O ator da Globo que chamou um recepcionista de “favelado” e a ética do “cidadão de bem”. Por Sacramento

Atualizado em 12 de julho de 2017 às 6:55
Bruno de Luca

 

Se o “cidadão de bem” tivesse um rosto, seria o de Bruno de Luca. Branco, provavelmente heterossexual, bem empregado e nascido em família de empresários. Dono da fisionomia comum que atormenta caricaturistas iniciantes, o ator e apresentador serviria de modelo para a tal abstração defendida por 10 entre 10 políticos reacionários.

A notícia de que De Luca foi condenado a pagar 15 mil reais ao funcionário de um hotel por chamá-lo de “favelado” e “vagabundo” indica que além do rosto, a alma do ex-fedelho da novela “Malhação” também é do típico “cidadão de bem”. Aquele ser que grita contra a corrupção política mas não hesita em humilhar os mais pobres.

De Luca foi processado devido ao incidente ocorrido em 2009, em um Hotel de Florianópolis. A vítima foi agredida verbalmente depois de pedir ao apresentador que diminuísse o volume do som e parasse com a baderna no apartamento onde estava com amigos.

O comportamento do rapaz foi um típico uso do princípio do “você sabe com quem está falando?”, a clássica “carteirada”, conceito sobre o qual o antropólogo Roberto DaMatta discorreu no livro “Carnaval, malandros e heróis”.

“A expressão é o reflexo ritualizado e quase sempre dramático de uma separação social que nos coloca bem longe da figura do ‘malandro’ e dos seus recursos de sobrevivência social”, escreveu DaMatta.

O que o “cidadão de bem pagador dos impostos” mais quer é se diferenciar das camadas financeiramente menos favorecidas da sociedade, obrigadas a fazer malabarismos para viver com dinheiro escasso, dívidas abundantes e serviços públicos ineficientes.

Malandramente, como canta o MC Dennis, De Luca não esconde sua ligação com a empresa Frescatto, pertencente ao seu pai Antonio e patrocinadora do Fluminense.

Por outro lado, a ligação de Bruno com o empresário Marco Antonio de Luca, preso na operação Lava Jato sob a acusação de pagar R$ 12,5 milhões em propinas ao grupo do ex-governador Sérgio Cabral, praticamente passa batida nos grandes portais de notícia.

Ligado à empresa Masan, Marco Antonio, foi um dos convivas da mítica festa da comitiva de Cabral em Paris, aquela dos marmanjos com guardanapos na cabeça. O parentesco de Bruno com Marco Antonio só aparece no blog de Anthony Garotinho e em outro mais obscuros.

Se o preso da Lava Jato for mesmo seu parente, significa que Bruno de Luca segue à risca a ética do “cidadão de bem”, que se julga superior aos demais mesmo com o armário lotado de ossadas.