O amigo de Assange: um perfil de Rafael Correa, presidente do Equador

Atualizado em 20 de agosto de 2012 às 19:29
Correa

 

E eis que o pequeno Equador e seu presidente, Rafael Correa, estão subitamente sob holofotes mundiais. O motivo é a saga de Julian Assange, o combativo e combatido fundador do Wikileaks, o site que revolucionou o jornalismo investigativo com vazamentos de repercussão planetária que deram a jornais tradicionais como o NY Times e o Washington Post ares de obsolescência em estado avançado.

Para quem acompanhava minimamente o esquecido Equador, não foi surpresa o apoio a Assange, expresso numa concessão de asilo que ninguém sabe quando se materializará. Assange, por enquanto, está na embaixada do Equador em Londres. Ele se refugiou lá depois que a justiça inglesa decidiu aceitar o pedido de extradição da Suécia, onde duas mulheres fazem acusações sexuais a Assange que em qualquer outro país do mundo não dariam, rigorosamente, em nada. O receio – fundamentado – de Assange é que, da Suécia, ele acabe nos Estados Unidos. Sua vida se transformaria num inferno em solo americano.

Assange conheceu seu amigo providencial, Correa, ao entrevistá-lo por Skype para um programa que ele tinha numa emissora russa. “Bem-vindo ao clube dos perseguidos”, disse Correa a seu entrevistador.

Correa é um daqueles presidentes de que os Estados Unidos definitivamente não gostam. Aos 49 anos, loquaz e enérgico, é um esquerdista moderado, um socialista cristão para quem os interesses de seu país não coincidem, necessariamente, com os dos Estados Unidos. Há algum tempo, ele recusou renovar um contrato pelo qual os americanos mantinham uma base militar no Equador. “Só aceito renovar se eles toparem que o Equador monte também uma base militar nos Estados Unidos”, disse ele, sorrindo.

O foco de Correa é a diminuição da desigualdade social entre os equatorianos. Nisso, ele não é diferente, por exemplo, da presidenta Dilma, ou de Lula. O que separa Correa de ambos é a forma com que ele coloca suas prioridades: enquanto Dilma parece sussurrar e Lula parecia falar, Correa parece gritar. Suas opiniões são expressas de maneira franca e, com frequência, contundente, a despeito do humor e do sorriso aberto quase sempre presentes.

Seu colega Hugo Chávez, da Venezuela, uma vez comparou o ex-presidente americano George W. Bush ao “Satã”. Correa disse que Chávez fora injusto com Satã.

Casado com uma belga com quem tem três filhos, Correa é oriundo de uma família simples de Guaiaquil, a maior e mais importante cidade do Equador, embora a capital seja Quito. Seu pai se matou aos 50 anos, depois de se meter com o tráfico de drogas. Correa teve uma vida escolar vitoriosa, e acabou se formando em economia na melhor universidade equatoriana. Mais tarde, complementou seus estudos com quatro anos numa faculdade dos Estados Unidos.

Ao voltar ao Equador, retomou a vida acadêmica. Seu ingresso na vida pública se deu como ministro da Economia. Os equatorianos gostaram dele, e em 2006 Correa se elegeu presidente.

Seu índice de popularidade é alto, acima de 70%, graças aos programas sociais, mas a mídia local o detesta, e é correspondida. Não é uma relação tão destrutiva quanto a que existe entre Chávez e a mídia venezuelana, mas é mais complicada do que aquilo que se vê no Brasil ou mesmo na Argentina. De uma maneira geral, as grandes empresas de mídia da América do Sul mantêm um elevado grau de desconfiança de governos de esquerda – provavelmente por imaginar que se esconde neles uma vontade enorme de sovietizar os países em que estão no poder.

É uma coisa típica de sociedades imaturas. Na França, nenhuma família dona de empresas de mídia imagina que o socialista François Hollande vá transformar o país numa república comunista. A agenda socialista, ou social-democrata, está hoje concentrada em reduzir a concentração descomunal de riqueza que se verificou nas últimas três décadas.

O caminho mais eficaz para isso, e é o que Hollande está fazendo, é impedir que as grandes corporações e os muito ricos encontrem tantas facilidades para reduzir ao mínimo os impostos que deveriam pagar. Adicionalmente, no caso da América do Sul, dada a miséria de tantos milhões de pessoas, o esforço fiscal tem sido acompanhado, pelas administrações de esquerda, de programas sociais como o Bolsa Família, no Brasil, e tantos outros.

Correa, o amigo de Assange, se enquadra dentro deste figurino.