O dia D e a hora H dos três Poderes. Por Carol Proner

Atualizado em 12 de janeiro de 2021 às 21:01

Publicado originalmente no perfil da autora 

Por Carol Proner

Quando se trata de salvar vidas no Brasil, o deboche vem do Poder Executivo: “Todos os estados receberão simultaneamente as vacinas, no mesmo dia. A vacina vai começar no dia D, na hora H, no Brasil”, despistou o Ministro da Saúde Eduardo Pazuello ao responder vagamente às cobranças de prefeitos e governadores quanto à definição do calendário de imunização contra a Covid no país.

Quando se trata de salvar a democracia no Brasil, o deboche vem do Poder Legislativo:“A demora da vacina pode gerar abertura de impeachment contra Bolsonaro”, ameaçou o Presidente da Câmara Rodrigo Maia, utilizando as redes sociais para mandar o frouxo recado ao tempo em que faz hibernar os mais de 50 pedidos de impeachment provenientes dos setores mais organizados e representativos da sociedade civil.

Quando se trata de salvar a justiça no Brasil, o deboche vem do Poder Judiciário:”É possível que no primeiro semestre a gente já julgue este caso, que é extremamente importante e relevante”, avaliou Gilmar Mendes desvencilhando-se da anterior previsão de fevereiro para o julgamento do habeas corpus que julgará a suspeição do ex-juiz Sergio Moro e a possível anulação dos infames processos contra o ex-Presidente Lula.

O Ministro acrescentou, sem fixar o dia D e a hora H, que “é importante que nós (referindo-se aos Ministros do Supremo Tribunal Federal) possamos propiciar ao ex-presidente Lula um julgamento digno do nome, que possamos avaliar os argumentos que ele suscita de eventual parcialidade ou imparcialidade da força tarefa de Curitiba”.

Com tanto zelo, inevitável não recordar outros tempos, a pressa do judiciário quando o que estava em jogo era a eliminação do candidato Lula das eleições de 2018. Assim como andaram acelerados os trâmites na Câmara quando se tratava de aprovar reformas lesivas aos interesses sociais. E o que dizer do Executivo e da prioridade em celebrar junto a outras nações acordos lesivos aos interesses nacionais.

Eis que cada Poder tem contribuído para prolongar a agonia de uma sociedade que sucumbe em todas as frentes, da justiça à democracia, passando pelo descarte de vidas aos milhares, sem planejamento, sem projeto de futuro. Quem arriscaria dizer qual das agendas é a mais urgente? Oh, a vida, certamente diriam. Mas isso responde à pergunta? Por ora, um mísero consenso se forma em torno da vacina. Por ora, o dia D é o do despiste, do deboche e do desprezo pelas vidas humanas. Passa da hora de ser o dia do despertar das consciências.

Carol Proner – Advogada, professora da UFRJ, integrante da ABJD