O desserviço que ateus prestam ao ateísmo

Atualizado em 29 de julho de 2013 às 14:50

Apoiar a quebra de imagens sacras e promover o “desbatismo” não ajudam a causa dos descrentes.

"Desbatismo" na Praça da Sé, em São Paulo
“Desbatismo” na Praça da Sé, em São Paulo

Uma das manifestações que aconteceram durante a visita de Francisco foi organizada pela ATEA, Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos. Membros da entidade foram para a frente de algumas igrejas e usaram um secador de cabelos para os voluntários se “desbatizarem”. No final, a pessoa ganhava um certificado de “desbatismo”.

O protesto teve adesão baixa. Não emplacou. Daniel Sottomaior, presidente da ATEA, perdeu uma oportunidade de elevar o nível do debate. Sua bandeira principal era o volume de gastos públicos com a visita de Francisco. Mas, no meio disso, embutiu-se um discurso agressivo e fanático. Ateus não podem gozar de sua descrença de outra maneira? Têm de partir para o enfrentamento? É obrigatório apoiar gente que quebra imagens?

A ATEA chegou a propor um salvo conduto para seus simpatizantes durante a Jornada Mundial da Juventude. O que queriam com isso, não se sabe. Mas ficou a impressão de molecagem. “Respeito os ateus porque vivemos num estado laico e pluralista. Mas fazer o ‘desbatismo’ com secador de cabelo é infantilismo e ridículo”, disse Leonardo Boff.

Sottomaior já se manifestou de maneira estranha em outras ocasiões: “Verdade seja dita: a crucificação de Feliciano (ops…) foi uma enorme injustiça. É verdade, ele é homofóbico de carteirinha, camiseta e diploma, tem posições claramente contrárias aos direitos humanos, deseja interferir nas políticas de saúde pública e quer fazer todos os brasileiros rezarem por sua cartilha religiosa. Quer dizer: é igualzinho ao papa. Feliciano é até mais liberal: apoia o ordenamento de mulheres e o casamento de sacerdotes. A diferença é que ele não torrou centenas de milhões de reais de dinheiro dos contribuintes, nem usa vestido em público.”

Defender Feliciano para atacar a Igreja não ajuda a causa. O papa disse que não cabe a ele julgar os gays (também falou a favor de ateus que fazem o bem). Há uma discussão aí. Quanto ao dinheiro do contribuinte, o pastor deputado sofreu denúncias do uso da máquina pública em seu cargo.

Ninguém é forçado a crer em Jesus, na Virgem Maria ou em milhares de santos. Quem foi ver o papa em Copacabana estava lá de livre e espontânea vontade e, eventualmente, não é um estúpido e nem está queimando bruxas em fogueiras.

Se ateus querem convencer alguém de alguma coisa, um bom começo, talvez, seja descartar o Pensamento Único e estimular a crítica. O grande filósofo Bertrand Russell, ateu, afirmava que quem tinha de provar a existência de Deus eram os crentes, e não os descrentes do contrário. Russell também é autor da máxima: “O grande problema do mundo é que os tolos e fanáticos são cheios de certezas, enquanto os sábios são cheios de dúvidas”.

Que tal propor o diálogo e a dúvida? É irônico que quem esteja fazendo isso, agora, seja um papa.