Publicado originalmente no perfil de Facebook do autor
POR LUIS FELIPE MIGUEL, cientista político
Moro apresentou a necessidade de preservar a autonomia da Polícia Federal como mote para sua demissão.
Vejo muita gente à esquerda indicando os riscos deste discurso. A PF não é um poder de Estado. É um órgão da estrutura do Executivo e, sendo assim, subordinado à Presidência da República. Um projeto político legitimado pelas urnas tem o direito de orientar sua atuação.
O mesmo vale, por exemplo, para a Procuradoria Geral da República.
Os governos do PT cederam ao corporativismo de delegados federais e procuradores por fraqueza política. Mesmo tendo ganhado quatro eleições presidenciais seguidas, não foram capazes de afirmar suas políticas para setores tão importantes do aparelho estatal. Travestiram sua fraqueza num “republicanismo” arrevesado.
Concordo com essa análise. Às vezes, porém, ela me parece ir longe demais. Como se a esquerda, caso um dia chegue ao poder, devesse agir como Bolsonaro – e, antes deles, com só um tiquinho mais de moderação, Temer ou FHC.
O fato de que os governos petistas tentavam fazer da necessidade virtude, vendendo como republicanismo o que era (real) fraqueza política, não quer dizer que o republicanismo – entendido em seu sentido mais básico, como separação entre Estado e governo – seja um valor dispensável.
O aparelhamento da Polícia Federal, como Bolsonaro deseja e do qual Moro foi cúmplice até ontem, é gravíssimo. A nomeação, para dirigir o órgão, do compadre de um potencial criminoso investigado pela própria PF, no caso o filho do presidente da República, é um crime de responsabilidade suficiente (mais um) para um impeachment.
Estabelecer políticas para a PF (ou o MPF) é indicar prioridades, diretrizes, padrões de procedimento, limitar abusos. Não é intervir para blindar a própria quadrilha.
Ressaltar a gravidade da situação não é cair no endeusamento falso de Moro, nem subscrever as demandas corporativas dos delegados.
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