Não deu outra: contando mentiras, Bolsonaro protagonizou vexame na ONU. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 24 de setembro de 2019 às 12:15
Bolsonaro não cansa de nos envergonhar

Jair Bolsonaro voltou a usar um versículo bíblico sobre a verdade — João 8:32 — para propagar uma série de mentiras.

Eis algumas:

No discurso da ONU, ele falou que o Brasil esteve sob ameaça de implantação do socialismo.

Insinuou que as escolas estavam sendo usadas para perversão das crianças.

Sugeriu que o programa Mais Médicos, bem avaliado pela população, era uma estratégia para a mudança de regime no país.

Sustentou que a floresta amazônica não está sob ameaça de devastação, apesar do monitoramento por satélite indicar ampliação das queimadas.

Bolsonaro fez um discurso ideológico, como se estivesse em campanha eleitoral.

Na área internacional, elegeu como inimigos Cuba, Venezuela e atacou Emmanuel Macron, sem citar o nome dele.

Também fez seu discurso contra a imprensa e defendeu — é quase inacreditável — a ditadura militar, que teria vencido uma guerra que objetivava acabar com o capitalismo no Brasil.

“Há poucas décadas, tentaram mudar o regime brasileiro e de outros países da América Latina. Foram derrotados. Civis e militares brasileiros foram mortos e outros tantos tiveram suas reputações destruídas, mas vencemos aquela guerra e resguardamos nossa liberdade”, disse.

Bolsonaro levou para a ONU o pior da nossa história, falou com indisfarçável orgulho do terrorismo de estado, que torturou e matou.

Com “reputação destruída”, ele provavelmente estava se referindo a Carlos Alberto Brilhante Ustra, o chefe do DOI-Codi, apontada por mais de uma vítima como um sádico torturador.

Bolsonaro também defendeu os policiais militares, ao destacar que eles são as maiores vítimas da violência no país.

Falando também a seu público, ele mencionou perseguição a cristãos como se fosse um problema brasileiro.

Aqui a perseguição se dá contra seguidores de religiões de matiz africana.

“É inadmissível que, em pleno século XXI, com tantos instrumentos, tratados e organismos com a finalidade de resguardar direitos de todo tipo e de toda sorte, ainda haja milhões de cristãos e pessoas de outras religiões que perdem sua vida ou sua liberdade em razão de sua fé”, disse.

De onde Bolsonaro tirou esse número de que são milhões de cristãos que perdem sua vida?

Possivelmente, é uma contribuição de Damares Alves, a mesma que deve ter soprado a ele outros dados falaciosos.

“Durante as últimas décadas, nos deixamos seduzir, sem perceber, por sistemas ideológicos de pensamento que não buscavam a verdade, mas o poder absoluto. A ideologia se instalou no terreno da cultura, da educação e da mídia, dominando meios de comunicação, universidades e escolas. A ideologia invadiu nossos lares, para investir contra a célula máter de qualquer sociedade saudável, a família”, disse.

Só faltou falar em kit gay, que nunca existiu.

“Tentaram ainda destruir a inocência de nossas crianças, pervertendo identidade mais básica e elementar, a biológica”, afirmou.

O discurso de Bolsonaro foi ideologicamente forte, uma mensagem para o público de extrema direita do Brasil e do exterior.

Não houve compromisso com a verdade factual.

Como a onda de extrema direita dá sinais de que está passando, Bolsonaro protagonizou uma fala que não resistirá ao tempo.

Ficará na história como o registro de um chefe de estado menor, uma vergonha para o Brasil, o protagonista de vexames em série.