Não há Paris para todos. Por Moisés Mendes

Atualizado em 7 de outubro de 2024 às 6:54
Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), candidatos à Prefeitura de SP – Foto: Reprodução

Muitas rotas de fuga estarão fechadas no segundo turno. Não há como ser neutro em São Paulo e em outras capitais ou tentar se esconder em Paris, Sorocaba ou Alegrete. Eis a realidade condensada diante de convictos e vacilantes em relação ao desfecho das eleições em 27 de outubro:

1. Bolsonaro é a figura que fica diante do maior dilema pós-primeiro turno. Esnobou Ricardo Nunes desde o começo. Depois, quando o Datafolha colocou o prefeito em melhor posição em setembro, correu, meio frouxo, para o lado do esnobado. Quando as pesquisas mostraram que Marçal havia reagido, a partir da base bolsonarista, saltou fora do apoio a Nunes mais uma vez. Sempre disse que Nunes não era o seu preferido. Viu sua base raiz correr em direção a Marçal e agora terá de fazer o que Tarcísio de Freitas pediu e ele desconsiderou, na reta final do primeiro turno: que investisse no candidato do velho MDB para manter um certo controle em São Paulo, sabendo que Nunes é muito mais da antiga direita do que do bolsonarismo. O Bolsonaro que se vê obrigado a se agarrar a Nunes sai avariado da eleição, principalmente com o vexame de Ramagem no Rio.

2. Lula não foi escondido pelas esquerdas na campanha pela TV e pelas redes sociais, mas se manteve numa distância analógica da eleição e do cenário mais importante, o de São Paulo. Não foi participativo ao lado de Boulos. Mas agora terá de correr riscos e se engajar à luta. Pode ficar marcado como derrotado, principalmente se Bolsonaro se envolver na disputa? Ou paga pra ver como pode ajudar ou será cobrado, com Boulos vencedor ou perdedor.

3. Fora do campo da luta política, mas por essa contaminado, a Procuradoria-Geral da República de Paulo Gonet terá de sair da hibernação e preparar o roteiro pós-eleição, para abrir o período de denúncias contra Bolsonaro e seu entorno. O Judiciário entra em recesso em 20 de dezembro, e aí para tudo, inclusive no MP, e só volta em 6 de janeiro, cinco dias depois da posse dos eleitos. O procurador calibrou o tempo do MP com o tempo da política até aqui, mas agora não tem mais como adiar o que precisa ser feito. Nunca existirá Paris para Gonet.

4. Alexandre de Moraes, que nunca pensou em Paris, aguentou a carga dos inquéritos que carrega nas costas, alguns há cinco anos, principalmente aquele que começa com as fake news e tem tudo dentro, de civis a gente com farda e com pijama. O tempo para Moraes se esgota esse ano, porque 2025 já terá o início da guerra para 2026. Toda a delinquência qualificada do fascismo está em algum inquérito conduzido por Moraes, que enfrenta uma pergunta como constrangimento: quem mais será alcançado além dos manés de 8 de janeiro?

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal – Foto: Reprodução

5. O povo, esse ente coletivo cada vez mais gasoso e indecifrável pela ciência política, não tem como ir para a Paris do Ciro Gomes. Mas se protege do jeito que dá nos seus biombos. O maior biombo numa eleição é o que acolhe os que se abstêm, somados aos que votam em branco ou anulam ou voto. De cada cem eleitores, 25 em média vão para essa Paris do distanciamento e das ausências, pelos mais variados motivos, mas a maioria se esconde mesmo por gesto deliberado contra a imposição do voto. Esse povo da negação se juntou ao povo do desalento, correu para a extrema direita a partir de 2018, ensaiou a reinvenção do bolsonarismo com Marçal, mas o que fez mesmo foi fortalecer a velha direita nessa eleição. Esse povo é cada vez menos das esquerdas, na maioria das cidades, das grandes aos vilarejos. E não há fuga para as esquerdas que já não entendem o povo.

(Depois da conclusão desse texto, ficamos sabendo que Tabata Amaral abriu o voto para Boulos no segundo turno.)

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