“Nova reforma trabalhista espanhola recupera direitos e empregos”, diz ao DCM economista de Madri

Atualizado em 6 de fevereiro de 2022 às 8:49
Protesto a favor da revisão da reforma trabalhista na Espanha

A reforma trabalhista espanhola foi aprovada na última quinta-feira com um placar apertado. 175 votos a favor. 174, contra. A decisão foi de Alberto Casero, deputado conservador que disse ter votado a favor por engano.

Se a disputa foi acirrada na Espanha, não se pode dizer o contrário do Brasil, onde a proposta do ex-presidente Lula de se inspirar no país ibérico foi recebida com amplas críticas do setor liberal.

Ambos países foram afetados nos últimos anos por reformas trabalhistas que enfraqueceram sindicatos por medidas como o fim da ultratividade, isto é, a continuidade de um acordo entre sindicatos e classes patronais mesmo se o período de vigência de uma negociação coletiva tiver expirado. A reforma trabalhista recém-ratificada pelo parlamento espanhol restabelece esse dispositivo.

“É uma reforma importante porque recupera aspectos que haviam sido lesados pela reforma de 2012”, diz Luis Cárdenas del Rey, professor no Departamento de Economia Aplicada da Universidade Complutense de Madri em entrevista ao DCM.

A recuperação é, no entanto, parcial. “Tanto a classe patronal quanto os sindicatos, como o governo e agora os partidos políticos, reconhecem que não é uma recuperação plena dos direitos que havia antes da reforma de 2012, de que não serão recuperados todos os direitos eliminados nas últimas décadas”.

Na visão do economista, a reforma estimulará o crescimento da economia. “As previsões atuais são de forte crescimento do emprego, acompanhado desta reforma trabalhista”.

Sobre o pensamento da classe patronal brasileira, que ele considera similar ao da espanhola, Cardenas considera errônea a oposição entre aumento de direitos e de emprego.

“Considero um erro vincular desregulação com a modernidade. Não tem sentido em grande parte. Os países onde há maior qualidade de emprego são os que têm presença sindical e convenções muito fortes, independentemente das modernizações que há”.

“É falso que em todo momento e lugar o aumento salarial destrói empregos”. Nesta entrevista, ele explica os pontos essenciais da reforma, por que a classe patronal de seu país a aceitou, como foi convencida por uma ministra comunista e os aspectos que devem servir de inspiração para outros países.

DCM: Um dos objetivos dessa reforma laboral é lutar contra a precariedade. De que maneira exatamente?

Luis Cardenas del Rey: A reforma modifica dois grandes aspectos. Por um lado, a negociação coletiva, que afeta as relações laborais. Por outro lado, tudo que tem a ver com contratação e regulação das relações de emprego propriamente ditas.

No primeiro aspecto, a reforma consistiu sobretudo em reverter dois dos pontos principais da reforma de 2012, que havia modificado o sistema de relações laborais e como se negociam as convenções coletivas.

A primeira modificação que se fez quanto às convenções coletivas foi recuperar o que na Espanha se chama de “ultratividade”. A ultratividade é quando uma convenção expira e, caso não tenha se chegado a uma nova convenção, mantém-se a vigente e todos os seus efeitos.

No ano de 2012, eliminou-se a ultratividade porque se acreditava que a permanência de tais convenções era prejudicial para o mercado de trabalho. No entanto, com a nova reforma, depois destes anos de aplicação, observou-se que o que realmente aconteceu foi que muitas convenções desapareceram como consequência de eliminar a ultratividade. E que a proteção oferecida por esses acordos era cada vez menor. Portanto, um primeiro ponto que o legislador atual tentou é reforçar a negociação coletiva, recuperando a ultratividade, eliminada em 2012.

Um segundo aspecto em relação ao que a reforma de 2012 fez foi dar prioridade aos acordos por empresa. Novamente com a ideia de que uma maior flexibilidade tinha que se obter por meio da própria empresa e não por setor, estado, província, etc.

Viu-se que com essa reforma os acordos por empresa tinham condições piores do que os negociados em âmbito superior. Quando se negocia em relação à indústria do setor metalúrgico, a convenção de todo o setor era melhor do que os acordos específicos por empresa.

Com a nova reforma, dá-se prioridade aplicativa à convenção de âmbito setorial, neste caso, por exemplo, a convenção do setor metalúrgico. Desta forma, os acordos por empresa não podem pagar menos do que as convenções setoriais.

Há alguns meses, houve uma greve intensa em Cádiz, cidade portuária do sul da Espanha, na qual se estava reivindicando precisamente uma convenção no setor metalúrgico. Portanto, (a reforma de 2022) é uma reforma importante porque recupera aspectos que haviam sido lesados pela reforma de 2012.

DCM: Como você avalia essa reforma, é eficaz quanto ao seu objetivo de acabar com a precariedade?

Sim. Em relação à precariedade, a principal modificação que se realizou foi acabar com o chamado contrato de obra e serviço. O contrato de obra e serviço era um contrato temporário no qual o empregado só tinha uma relação contratual durante um tempo determinado. Em outras ocasiões, o contrato poderia ser fixado com duração indeterminada, isto é, quando não se sabia quando uma obra ou serviço ia terminar.

Esses contratos eram uma fonte de precariedade, de modo que as pessoas encadeavam distintos tipos de contratos por obra e serviço por diversos períodos e no final das contas nunca conseguiam um trabalho estável.

Isso afetava tanto os seus salários, pois não acumulavam tempo de empresa, como também todos os seus direitos trabalhistas, relacionados a férias, licença médica, etc. A eliminação desses contratos por obra e serviço é esperada por parte do governo e do legislador, que implique um aumento do emprego fixo e que se reduza pelo menos parcialmente essa precariedade.

CUT
Lula, ex-ministros e sindicalistas se reuniram virtualmente com membros do governo e homologos espanhois em 11 de janeiro para discutir sobre a reforma trabalhista do pais europeu. Foto: Ricardo Stuckert

DCM: É efetivamente uma recuperação de direitos, como disse o governo espanhol?

É uma recuperação parcial. Acredito que todos os agentes implicados, tanto a classe patronal quanto os sindicatos, como o governo e agora os partidos políticos, reconhecem que não é uma recuperação plena dos direitos que havia antes da reforma de 2012, de que não serão recuperados todos os direitos eliminados nas ultimas décadas. É uma recuperação da capacidade de negociação coletiva, da ultratividade e da aplicação de convênios setoriais.

Outros elementos muito importantes não foram recuperados, como por exemplo a indenização por demissões. A reforma de 2012 reduziu consideravelmente a indenização por demissões. Hoje, as indenizações por demissões são menores do que o que se cobrava nos anos 2010 e 2011. Portanto, essa reforma nao recupera esses direitos mas supoe uma melhora em outros.

Sendo equânimes, eu diria que é uma reforma de recuperação parcial de direitos.

DCM: Em um artigo que você publicou na Universidade Complutense de Madri, você explica que a sociedade espanhola conhece diversas formas de precariedade, principalmente trabalhista, há décadas. Depois de nove meses de negociações desta reforma trabalhista, por que ela chega agora na Espanha?

É a primeira reforma resultado de um longo processo de negociação entre os principais sindicatos e a principal classe patronal ‒ que se divide em duas, as grandes e as pequenas empresas ‒, que começou no ano de 2020. Portanto, estavam sendo negociadas todas as grandes medidas de mercado trabalhista desde o início da pandemia nessa mesa tripartite, onde estavam governo, sindicatos e classe patronal.

Demorou nove meses para chegar a um acordo em primeiro lugar porque outros aspectos foram negociados durante esse período. Em segundo lugar, porque as diferenças de apreciação do que era mais conveniente eram muito grandes.

A classe patronal defendia que deveriam ser mantidos todos os elementos de flexibilidade que lhe havia dado a reforma de 2012, enquanto os sindicatos consideravam que todos os direitos trabalhistas perdidos deveriam ser recuperados, no sentido de que havia uma flexibilidade excessiva, uma desregulação excessiva do mercado de trabalho.

Portanto, isso explica essa dinâmica de um período tão amplo de negociação para chegar a um acordo. É um primeiro acordo sobre reforma trabalhista que se fez com pleno consenso e depois de um período de negociação tão amplo.

É fato que desde os últimos 30 ou 40 anos, quando se aprovou o Estatuto dos Trabalhadores, principal norma de trabalho na Espanha, decorreram-se múltiplas reformas, mais de 52 principais reformas e muitas outras pequenas.

Algumas delas haviam sido negociadas. Digamos que essa é a primeira fruto de um processo de negociação tão amplo e com tanta intensidade.

DCM: Mas por que essa reforma ocorre nesse momento, sendo que os socialistas estiveram no poder antes de Rajoy, que implementou a reforma de 2012?

Sim. Exatamente. Creio que a principal diferença foi que no início do ano de 2020 começou um governo de coalizão, entre o Partido Socialista e Unidas Podemos. Esse governo de coalizão fixava no seu acordo programático para a legislatura reverter a reforma laboral do ano de 2012. Fato é que ele dizia que a proposta era reduzir os aspectos “mais lesivos”, que não chegaram a ser especificados concretamente. Efetivamente mencionavam algumas partes, mas estava em aberto.

Portanto, concretizar esse aspecto do que era mais lesivo e deveria ser reformado e chegar a um consenso com os agentes sociais foi o que eles fizeram. A gestão da pandemia também exigiu um esforço considerável por parte das administrações públicas, fazendo com que (a reforma) se atrasasse em dois anos. O governo levou metade da legislatura para alcançar um acordo nesse sentido.

DCM: Uma parte da esquerda considera que essa reforma não é suficientemente ambiciosa. Ela tem razão?

É verdade no sentido que eu mencionava, que há aspectos importantes que não foram recuperados. Por exemplo, foi recuperada a prioridade aplicativa aos salários, mas não as jornadas, ou a organização do trabalho, as categorias profissionais ou a inclusão da prevenção de riscos laborais nas convenções. Isso foi deixado em âmbitos inferiores, dos acordos por empresa.

Tampouco foram recuperados os dois grandes aspectos, como a segurança no emprego. A indenização por demissão, cotas que foram modificadas no ano de 2012. Em 2002, se deu a possibilidade ao empregador reconhecer que a demissão era improcedente, de que não havia justa causa para fazer a demissão, mas em troca se pagava uma indenização e a demissão era justa e adequada.

Portanto, esses aspectos que haviam constituído um eixo central do mercado trabalhista, da regulação do mercado de trabalho na Espanha, desapareceram e não foram recuperados. Na minha opinião, essas críticas vão por aí, pela proteção do emprego fixo. É um aspecto no qual essa reforma trabalhista não tocou.

Reforma
O primeiro-ministro Pedro Sanchez (à esquerda) e parlamentares aplaudem ratificação da reforma trabalhista pelo parlamento espanhol. Foto: Twitter/Nadia Calviño

DCM: No Brasil, o setor liberal criticou a proposta do ex-presidente Lula de inspirar-se na reforma trabalhista espanhola. Por que a classe patronal a apoia na Espanha?

Ela a apoia porque, na Espanha como em qualquer outro país, o sistema de relações trabalhistas, isto é, todas as interações que há entre trabalhadores, representantes, empresários e sua classe patronal é resultado de um processo histórico amplo, em que há uma série de costumes que foram se adaptando e que criaram uma forma de funcionamento particular ao nosso caso.

Em grande parte, as empresas e os sindicatos haviam respondido negociando convenções, por exemplo em relação à ultratividade, que havia sido um elemento central desde os anos 1970 no sistema de negociações coletivas na Espanha. Ela desapareceu, mas houve uma tentativa de continuar se comportando como se ela não tivesse desaparecido legalmente, isto é, seguir negociando.

Naqueles lugares onde a classe patronal estava mais disposta a negociar, os sindicatos com maior capacidade para manter uma convenção conseguiram. Mas aqueles lugares onde os sindicatos eram menos capazes de fazê-lo por diferentes razões, desapareceram.

Então a classe patronal aceitou que se recupere esse aspecto, já que era um elemento importante. Em segundo lugar, creio que ela aceitou o aspecto dos salários porque em grande parte se mantêm outros tipos de flexibilidade em relação a tudo que tem a ver com a jornada, organização do trabalho, não puramente salariais.

Dado que grandes empresas do setor estavam pagando os salários das convenções, as que foram afetadas são as que tinham um acordo específico, em que se pagava menos. Então a própria classe patronal estava interessada em aceitar isso.

Digamos que são razões históricas e ligadas ao próprio comportamento das classes patronais na Espanha.

DCM: No Brasil, a classe patronal considera a reforma trabalhista de 2017, que pode ser análoga em alguns pontos à reforma espanhola de 2012 pela precarização de sindicatos, por exemplo, como uma modernização. A classe patronal espanhola não a considera assim?

Do meu ponto de vista, o que estão fazendo é sustentar ou manter aqueles aspectos que eles consideravam ser uma modernização, em troca de sacrificar outros, aos quais não dava tanta importância. Por exemplo, a questão da indenização por demissão, que é central na relação empregatícia na Espanha, não foi tocada. Creio que a classe patronal não estava disposta de modo algum a aceitar. São aspectos importantes, mas de menor relevância para ela.

Em todo caso, considero um erro vincular desregulação com a modernidade. Não tem sentido em grande parte. Os países onde há maior qualidade de emprego são os que a presença sindical e convenções muito forte, independentemente das modernizações que há.

Se conseguem elevadas rendas per capita e elevados salários, é graças a esses modelos. Não compartilho essa análise segundo a qual a modernização, a flexibilização, a desregulação é simplesmente modernidade. Não é assim.

De fato, os sistemas com maior fortaleza de relações laborais ocorrem naqueles países que obtêm melhores resultados econômicos.

As previsões atuais são de forte crescimento do emprego, acompanhado desta reforma trabalhista.

DCM: Para uma boa parte da classe patronal brasileira, há uma visão de que os direitos prejudicam a geração de empregos. Essa será a consequência dessa reforma trabalhista na Espanha?

Na verdade, estamos vendo exatamente o contrário. O crescimento do emprego na Espanha nos últimos trimestres está sendo muito grande. O número de empregados já se situa acima do número de empregados antes da pandemia. Portanto, recuperou-se os níveis de emprego prévios à pandemia em pouco tempo.

As perspectivas são de que o emprego siga crescendo num bom ritmo. Tem que se levar em conta que houve um aumento do salário mínimo em diversas momentos e isso não gerou uma redução da criação de empregos.

Além disso, o reforço da negociação coletiva vai permitir que essa criação de empregos seja acompanhada de salários que gerem provavelmente uma maior geração de renda, que estimula o consumo e isso faça com que as empresas invistam mais e a economia cresça.

DCM: Justamente, em relação ao que você dizia, de considerar um erro vincular desregulação a modernização, a classe patronal espanhola comete esse erro ou não?

Sim, é preciso levar em conta que a classe patronal apoiou “por fora” a reforma de 2012, mas não foi dialogada. Então, digamos que ela tem uma incidência indireta. O partido no governo naquele momento tinha maioria absoluta e a introduziu sem ela. Portanto, sem necessidade de recorrer a nenhum agente social.

É verdade que sua postura há muitos anos iam nesse sentido, rumo à desregulação, reduzir as convenções ao âmbito empresarial, tornar mais baratas as demissões e os custos laborais. Mas eu creio que no momento atual, dadas as circunstâncias, tanto em relação aos dois partidos que estão no governo e à situação econômica, tiveram que aceitar essas mudanças com o intercâmbio, com a contrapartida de que outros aspectos que eles consideram centrais não sejam aprovados.

Creio que sim, que tem a mesma mentalidade, mas dadas as circunstâncias e a correlação de forças que há atualmente, tiraram o melhor que podiam, que era evitar os aspectos que consideram centrais.

DCM: Um argumento bastante mobilizado pela classe patronal brasileira é o de que o aumento de direitos implica num aumento dos custos do trabalho. A previsão que você aponta de um aumento de emprego é uma contradição com o aumento dos custos do trabalho?

Há muitos estudos que apontam que o aumento salarial gera um efeito positivo sobre o crescimento econômico. Isso se deve a múltiplas razões. Uma delas é o fato de que quanto maiores os salários, as pessoas trabalhadores têm mais renda para gastar, e quanto mais gastam, mais consomem, quanto mais consomem as empresas vendem mais, seus lucros aumentam, investem mais e a economia cresce. Isso não é um caso isolado.

Isso é o que viveu a economia mundial desde a Segunda Guerra mundial até os anos 1980: um forte aumento dos salários, acompanhado de um forte aumento da produtividade e do crescimento econômico.

Portanto é verdade que tem que ser acompanhada de diferentes políticas, mas é falso que em todo momento e lugar o aumento salarial destrói empregos.

O que vemos é que quando há desemprego, capacidade ociosa da indústria, que não se produz em pleno potencial, incrementar os salários estimula o crescimento econômico e estimula a criação de emprego agregado.

DCM: A Espanha sofreu bastante com políticas de austeridade durante os anos Rajoy (ex-primeiro ministro, de 2011 e 2018). Por que nesse momento a Comissão Europeia felicita a Espanha pela reforma trabalhista?

É verdade que a Comissão Europeia naquele momento tinha uma posição muito favorável à desregulação do mercado de trabalho. Por consequência, a reforma de Rajoy foi nesse sentido, seguindo as recomendações da Comissão Europeia. Isso foi feito nos países do sul. Também se aplicou em Portugal e sobretudo na Grécia.

Na Grécia, todo o sistema de relações trabalhistas foi desregulado e atualmente é o que tem um dos modelos mais próximos ao anglo-saxão.

Atualmente, parece ter havido uma mudança na orientação da Comissão Europeia, que considera que essas políticas de desregulação sem o apoio de agentes sociais não são adequadas. Então praticamente pedem que todas as grandes políticas sejam feitas em acordo entre classes patronais e sindicatos.

Uma mudança na orientação devido ao fracasso, das consequências muito prejudiciais para a própria cidadania nos países onde se aplicaram essas reformas.

DCM: A nova reforma trabalhista não conta com o apoio do Partido Popular, o partido conservador. Por que, se a classe patronal a apoia?

É um paradoxo, no qual a classe patronal está disposta a pactuar sobre a reforma enquanto o principal partido conservador, não.

O argumento que deram é que a sua reforma, de 2012, é a adequada, e que portanto não se deve modificá-la em nenhum sentido. Esse é o argumento que sustentaram para não votar a favor, apesar de que patrões e sindicatos estão de acordo com essa reforma.

DCM: É outro paradoxo que a personalidade política que mais se implicou nessa negociação, Yolanda Diaz, tenha um histórico comunista?

Sim, ela é membro do Partido Comunista e atualmente é vice-presidenta e dirige a coalizão de Unidas Podemos.

É um fato que ela vem de um meio mais próximo dos sindicatos, mas como é, pelo menos por sua tradição, advogada trabalhista, está muito ligada a conduzir diálogos, construir consensos.

Sua estratégia era bastante clara, centralizar todas as grandes reformas do seu ministério que passariam pelo diálogo social e parece que foi assim. Não se deve esquecer que o governo de coalizão é um governo minoritário, portanto esse apoio externo, dos agentes sociais ajuda a construir maiorias parlamentares e levar reformas adiante.

Então penso que, apesar desses elementos de sua tradição histórica, prevaleceu a vontade de recuperar um diálogo social.

DCM: Você teria outras considerações a fazer?

Sim, há mudanças interessantes que não estão no centro do debate. Por exemplo, também se estabelece um estatuto do bolsista, que é um elemento fundamental para os jovens, que vai ser incorporado. Também foram uma fonte de precariedade.

Os jovens, quando entravam no mercado de trabalho, passavam anos em situações de precariedade severa, em que tinham que adiar seus projetos vitais até conseguir renda suficiente para se emancipar. A Espanha é um dos países europeus onde a emancipação, ou seja, quando os jovens abandonam o lar familiar, ocorre mais tarde, praticamente aos 30 anos.

Portanto é importante favorecer um sistema de relações de emprego em que os jovens possam se incorporar ao mercado de trabalho com garantias de que se gerem trajetórias de trabalho estáveis, com as quais possam desenvolver uma vida pessoal e familiar adequada.

DCM: Essa reforma pode servir de modelo para outros países?

Sim, há que se levar em conta que ela muda aspectos que são característicos do marco trabalhista espanhol. Adotou-se parte do modelo francês. Essa reforma se dá nesse conceito. Mas há elementos que são muito interessantes.

Creio que todos os países deveriam estender as convenções inclusive se suas durações caducarem. A ultratividade, primeiro elemento que trouxe essa reforma, é fundamental para garantir que as pessoas trabalhadoras em todo momento estejam cobertas por uma convenção coletiva, independentemente da sua data de validade.

Em segundo lugar, garantir salários de convenção adequados. Portanto, estabelecer referências estatais ou setoriais é também muito relevante, assim como restringir os contratos temporários, são elementos que, independentemente da legislação de cada país, deveriam ser introduzidos em cada um deles.