Não vai ter trégua, Onyx. O mecanismo segue operando. Por Helena Chagas

Atualizado em 8 de dezembro de 2018 às 19:10

Nunca antes na história deste país um presidente eleito conseguiu tanta mídia negativa antes de tomar posse quanto Jair Bolsonaro esta semana.

Dos grandes jornais à TV Globo, sem falar nos portais e redes sociais, o caso Coaf tomou conta do noticiário a partir do vazamento do relatório sobre a movimentação bancária suspeita do ex-assessor de Flávio Bolsonaro na Alerj, Fabricio Queiroz.

Mostrando pouco traquejo, e até falta de equilíbrio emocional para lidar com a crise – o futuro ministro Onyx Lorenzoni abandonou uma entrevista botando o dedo na cara dos jornalistas- Bolsonaro e seus assessores podem até tentar culpar a grande mídia e acusar os jornalistas de perseguição, mas não terão como sustentar esse argumento por muito tempo.

A descoberta vem da investigação filhote da Lava Jato que prendeu dez deputados estaduais do Rio por esquemas de propina e outros crimes na Alerj. Foi lá que o Coaf descobriu a movimentação de R$ 1,2 milhão na conta do assessor, na qual sete outros assessores do senador eleito fizeram depósitos e da qual teriam saído cheques para a futura primeira dama Michelle Bolsonaro.

Sem entrar no mérito da denúncia em si, que poderá ou não ser explicada satisfatoriamente pelos Bolsonaro, há uma constatação inevitável em sua divulgação: o mecanismo, que se não foi inventado em Curitiba foi lá consolidado como modelo de gestão de investigações pela Lava Jato, continua funcionando a todo o vapor. E não há o menor sinal de que vai parar depois da eleição de Bolsonaro.

Esse mecanismo tem como pilar importante a divulgação, ou o vazamento, de informações, relatórios (como esse do Coaf), trechos de depoimentos de delatores quase sempre comprometedores para os políticos que estão no alvo – que, culpados ou inocentes, ficam sabendo pela mídia.

E o roteiro sempre segue a partir daí: noticiário, abertura de inquérito, denúncia e, claro, a desmoralização da política.

Esse foi, aliás, um dos componentes importantes da eleição de Bolsonaro: o voto antipolítica e anticorrupção. Mas o mecanismo continua vivo e, mais cedo do que se imaginava, volta-se contra ele e os seus.

Ao nomear o juiz Sergio Moro para comandar a Justiça, com superpoderes para combater a corrupção, o presidente eleito apertou ainda mais a armadilha na qual agora se encontra.

Não pode questionar as investigações e nem seus comandantes, não poderá sequer pedir algum alívio à Polícia Federal, ao Coaf ou a quem quer que seja.

O futuro ministro Onyx, ele mesmo alvo numa acusação de caixa 2, ficou nervoso e chegou a pedir trégua à imprensa. Não vai haver trégua, Onyx.

Sempre haverá um agente público disposto a vazar uma informação que comprometa alguém, e sempre haverá um jornalista pronto a publicá-la antes da concorrência. E o público acostumado a esse cardápio pedindo sempre mais. Apertem os cintos.