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“Não é só dinheiro, não é só status”: a lição do Ituano para o futebol

 

“A equipe demonstrou que com um orçamento de pés no chão dá pra fazer grandes coisas. O futebol brasileiro não é só dinheiro, não é só status”.

O meio-campista Marcinho, do Ituano, resumiu assim a vitória contra o Santos nos pênaltis, que valeu o Campeonato Paulista. É uma simplificação, mas faz todo o sentido.

O Ituano é um lembrete do que o futebol brasileiro foi antes de virar uma indústria movida a corrupção, desorganização e, eventualmente, bons espetáculos. A folha de pagamento dos jogadores soma 350 mil reais. Leandro Damião, do Santos, ganha 500 mil por mês.

Juninho Paulista, revelado lá, é o administrador. Saneou as finanças, contratou o técnico Doriva e chamou atletas veteranos e desconhecidos de categorias inferiores. Foram cinco anos de trabalho.

Como os absurdos do futebol estão banalizados, ninguém mais ergue uma sobrancelha diante dos vencimentos de Neymar, por exemplo. Foi preciso Johan Cruyff, ex-craque do Barcelona, falar o óbvio: “Neymar é vítima do dinheiro, de seu agente e do clube. Ninguém com 21 anos é Deus”. (Neymar tem 22, na verdade).

É inevitável que times ricos (e eternamente endividados) sofram mais pressão. Fred, atacante do Fluminense, salvo do rebaixamento no tapetão, fatura 9 milhões no ano. Recentemente, foi cercado por torcedores na saída de um treino e quase apanha. Escreveu um post indignado no Facebook. “Será que somente quando um jogador for espancado alguma providência mais enérgica e eficaz será tomada contra esses bárbaros?”, pergunta ele.

Dê uma olhada em Felipão. O técnico da seleção virou uma figura onipresente na TV. Está fazendo propaganda para Vivo, Guaraná Antarctica, Peugeot e Walmart. Calcula-se que seu cachê seja de 1 milhão de reais.

Com o fim do campeonato, o Ituano será desmontado. Santos, Palmeiras, Botafogo e Fluminense já manifestaram interesse em nomes como Anderson Salles, Rafael Silva, Jackson Caucaia e Esquerdinha, entre outros.

O Ituano voltará a jogar só daqui a três meses, após a Copa, desfigurado. Deve sumir, como sumiram São Caetano, Bragantino e outros. Mas, por um momento, lembrou que o futebol, como diz Marcinho, não é só dinheiro, não é só status.

Kiko Nogueira

Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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Kiko Nogueira

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