
Diante da crescente pressão internacional e condenações de diversas entidades, Israel começa a considerar permitir a entrada de jornalistas estrangeiros na Faixa de Gaza. Paralelamente, acusações contra os jornalistas mortos vêm sendo feitas por autoridades israelenses.
Entre os jornalistas mortos está Anas al-Sharif, um correspondente amplamente conhecido. Israel o acusou de integrar a ala militar do Hamas, sem apresentar evidências concretas.
Em uma entrevista concedida ao CPJ em julho, al-Sharif havia alertado sobre os riscos que enfrentava devido às acusações: “Não eram apenas uma ameaça midiática ou uma destruição da imagem, mas sim uma ameaça real à vida. Tudo isso acontece porque minha cobertura dos crimes da ocupação israelense na Faixa de Gaza os prejudica e mancha sua imagem no mundo. Eles me acusam de terrorista porque a ocupação quer me assassinar moralmente”.
Desde os ataques do grupo Hamas contra Israel, em outubro de 2023 — que deixaram cerca de 1.100 mortos —, a resposta militar israelense na Faixa de Gaza provocou a morte de 192 jornalistas, de acordo com o CPJ. Já as autoridades sanitárias de Gaza falam em 238 profissionais da imprensa mortos. Além disso, 90 jornalistas foram presos por Israel no mesmo período.
Em 2024, o CPJ classificou Israel como o segundo país que mais prendeu jornalistas no mundo, ficando atrás apenas da China. A maioria das detenções ocorreram nos territórios ocupados da Cisjordânia e Gaza. Um levantamento do Projeto Custos da Guerra, da Universidade Brown (EUA), revelou que nenhum outro conflito armado causou tantas mortes de jornalistas quanto a guerra em Gaza.
Para comparação, os dados indicam:
- 69 jornalistas mortos nas duas Guerras Mundiais;
- 71 durante as guerras dos EUA no Vietnã, Camboja e Laos;
- 19 na guerra da Ucrânia desde fevereiro de 2024.

“Desde a década de 2000, governos nacionais e grupos terroristas – de Israel, o regime sírio de [Bashar al] Assad e os Estados Unidos ao Estado Islâmico – encontraram maneiras de restringir a cobertura de conflitos por uma série de meios, desde políticas repressivas até ataques armados”, afirma o relatório.
“Todos mataram jornalistas e ajudaram a fomentar uma cultura de impunidade, transformando zonas de conflito como Síria e Gaza em ‘cemitérios de notícias’.”
Desde o início da guerra, a ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) protocolou quatro queixas contra Israel no Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia. Na última denúncia, apresentada em novembro de 2024, a organização afirmou que as mortes de jornalistas “permanecem impunes” e classificou os ataques como um “massacre sem precedentes”.
A RSF, junto a dezenas de entidades defensoras dos direitos humanos e da liberdade de expressão, exige também o fim do bloqueio à entrada de jornalistas estrangeiros em Gaza, que vigora desde outubro de 2023.
“O bloqueio midiático imposto sobre Gaza, com o massacre de quase 200 jornalistas pelo exército israelense, facilita a destruição total do enclave sitiado, bem como seu apagamento. As autoridades israelenses proíbem a entrada de jornalistas estrangeiros e orquestram um controle implacável da informação. Trata-se de uma tentativa metódica de sufocar os fatos, calar a verdade, isolar a imprensa palestina — e com ela, a população”, afirmou Thibaut Bruttin, diretor geral da RSF.
No domingo, durante uma entrevista coletiva, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, declarou que orientou o Exército a se preparar para levar mais jornalistas estrangeiros à Faixa de Gaza. O objetivo seria permitir que “vejam com os próprios olhos” as ações israelenses, incluindo a distribuição de ajuda humanitária.
Entretanto, a ONU e diversas organizações humanitárias criticam o novo sistema de ajuda coordenado por uma fundação financiada pelos EUA, classificando-o como ineficiente e perigoso para os civis. Apesar de destacar preocupações com segurança, Netanyahu afirmou que “isso pode ser feito”.
Historicamente, a entrada da imprensa estrangeira em Gaza tem ocorrido de forma extremamente limitada. Nos últimos dois anos, jornalistas de fora só puderam entrar com escolta militar e por poucas horas, sendo obrigados a submeter todo o conteúdo à censura oficial antes da publicação.
Assim, a promessa de Netanyahu é vista com ceticismo por parte de veículos e ONGs de imprensa, uma vez que não há garantias de que os jornalistas terão liberdade editorial ou operacional dentro do enclave.