O bate boca com o ministro da Saúde na GloboNews e a arte de pedir desculpas massacrando os fatos. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 4 de março de 2016 às 0:36

 

A jornalista Christiane Pelajo protagonizou uma discussão barulhenta, com muito calor pouca luz, em sua estreia num programa da GloboNews chamado Edição da 16h.

Pelajo bateu boca com o ministro da Saúde Marcelo Castro em torno de casos de microcefalia. Em resumo, ela e Cristina Tardáguila, que lhe servia de escada, responsável pelo levantamento de dados, usaram números errados para pressionar Castro.

Christiane e a assistente chegaram às raias de gritar com o ministro, insistindo que as informações que elas tinham eram as corretas e ele estava, basicamente, enganando o cidadão brasileiro.

“Não existe nenhuma fragilidade nos dados do Ministério da Saúde. O que há é uma confusão entre casos confirmados, suspeitos, e casos notificados”, rebateu um acuado Marcelo Castro a certa altura — inutilmente, dado o grau de indignação da dupla.

No dia seguinte, uma nota do ministério desmentiu o show. A Globo teve de dar o braço a torcer: “O programa acolhe as explicações do ministério, mas entende que ontem ofereceu excelente oportunidade para o público entender melhor de que forma são contabilizados os dados pelo Ministério da Saúde”.

Não houve, na verdade, oportunidade das pessoas entenderem nada, mas um quiproquó em que ninguém chegou a lugar nenhum porque o interesse era o ruído e a confusão.

Christiane saiu do Jornal da Globo, supostamente, por se desentender com o âncora William Waack. Ela era um contraponto semi simpático à tempestade de baixo astral wagneriana de Waack, de quem tomou algumas patadas na bancada.

Aparentemente, ela entendeu que o certo é partir para a porrada em cima dos adversários conhecidos, muito mais do que ajudar o pobre telespectador a compreender e aprender a lidar com um assunto delicado.

O pedido de desculpas envergonhado revela uma arrogância nefasta. Não houve “debate de ideias”, como se quer fazer parecer, mas duas senhoras equivocadas e exaltadas tentando ganhar no grito.

Doi tanto um mea culpa? Sim, é atávico, jornalistas têm úlcera por isso — mas em determinados casos a situação é um pouco mais patológica e cafajeste que em outros. Veja a recente diatribe de Mônica Waldvogel num artigo na Folha.

Mônica não gostou de um pedido de perdão de Fernanda Torres às feministas e saiu em defesa da atriz — sem que esta jamais tenha requisitado qualquer gesto do tipo.

Num tom coitadista passivo agressivo, Mônica se queixa dos “linchamentos ferozes da internet em razão de um comentário improvisado durante programa da TV paga”.

“Manifestei na ocasião minha dúvida a respeito de bicicletas serem alternativa viável de transporte em São Paulo. Ponderei as ladeiras, a insegurança e o clima”, escreveu, denunciando a intolerância das “militâncias”.

Bem, a história aconteceu em 2011 e as tais “ponderações” da apresentadora foram uma sessão de escárnio e desinformação que durou 3 ou 4 minutos. Seus convidados de Saia Justa assistiam entre pasmos e constrangidos ela contar piadas de salão num solo de desinformação inacreditável.

Numa festa, “um amigo meu, um amigo querido, se esforçava desesperadamente para convencer 15 pessoas de que bicicleta é um meio de transporte. Foi massacrado das mais diversas maneiras. O que seria aquele bando de paulistano de bicicleta?”

Um riso insano acompanhava a digressão. “Talvez porque a bicicleta não seja uma ideia nova, de fato. Parece que é uma ideia nova, mas não é, o carro é mais novo do que a bicicleta [?!?]. Não adianta vir com a bicicleta. Seja pelo aquecimento global, o buraco de ozônio, o não sei o quê, o congestionamento… É melhor o congestionamento dentro do meu carro, do que numa bicicleta, chovendo em cima. O ladrão passando, levando meu Ipod.”

Essa montanha de estultices foi colocada publicamente e causou, obviamente, uma reação pública. Qual a surpresa? Nenhuma. No universo de Waldvogel e seus amigos, no entanto, a discussão deve ser mantida sob controle e só começa e termina quando uma força superior decide que chegou a hora.

Mônica levou cinco anos para deixar claro que nunca perdoará aquela gentalha que, basicamente, lembrou-lhe a importância de se educar sobre um assunto antes de falar sobre ele.

Ela e Christiane Pelajo podem ensinar uma à outra como lidar com fatos e divergências — na base da pancada, do desprezo e do sarcasmo.