Não chore pelo JT

Atualizado em 1 de novembro de 2012 às 17:41

Ao deixar de circular, o Jornal da Tarde já estava editorialmente morto fazia muito tempo

O ultimo grande momento do JT. A derrota do Brasil na Copa do Mundo da Espanha, em 1982

O Jornal da Tarde morreu em algum momento da década de 1980, embora só agora tenha deixado de circular.

Foi, como se vê, uma agonia longa.

Vigor real o JT teve por um breve momento, nos anos 1970, quando era o jornal dos jovens paulistanos. Era visualmente inovador, e tinha jornalistas brilhantes como  o editor Murilo Felisberto, conhecido como Rainha e com um olhar particularmente agudo para a arte, e o colunista Telmo Martino, ferino, impiedoso, irresistível ao tratar das pessoas dos altos círculos paulistanos.

Telmo, com sua irreverência gay e seu estilo primoroso, foi titular da melhor coluna social que a imprensa de São Paulo jamais teve. De um dançarino celebrado, ele dizia que tinha sapatilhas de dois quilos. De um jornalista bem colocado nascido no interior, ele dizia que era o Jeca dos Jardins.

Nenhum dos sucessores de Telmo no colunismo social de São Paulo chegou perto dele – nem Joyce Pascovitch e nem Mônica Bérgamo. Telmo fez o milagre de não tornar ridículas colunas sociais – e não com truques boçais como acrescentar notícias de negócios ao vai-e-vém de festas. Era como se Telmo fosse um colunista social clássico e, ao mesmo tempo, Zé Simão. A receita para isso acho que só ele tinha.

O JT morreu, ou começou a morrer, quando perdeu para a Folha a condição de jornal dos jovens paulistanos. Foi consequência menos das virtudes da Folha do que dos defeitos dos Mesquitas em todos os campos imagináveis – jornalísticos e administrativos.

O jornal virou “um velho vestido de jeans”, para usar uma expressão que ouvi há décadas, e jamais esqueci, de um professor de jornalismo que tive na Faap, Rodolfo Konder.

Ninguém fez coluna social em São Paulo como Telmo Martino

A Folha se deu bem nas Diretas Já, o movimento que pregava eleições livres para encerrar a ditadura militar. E o JT, como seu irmão mais velho, o Estadão, não enxergou o mundo novo. Ambos pareceram achar que publicar receitas em lugar de textos censurados era o suficiente para continuarem relevantes.

As brigas internas familiares dos Mesquitas impediram que eles vissem que o real inimigo não era um lado do clã ou outro, mas a Folha de S. Paulo. Logo o JT se tornaria um jornal morto em circulação.

Se sem a internet ele já não fazia sentido, com ela o JT já não prestava sequer para embrulhar peixe no dia seguinte, dada a pouca quantidade de páginas.

Qual jornal de São Paulo será o próximo? Meio século atrás, na era do papel, vigorava a tese de que São Paulo não era grande o suficiente para dois jornais.

Agora, São Paulo é bem maior do que era, mas ironicamente parece não caber já sequer um grande jornal de papel. Se eu fosse consultor, sugeriria aos acionistas da Folha e do Estadão que vencessem os preconceitos e as vaidades e tentassem unir forças num único jornal.

Mas essa improvável união só teria alguma chance se os dois jornais se modernizassem mentalmente. Como o JT de trinta anos atrás, Folha e Estado são velhos de espírito, conservadores, reacionários – e sequer jeans vestem.