Nossa colunista responde ao artigo de Eduardo Cunha na Folha. Por Nathalí Macedo

Atualizado em 28 de novembro de 2015 às 11:18
O casal Cunha
O casal Cunha

Senhor Deputado,

A grande piada do seu texto de opinião na Folha de São Paulo começa pelo título: não fizeram do senhor o inimigo número 1 das mulheres. O senhor mesmo tratou de fazê-lo. Aliás, não apenas inimigo número 1 das mulheres, mas do Brasil.

O sentimento uníssono diante de sua tentativa esdrúxula de se safar das acusações que pesam contra o senhor é de vergonha alheia. E alegria, confesso: parece que a luta das mulheres brasileiras tem surtido tanto efeito que o senhor se acovardou, como os ratos que são os primeiros a abandonar o navio.

Queremos dizer que isto não está funcionando. Pior: está mostrando ao Brasil ainda mais nitidamente a sua face medonha e covarde.

O senhor merece, talvez pela primeira vez, nossos vigorosos aplausos: conseguiu quebrar o próprio recorde no quesito cara-de-pau, ao declarar que a PL 5069 – de sua autoria, ao que me consta – não tem e não terá o seu apoio, e que as acusações que lhe fazem são uma forma de enganar a população. Deputado, os seus dólares na Suíça é que são uma forma de enganar a população, e vê-lo levantar-se tão pateticamente contra ludibriações ao Povo seria quase engraçado se não fosse, no mínimo, revoltante.

Ler uma declaração em que o senhor diz não se insurgir contra “abortos permitidos por lei, como no caso de estupro” é uma agressão aos nossos olhos. Não subestime a nossa inteligência, deputado, o texto do seu Projeto de Lei é cristalino: “Anunciar processo, substância ou objeto destinado aprovocar aborto, induzir ou instigar gestante a usar substância ou objeto abortivo, instruir ou orientar gestante sobre como praticar aborto, ou prestar-lhe qualquer auxílio para que o pratique, ainda que sob o pretexto de redução de danos: Pena: detenção, de quatro a oito anos.”

Aliás, é conveniente que compreenda que a nossa luta não é pelo direito ao aborto em caso de estupro – este é um direito adquirido, e que o senhor, provando sua latente incoerência, nos deseja tirar.

E, sim, nós conhecemos a sua posição antiaborto. Conhecemos tanto que fomos às ruas contra o senhor e a sua corja. Acontece que, embora não lhe ocorra, a ciência discorda de seu discurso pró-vida tão cheio de floreios: o cérebro do feto só se desenvolve entre 22 e 24 semanas de gestação. Antes disso o feto sequer sente dor e não se pode falar em vida.

E ainda que considerássemos essa afirmação equivocada de que “a vida começa na concepção”, pergunto: quão real é a sua preocupação – e a dos conservadores pró-vida de plantão – com a vida das pessoas? Vocês defendem que a criança precisa nascer, mas não são competentes e humanos o suficiente para lhe proporcionar o mínimo de dignidade – preferem enfiar dólares sujos em contas na Suíça. O senhor e sua corja não são pró-vida, não pró-nascimento. Utilizam o belo discurso de que “vidas não podem ser ceifadas” para podar impiedosamente a liberdade das mulheres sobre os seus corpos.

O senhor esclarece que não há pauta conservadora, mas a pauta da maioria da sociedade brasileira. E neste ponto, eu quase ouso concordar: Temos, de fato, uma direita alienada que exibe cartazes de #somostodoseduardocunha.

Mas preciso informar, para o seu descontentamento, que há, também, uma esquerda atenta. E principalmente um exército de mulheres cônscias de seus direitos e prontas para lutar, com todos os artifícios que puderem alcançar, contra o senhor e a sua corja de conservadores. E que, como diria Chico Buarque, “apesar de você amanhã há de ser outro dia”. Assim mostraram as quinze mil mulheres protestando na Avenida Paulista pela sua cassação e prisão.

O senhor – o grande algoz do Brasil – se coloca numa patética posição de vítima quando afirma que “ninguém lhe perguntou sobre as modificações no seu projeto.” De fato, ninguém lhe perguntou ou perguntará: diante de tantas mentiras deslavadas, a esta altura, sua palavra não nos vale de nada. Além do que, contra fatos – a PL 5069 é de sua autoria e isto é um fato – não há argumentos.

Em tempo: Contrate novos consultores de marketing pessoal. Quem sabe gente menos amadora o aconselhará que, na falta de bons argumentos, mais vale permanecer calado.