federação. Disseram também que estavam saindo do Cpx [complexo] do Alemão, por conta da informação vazada de que haveria operação policial nas comunidades daquele complexo”, registraram os agentes.

Mesmo após saber do vazamento, as forças de segurança mantiveram a operação, que começou por volta das 6h. A ação, batizada de “Operação Contenção”, reuniu cerca de 2.500 policiais e terminou como a mais letal da história do Rio de Janeiro, com 121 mortos, segundo dados do governo do estado.

Inicialmente, o governo Cláudio Castro (PL) havia divulgado o número de 64 mortos. Moradores, no entanto, relataram desde cedo que dezenas de corpos foram retirados de áreas de mata e levados a uma praça no Complexo da Penha. As imagens circularam nas redes sociais, pressionando o governo a revisar os números.

A Secretaria de Segurança atualizou o balanço para 119 mortos, incluindo quatro policiais, e confirmou mais tarde que o total subiu para 121. O governo afirma que todos os mortos, exceto os agentes, eram suspeitos de envolvimento com o tráfico.

Caique Lima
Caique Lima, 27. Jornalista do DCM desde 2019 e amante de futebol.