Por Jeferson Miola, publicado em seu blog
O domingo 24 de agosto deste ano de 2025 marcou a passagem de 71 anos do suicídio de Getúlio Vargas no Palácio do Catete, a sede da presidência da República na época.
O suicídio de Getúlio ocorreu num contexto semelhante ao atual e como uma resposta do ex-presidente à conspiração civil-militar e à ofensiva de setores empresariais fascistas contra uma democracia acossada e debilitada.
E nesta segunda-feira 25 de agosto se rememoram os 64 anos da épica Campanha da Legalidade conduzida bravamente desde o Palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul, pelo então governador Leonel de Moura Brizola.
Para Amir Labaki –produtor, diretor e roteirista da série documental 1961 [Globoplay/2025]– a Campanha da Legalidade teve sua enorme relevância histórica eclipsada pelo golpe de 1964 e por ter sido protagonizada no estado mais meridional do Brasil, o RS, longe dos centros decisórios e de poder, e ainda por cima liderada por um político odiado pelas oligarquias dominantes e pelos EUA, Leonel Brizola.
Labaki vê elementos da realidade daqueles anos plasmados na realidade contemporânea, com a diferença de que atualmente várias lideranças civis e militares da tentativa frustrada de golpe estão sendo processadas e serão condenadas e presas.
Foram dois acontecimentos políticos principais do século 20 brasileiro, e os dois eventos dentre os mais marcantes de toda a história do Brasil.
Apesar, contudo, da grande relevância desses dois eventos para nossa história, a mídia hegemônica –infelizmente, não só ela– não dedicou sequer notas de rodapé para registrá-los.
Este apagamento da história pelas oligarquias dominantes e sua mídia não deriva de esquecimento involuntário ou de algum processo demencial. É escolha deliberada.
Apagam a história com o objetivo de esconder os movimentos democrático-populares de resistência e luta do povo brasileiro que se insurgem contra essas oligarquias golpistas, antidemocráticas e colonizadas sempre de prontidão para derrubar a mínima tentativa de avançar projetos redistributivos no país.
Os dois episódios legaram dois documentos de valor perene para a luta democrática presente e futura do Brasil: a carta-testamento de Getúlio e o hino da Legalidade, adiante reproduzidos.
Carta-testamento:
“Mais uma vez as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa.
Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes.
Sigo o destino que me é imposto.
Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci.
Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo.
A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios.
Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero.
Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano.
Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder.
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo, que agora se queda desamparado.
Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida.
Escolho este meio de estar sempre convosco.
Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos.
Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a reação.
Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência.
Ao ódio respondo com o perdão.
E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória.
Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna.
Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate.
Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo.
Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História”.
Hino da Legalidade – composição de Lara de Lemos e Paulo César Pereio:
Avante brasileiros de pé
Unidos pela liberdade
Marchemos todos juntos com a bandeira
Que prega a lealdade
Avante brasileiros de pé
Unidos pela liberdade
Marchemos todos juntos com a bandeira
Que prega a lealdade
Protesta contra o tirano
Se recusa a traição
Que um povo só é bem grande
Se for livre sua Nação
Avante brasileiros de pé
Unidos pela liberdade
Marchemos todos juntos com a bandeira
Que prega a lealdade