Novela da Globo é acusada de reforçar ideia da “cura gay”

Atualizado em 26 de agosto de 2018 às 18:19
Maura e Selma (Foto: Reprodução/TV Globo)

Do UOL

Em “Segundo Sol”, Selma era casada, mas traía o marido com Maura, que, por sua vez, foi apresentada desde o início como lésbica. Com a morte do marido, Selma assumiu o romance com Maura. As duas foram viver juntas e resolveram ter um filho por inseminação artificial. O doador do sêmen é Ionan, colega de trabalho de Maura. Ele, por sua vez, tem um casamento atribulado com Doralice, por causa do ciúme dela.

Ionan envolve-se cada vez mais com Maura, criando emoções com o bebê que está por vir. A novela vai, aos poucos, formando um casal bonito para conquistar o público, enquanto Selma passa a ser apresentada como uma cônjuge chata e possessiva, como Doralice já era. Está claro no roteiro um direcionamento para o público torcer por Maura e Ionan. Os atores têm química.

Maura e Ionan acabaram se beijando no capítulo de sábado (25/08). Selma, que traía o marido com uma mulher, agora é traída pela esposa, com um homem.

O autor João Emanuel Carneiro mexe em um campo minado. Não há problema em Maura ser bissexual – não tivesse a personagem desde o início sido apresentada como lésbica. Porém, não há problema em uma lésbica se descobrir atraída (sexualmente ou romanticamente) por um homem – não tivesse a trama de Maura se enveredado por questões delicadas para gays e lésbicas, como se assumir perante a família e enfrentar o preconceito – tendo sido Maura, inclusive, expulsa de casa pelo pai homofóbico com o asqueroso discurso machista do “falta um homem para te mostrar o que é bom“.

Há de se levar em consideração a verossimilhança: toda a trama descrita acima é crível e acontece na vida real. E há de se manter a liberdade criativa: por a novela ser uma obra de ficção e pelo direito do autor de expressar-se como lhe aprouver. Porém, existe a questão da responsabilidade social, que está no DNA de toda telenovela brasileira, pelo seu alcance e poder de influência e, assim, por servir de espelho para a sociedade.

Essa trama ainda está em construção. Contudo, até aqui, com a romantização de Ionan, Maura e um bebê, a novela vem reforçando o ideal de família “homem + mulher” e a ideia de “cura gay”. O pior é dar razão ao pai homofóbico de Maura e endossar seu discurso machista e preconceituoso. Vou repetir minha crítica à cura gay que se desenrolava na novela anterior, “O Outro Lado do Paraíso”: não é mimimi de politicamente correto. Trata-se do reforço de estigmatização e preconceito, um desserviço para o país que mais mata LGBTs no mundo.

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