
Por Moisés Mendes
Os números favorecem Lula, principalmente se não se movimentarem muito. Números quase estáticos asseguram que, sem grandes mexidas, Lula vence no segundo turno.
Mas números se mexem, e a hora é de falar de sentimentos ao lado dos números. Os sentimentos que mobilizaram as esquerdas nos últimos meses terão de ser multiplicados.
Uma pergunta: PT e forças de esquerdas foram capazes de transferir para as ruas, como apelo eleitoral, o que sentiam desde a libertação de Lula do cárcere de Curitiba? Talvez não. Possivelmente não.
A vitalidade de Lula enganou a todos, no sentido de que essa sempre foi superior ao vigor dos que o rodeavam.
Nem Anitta, nem Alckmin, nem Caetano Veloso, nem mesmo Armínio Fraga funcionaram como se esperava que funcionassem.
O PT alargou apoios entre celebridades, da economia ao entretenimento, mas isso já não basta.
As esquerdas entregaram toda a responsabilidade ao povão e ao Nordeste. Não captaram, por desprezo, os sentimentos dos evangélicos, nem da classe média conservadora que Armínio buscava sensibilizar.
Subestimaram a força bolsonarista no Sudeste e no Sul. Não compreenderam que a direita pode ter decidido que Bolsonaro é o que basta, e que a maioria não quer saber da fofura de Simone Tebet, de Rodrigo Garcia ou de Eduardo Leite.
A velha direita ficou viciada em bolsonarismo e quer conhaque forte. A eleição da bancada recorde de 99 deputados do PL é a prova.
Como foram as eleições de Mourão, do astronauta Pontes e de Magno Malta para o Senado.
Se não fosse o Nordeste e sua fidelidade a Lula, o desastre teria sido avassalador. Não é pessimismo, é o que a eleição nos mostra.
E agora, para que os números funcionem a favor de Lula no segundo turno, é a hora do sentimento se expandir em direção a quem decide.
PT e esquerdas e boa parte do centro, como aliados contra o fascismo, com o reforço decisivo de Simone Tebet, terão de dizer que acreditam na vitória de Lula.
O que não foi feito no primeiro turno terá de acontecer no segundo. O PT terá de informar que está cotidianamente nas ruas onde a direita esteve, como aconteceu em Porto Alegre e São Paulo e talvez na maioria das cidades.
Por que, por exemplo, a presença do PT, com os novos banners e bandeiras de canteiros, sumiu das avenidas?
Por que não havia nada com o rosto de Lula? Nem a toalha. Por que a campanha dos candidatos às eleições proporcionais não apareceu como deveria?
Ah, sim, vão dizer que toda a bancada gaúcha na Câmara foi reeleita, e com acréscimos. Vão dizer que Edegar Pretto chegou perto do segundo turno ao Piratini e que o PT aumentou a bancada em Brasília.
Mas faltou PT nas ruas, faltou sentimento. Faltou a transmissão de um otimismo que pode ter sobrado nas redes.
Esse sentimento terá de ser resgatado até 30 de outubro, como presença ostensiva, analógica, à moda antiga, e não só na internet.
A certeza de vitória não poderá ser só digital. O PT terá de ocupar seus espaços nas cidades, para que o sentimento de otimismo se faça presente.
Terá de conversar com os evangélicos, com o centro que torce pela democracia, com a classe média que não pode ser tentada a caminhar ainda mais na direção de Bolsonaro.
É o sentimento que dará verdade aos números, e não o contrário. Os números se afirmarão como expressão da vontade de vencer e de transmitir essa vontade ao eleitor.
Sentimentos não se submetem a ordens e a imposições da racionalidade da política. Mas são acionados por movimentos que possam gerá-los.
O segundo turno é obrigado a ter nas ruas o sentimento que o primeiro não teve.