“Nem a União Soviética teria feito isso”, diz Amorim sobre pressão de Trump ao Brasil

Atualizado em 27 de julho de 2025 às 20:01
Celso Amorim, assessor de Relações Exteriores da Presidência. Foto: Divulgação

O assessor de Política Externa da Presidência, Celso Amorim, afirmou neste domingo (27) que o Brasil intensificará seu compromisso com o Brics diante da ameaça do ex-presidente dos EUA, Donald Trump, de impor tarifas de 50% às exportações brasileiras.

Em entrevista ao ‘Financial Times’, Amorim classificou as declarações de Trump como um ataque à ordem multilateral e uma interferência sem precedentes na política interna do Brasil. Ele ainda afirmou que não pretende adiar a aplicação das tarifas, que devem entrar em vigor em 1º de agosto.

O republicano ainda condicionou o fim da taxação ao arquivamento do processo judicial contra Jair Bolsonaro, acusado de tentar um golpe de Estado. Segundo Amorim, a exigência americana representa um nível de intervenção que “nem mesmo a União Soviética teria feito”. “Trump está atuando politicamente dentro do Brasil em favor do seu amigo Bolsonaro”, disse.

Amorim negou que o Brics tenha caráter ideológico e destacou que a aliança, formada por Brasil, China, Rússia, Índia e África do Sul, busca defender o multilateralismo em um cenário de crescentes ações unilaterais por parte dos EUA. “Queremos diversificar nossas relações e não depender de nenhum país só”, afirmou.

Segundo ele, o Brasil também mantém parcerias com Europa, América do Sul e Ásia. A China, embora seja o maior parceiro comercial do Brasil, com mais de US$ 94 bilhões em importações no último ano, não deve ser vista como a principal beneficiária da crise, segundo Amorim.

Ele reafirmou que o objetivo brasileiro não é favorecer Pequim com as tarifas do presidente dos EUA, mas fortalecer uma agenda comercial mais equilibrada. “Os países não têm amigos, têm interesses. Trump não tinha nem amigos, nem interesses, só desejos”, declarou.

Jair Bolsonaro ao lado do presidente dos EUA Donald Trump. Foto: Divulgação

O embaixador defendeu ainda a ratificação urgente do acordo entre Mercosul e União Europeia como forma de garantir ganhos econômicos imediatos e reforçar o equilíbrio nas relações comerciais globais. Amorim revelou que o Canadá já demonstrou interesse em firmar um acordo de livre comércio com o Brasil. Ele também destacou que, no último ano do governo Lula, o foco será a integração regional sul-americana.

O presidente Lula, por sua vez, também reagiu às ameaças de Trump. Em evento em Osasco (SP), afirmou que o ex-presidente americano “foi induzido a acreditar em uma mentira” sobre perseguição a Bolsonaro. “O Bolsonaro não é um problema meu, é um problema da Justiça brasileira. Se Trump tivesse me ligado, eu explicaria o que está acontecendo”, disse.

Lula designou o vice-presidente Geraldo Alckmin para conduzir possíveis negociações. Apesar dos esforços do Planalto, a entrada em vigor do tarifaço já é considerada praticamente inevitável por autoridades brasileiras. Além da escalada diplomática, o cenário gerou críticas da oposição.

Em evento com investidores, governadores como Tarcísio de Freitas (SP), Ronaldo Caiado (GO) e Ratinho Jr. (PR) condenaram a estratégia do governo. Ratinho Jr. chamou a fala de Lula sobre desdolarização de “falta de inteligência” e afirmou que “Bolsonaro não é mais importante que a relação comercial entre Brasil e Estados Unidos”.

As tarifas impostas por Trump não afetam apenas o Brasil, mas também outros integrantes do Brics e países considerados “hostis” pelo ex-presidente americano. A medida, segundo analistas, visa pressionar nações que se afastam do modelo unipolar liderado pelos EUA. Diante disso, o governo brasileiro reforça sua postura de manter uma diplomacia multilateral, defendendo um comércio internacional menos subordinado a interesses unilaterais.