No ataque a Maria do Rosário, Gentilli exalou o cheiro de sua ignorância política. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 15 de dezembro de 2017 às 9:42

Este texto está sendo republicado em virtude da condenação do humorista pelo TJ/RS em processo movido por Maria do Rosário.

Danilo Gentili expôs não só seu humor sem graça como também todo seu analfabetismo político, ao gravar um vídeo com sua reação a uma notificação da deputada Maria do Rosário, feita através da Procuradoria da Câmara dos Deputados.

— Eu pago o seu salário. Então eu decido se você cala ou não a boca, nunca o contrário – disse ele, no final de uma sequência de imagens de uma agressividade vulgar.

É comum gente ignorante como Danilo Gentilli se referir a parlamentares como seus servidores.

Na frente da Câmara Municipal de São Paulo, há anos um senhor vestindo capa preta e, às vezes, com um tridente e chifrinhos, como se fosse um diabo, usa um alto falante quase todos os dias para gritar que paga o salário dos vereadores e, portanto, todos eles são seus empregados.

Errado.

Tanto o diabo da Câmara como Danilo Gentilli não têm noção mínima do que é a representação proporcional em uma democracia.

Parlamentares têm mandato por delegação de seus eleitores e, em tese, a eles – e ao partido pelo qual se elegeu –, devem satisfação sobre seu trabalho.

Só a eles.

Pelo seu perfil e pelas suas manifestações, é razoável supor que Danilo não votou em parlamentares como Maria do Rosário – apostaria em Bolsonaro, mas como o voto é secreto deixo para lá.

Também não importa.

O fato é que Maria do Rosário assumiu uma cadeira na Câmara dos Deputados pela escolha de pessoas que não pensam como Danilo. Se dependesse dele, políticos como Maria do Rosário estariam lhe servindo água e café, como aquela assistente negra que ele exibe como um troféu em seu programa.

O salário de Maria do Rosário ou de Jair Bolsonaro é por pago por decisão da Constituição brasileira, que, pelo sistema de eleição proporcional, dá voz e, às vezes, poder aos mais diferentes segmentos da população.

É claro que há limites para a atuação de quem detém mandato.

Por exemplo, em tese  — digo, em tese –, órgãos de fiscalização e controle existem para impedir que o dinheiro público seja usado fora do propósito de representação parlamentar.

Parlamentar não pode usar passagem aérea paga com verba de representação para fazer turismo.

Mas quem decide se o limite de gastos legais foi ultrapassado é o órgão de fiscalização e controle – pode ser uma corregedoria, mas pode ser também o Judiciário. Nunca o eleitor de outro representante.

Você pode dizer que determinado parlamentar é o representante do atraso – mas não pode dizer que ele não tem legitimidade para usar o dinheiro público, nos limites definidos por lei, para propagar suas ideias ou até mesmo, em nome de seus eleitores, se defender de ataques injuriosos ou difamatórios como, ao que parece, fez Danilo Gentilli em relação a Maria do Rosário – com ofensas de caráter pessoal, o que teria motivado a representação.

Há vinte dias, quando estive em Curitiba para cobrir o depoimento de Lula ao juiz Sérgio Moro, entrevistei algumas pessoas que tinham viajado de Natal, no Rio Grande do Norte, para Curitiba, para manifestar apoio ao juiz. Queria entender o que as motiva.

Uma senhora dizia coisas desconexas, como vincular o PT, Lula, Fernando Henrique Cardoso, o PSDB a uma conspiração planetária que resultou em ataques terroristas que já estariam ocorrendo no Brasil.

“Está sim, está sim”, disse ela repetidas vezes quando afirmei que não tinha notícia de nenhuma ocorrência nesse sentido.

Ela citou um confronto na Paulista — aquele em que manifestantes ligados ao MBL atacaram pessoas de origem árabe para protestar contra a recém aprovada lei de imigração.

Para ela e seus acompanhantes, todos de classe média, a nova legislação abriu as portas do Brasil para os terroristas.

Coisa de louco.

Igual aquela senhora que viu a bandeira japonesa numa exposição no Congresso Nacional e disse que era a prova de que queriam colocar a bola vermelha na Bandeira do Brasil, como representação de um poder comunista.

Ela e os manifestantes que viajaram de avião para apoiar Sérgio Moro em Curitiba se definem como de direita.

Não. Não são de direita. Como também não é Danilo Gentilli.

São apenas ignorantes, que seguem ídolos tão ignorantes como eles e se retroalimentam com porcarias como o que faz o apresentador do SBT.