Muitos analistas brasileiros vinculados ao que seria o pensamento de esquerda se negam a admitir um detalhe – e que detalhe – que aparece em quase todas as tentativas de compreensão do que levou à eleição avassaladora de Trump.
O detalhe é esse: nunca antes uma eleição teve uma divisão tão clara entre os votos dos homens, com a grande maioria ao lado de Trump, e das mulheres, com a vasta maioria ao lado de Kamala.
Foi uma eleição do macho identificado ou a caminho da identificação com o que seria muito mais do que o conservadorismo, contra o avanço do poder e da autonomia das mulheres.
Por que parte da esquerda evita o reconhecimento dessa realidade? Porque para essa parcela só interessam as grandes questões ditas estruturais, como macroeconomia, inflação, emprego, imigração e o desalento que engloba tudo isso.
Parte da esquerda vê essa conversa sobre o macho trumpista inseguro como irrelevante. Porque mexe com o machismo de parte da própria esquerda e com as inseguranças desses machos que se consideram progressistas.
Para o macho de esquerda que só vê economia, inflação e renda, essa seria uma conversa de luluzinhas, uma pauta quase identitária, porque envolve abordagens sobre gêneros e cai na armadilha das controvérsias dos costumes e feministas.
Não é uma pauta identitária. É uma questão de fundo. Ficou claro, nos apelos tanto de um lado quanto do outro, durante a campanha, que Kamala tentava conquistar o voto masculino, enquanto Trump dizia: ela despreza vocês.
E aconteceu o que muitos previam: até o macho latino votou em Trump muito mais do que em Kamala. Os machos imigrantes votaram no republicano. Os machos negros nunca teriam votado tanto num candidato da direita como agora. E Trump conquistou também os machos jovens.
Mas essa é uma conversa quase submersa para quem acha que a guerra de machos ultraconservadores que temem as mulheres desvia o foco da luta de classes e de outras macroquestões.
Machos inseguros de direita e esquerda, que se assustam com as mulheres, poderiam sentar e conversar. E, se quiserem, que um chore no ombro do outro.
Publicado originalmente no “Blog do Moisés Mendes”