O bolsonarismo avança sobre o sistema de Justiça. Por Moisés Mendes

Atualizado em 14 de julho de 2022 às 21:18
O blogueiro bolsonarista Allan dos Santos. Foto: Reprodução
O blogueiro bolsonarista Allan dos Santos. Foto: Reprodução

Por Moisés Mendes

É simples, banal e funcional como uma pescaria a tática dos advogados do site bolsonarista Terça Livre, do foragido Allan dos Santos, para tentar obter, pela insistência, decisões favoráveis do Supremo.

O esquema é antigo, mas foi mostrado agora pela Folha no caso específico do blogueiro. Consiste em apresentar recursos que vão caindo em diferentes ministros, até que finalmente caia naquele que interessa.

É o esforço para que sejam liberadas as contas bancárias e as redes sociais do sujeito, bloqueadas pelo ministro Alexandre de Moraes por causa de ataques ao Supremo, dentro da fábrica imunda das milícias digitais que produz todo tipo de embutido de difamações e fake news.

Allan dos Santos é um inimigo da democracia que desfruta da democracia para tentar destruí-la, como amigo da família e integrante do gabinete do ódio. O blogueiro abusado está escondido e protegido nos Estados Unidos.

Enquanto continua foragido, os recursos dos advogados para a liberação das contas vão entrando e caindo aleatoriamente com algum ministro do STF.

Já analisaram e rejeitaram recursos da defesa do blogueiro, desde outubro do ano passado, os ministros Edson Fachin (duas vezes), Cármen Lúcia e Rosa Weber.

E agora, com mais um recurso apresentado no dia 7, a defesa de Allan dos Santos parece ter conseguido o que buscava: o pedido caiu com o ministro Kassio Nunes Marques, que deve anunciar sua decisão na volta do recesso.

Nunes Marques é a esperança do protegido do pai, dos filhos e dos milicianos. Mas o caso é também mais um abacaxi com mil espinhos no colo do ministro.

Bolsonaro constrange Nunes Marques ao dizer, como fez na quarta-feira, que nem precisa falar com ele porque “tem nos ajudado muito e sabe o que fazer”.

Bater nas portas da Justiça, até que um imbróglio caia na mão de um juiz que saiba o que deve ser feito, não é novidade como tática junto à primeira instância no Brasil.

Funciona principalmente em ações de poderosos destinadas a amordaçar inimigos, e o alvo preferencial são os jornalistas.

Mas só podem se beneficiar da estratégia no Judiciário, aqui como pesca não de anzol, mas de arrasto, quem tem dinheiro e imposição política e distribui ações por toda parte.

Com tentativas de processos espalhadas, o usuário da tática lança a rede e espera que um número razoável de juízes acolha o que outros vão rejeitar.

É uma aposta que se beneficia do funcionamento do próprio sistema de Justiça em favor de quem tem mais.

Pobres, negros e todos os que não dispõem de bons e caros advogados sabem como isso funciona contra eles. Os ricos sabem muito bem como se beneficiar desse sistema.

O poderoso da rede de arrasto pode ser desde um político incomodado com a revelação de suas bandidagens, um grileiro, um contrabandista, um lavador de dinheiro ou um sonegador perseguidor de jornalistas que destampam os bueiros do seu passado.

A mesma acusação contra um jornalista pode ser enviada a diferentes comarcas, uma como ação civil, outra como queixa-crime, e assim o abusador toma conta da Justiça, porque pode gastar dinheiro à vontade. Só para tentar calar a boca de quem o incomoda.

É uma imposição de vontades que mistura poder econômico, político e muitas vezes religioso, além da pistolagem, na ambição de ter o sistema de Justiça sob controle. O assédio judicial sempre dará certo.

Por isso, chega em boa hora o documentário República dos Juízes, em formato de série, do cineasta Eugenio Puppo, que aborda as brechas e a engrenagem usada pelos que tentam se apropriar do Judiciário.

São cinco episódios que tratarão, claro, do lavajatismo e de outros exemplos de como o poder e a política interferem em decisões da Justiça.

Estreia dia 24 de agosto. Uma pena que, por enquanto, só vá passar no canal Cinebrasil TV e no streaming Claro +TV.

É preciso que tenha maior exposição e alcance, para que se compreenda como a extrema direita avança com seus tentáculos sobre o Judiciário, incluindo nos últimos movimentos a justiça eleitoral.

Não são mais apenas os controles históricos exercidos pela velha direita e muito menos pelo coronelismo.

São as garras da nova extrema direita, do fascismo bandido e/ou endinheirado, com suas vozes e suas forças alinhadas ao bolsonarismo.

(Texto originalmente publicado no Blog do Moisés Mendes)

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