Publicado originalmente no Justificando
Por Simony dos Anjos
Temos vivido tempos terrivelmente fundamentalistas, nos últimos meses são incontáveis as interferências de lideranças religiosas no cenário político brasileiro. A última ocasião na qual evidenciou-se o uso político dos fiéis realizado por muitas igrejas, aconteceu no processo de eleição dos conselhos tutelares, haja vista o frete de ônibus para levar os fiéis para os colégios eleitorais, a propaganda e apoio das igrejas a conselheiros que representariam “a vontade de Deus” nos Conselhos Tutelares.
Essas igrejas estão disputando as mentes e corações das pessoas mais pobres, marginalizadas na sociedade e sem acesso aos direitos. Ao se colocarem como as salvadoras dos males da sociedade e em defesa da família, apelando diretamente para o senso de autoproteção das pessoas, essas igrejas conquistam apoio político de uma massa que se vê acolhida pelas religiões populares, como o catolicismo e o neopentecostalismo.
E essa não é uma realidade brasileira, apenas. Esse é um cenário da América Latina, de modo geral. E temos que entender que essa entrada das religiões cristãs no poder e na formação do imaginário social latino-americano, se deve ao fato de o Catolicismo ter sido esteio do processo de colonização de todos esses países. O Imaginário cristão que dá sustentação para os evangélicos fundamentalistas, hoje, vem sendo forjado há 500 anos em nossas terras, e isso se reflete no alto número de políticos que ostentam a bandeira da religião. A Guatemala, por exemplo, é governada por um pastor evangélico, o Jimmy Morales. A Costa rica é governada por um cantor e pastor evangélico chamado Fabrício Alvarado. Na Colômbia, até 2017, haviam 750 colégios públicos e 3500 igrejas neopentecostais.
E esse avanço dos políticos religiosos, é potencializado pelo poder dos inúmeros meios de comunicação religiosos que constroem heróis baseados na fé e moralidade cristãos. Há de se convir, que se tratam de países com pessoas extremamente empobrecidas que têm uma dependência social da igreja e do seu assistencialismo. Uma prática que se converte em um dos maiores trunfos do capitalismo exploratório que acomete a América Latina, ensinar as pessoas a dependerem da caridade. Postura que forma cidadãos que não exigem seus direitos do Estado, dando todo poder para que as religiões mais populares mantenham a estabilidade social de uma sociedade extremamente desigual. Nesse contexto, o colapso que a Bolívia enfrenta está diretamente ligado a alguns grupos fundamentalistas católicos e evangélicos, que mobilizaram as pessoas com a disseminação de pânico entre os fiéis.
Dentre as notícias e imagens que têm circulado na mídia, eu gostaria de evidenciar duas imagens que são muito efetivas para conquistar corações e mentes de um povo extremamente cristianizado: Luis Fernando Camacho ajoelhado em frente a uma bíblia e a presidente interina Jeanine Añez com a faixa presidencial e uma pequena bíblia na mão. Antes disso, se faz necessário pontuar que esse golpe vem sendo preparado desde a forte resistência de alguns grupos católicos e evangélicos ao novo Código Penal Boliviano sob a pecha de que o Código Penal criminalizaria a evangelização no país, quando na verdade a lei estabelecia que “a condenação de 7 a 12 anos aconteceria no caso de tráfico de pessoas realizado dentro do contexto de grupos religiosos”.