Na Índia, agricultores protestam contra presença de Bolsonaro: “Corrupto e repressivo”

Atualizado em 19 de janeiro de 2020 às 10:51
Manifestantes contra a presença de Bolsonaro como líder convidado pelo governo indiano para a comemoração do Dia da República / Bhavreen Kandhari/Twitter

Publicado originalmente no site Brasil de Fato

Produtores rurais indianos lançaram, no último final de semana, uma campanha contra a presença do presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, nas comemorações do Dia da República da Índia, que devem acontecer no 26 de janeiro.

A ação #GoBackBolsonaro (em português, “vá embora, Bolsonaro”) foi lançada pela Federação de Produtores de Cana-de-Açúcar da Índia e tem apoio da All India Kisan Sabha, maior organização de camponeses do país, fundada em 1936.

A frase em repúdio à presença de Bolsonaro será exibida em faixas e bandeiras negras expostas sobre as áreas de cultivo. O objetivo da campanha é exigir a retirada do convite feito a Bolsonaro pelo governo indiano para participar da comemoração. “Nosso protesto também será uma ação de solidariedade em apoio ao povo brasileiro, que protesta contra seu regime corrupto e repressivo”, afirmou a federação em nota.

Bolsonaro embarca para a Índia na próxima sexta-feira (24), a convite do primeiro-ministro Narendra Modi, de extrema direita. O Dia da República lembra a data em que a Constituição indiana entrou em vigor, em 1950.

Motivações

O protesto dos camponeses indianos tem motivações políticas e econômicas.

A primeira parte da nota divulgada pela federação dos produtores de cana afirma que Bolsonaro “adere a uma ideologia de extrema direita” e é “cada vez mais autoritário”.

“Testemunhamos suas políticas destrutivas e exploradoras no Brasil, incluindo a abertura de portas para a espoliação corporativa da floresta amazônica”, segue o texto de lançamento da campanha.

Do ponto de vista econômico, os agricultores indianos afirmam que a postura do governo brasileiro na Organização Mundial do Comércio (OMC) afeta diretamente seus meios de subsistência.

Brasil, Austrália e Guatemala questionaram, na OMC, as medidas protecionistas do governo indiano para beneficiar os produtores de cana-de-açúcar. O argumento é que o subsídio concedido pela Índia excederia o limite permitido internacionalmente. Por outro lado, os camponeses afirmam que a base de cálculo usada por esses países considera os valores de importação e exportação da década de 1980, ignorando a inflação do período.

Para comprovar sua hipótese, os agricultores indianos citam, na nota de lançamento da campanha, que não receberam do governo local sequer os subsídios mínimos previstos na legislação do país – chamados de preços justos e remuneratórios.

“Se a OMC tomar uma decisão contra a Índia, (…) a produção local cairá e seremos empurrados para a importação de açúcar”, afirma a federação. “Na ausência das atuais políticas de apoio, o setor de cana-de-açúcar, que emprega mais de 50 milhões de agricultores e mais de 500 mil trabalhadores nas usinas de açúcar, pode enfrentar um colapso iminente”, alerta.

O açúcar promete ser um dos temas-chave da visita de Bolsonaro à Índia. Na semana passada, o presidente brasileiro se reuniu com representantes da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica), que reúne ruralistas do setor. Durante o encontro, afirmou que o Brasil estuda meios de apoiar a Índia no fortalecimento de seu programa de etanol, incluindo formas de aumentar a produção do biocombustível e sua mistura com gasolina, o que poderia reduzir estoques de açúcar no país asiático e alavancar os preços do açúcar no mercado internacional.

O volume de açúcar exportado pelo Brasil registrou, em julho de 2019, seu menor nível em cinco anos – cerca de 28% a menos que no ano passado e 63% a menos que em 2017.