O discurso feminista de Dilma Rousseff em Salvador. Por Nathali Macedo

Atualizado em 19 de junho de 2016 às 21:10
Dilma mostrando a camisa da Marcha Mundial das Mulheres, que ganhou de presente das feministas baianas
Dilma mostrando a camisa da Marcha Mundial das Mulheres, que ganhou de presente das feministas baianas

A Presidenta Eleita Dilma Rousseff veio a Salvador na última quinta-feira para receber a justa homenagem que lhe prestaram os Deputados Estaduais da Bahia, entregando-lhe o título de cidadã baiana.

Quando cheguei à Assembleia Legislativa, onde ela discursaria para o povo que a aguardava, fui recebida por sua assessoria e encaminhada a uma ala reservada às mulheres da frente de esquerda, em frente a um pequeno palco.

Indaguei-me, silenciosamente: Será que em algum outro governo houve um espaço reservado para as mulheres? Receio que não, e isso é simbólico demais para que não pensemos a respeito.

O discurso da Presidenta – notem: continuo chamando-a de presidenta, porque ela foi eleita democraticamente e é portanto digna deste título – foi, talvez pela primeira vez, verdadeiramente feminista.

Ela começou pontuando as diferenças entre o golpe de 64 e o golpe de 2016.

Captura de Tela 2016-06-18 às 14.31.01

Fazendo uso de uma metáfora providencial, ela comparou a democracia a uma árvore: Os golpistas de 64 eram o machado que feriam-na impiedosamente, e estes novos golpistas de 2016, talvez muito mais ardilosos pois não sujam as mãos de sangue, são parasitas que procuram tirar, pouco a pouco, a vida desta árvore.

Não vivemos, agora, um golpe militar. Vivemos um golpe cínico, envolto pelo mau-caratismo que tenta travestí-lo de legimitade, mas tão nocivo quanto aquele de 1964, porque objetiva, como outrora, a vitória da plutocracia sobre a democracia.

Ela falou, ainda, sobre o machismo embutido no golpe:

“Para eles, a mulher é sempre louca ou dura demais. Mas eles se enganam, pois nós não somos uma coisa só. Nós somos diversas, podemos ser o que quisermos”.

Essa frase, dentre tantas outras que me encheram o coração de esperança, me fez pensar na imagem endurecida que Dilma sempre transmitiu. A imagem de quem não tem tempo para ser carismática porque está ocupada demais fazendo o que tem que ser feito. E lembrei-me, por acaso, das tantas mulheres que fazem o que tem que ser feito e, muitas vezes, dispensam a doçura e a simpatia. E que mal há nisso? Nós não precisamos ser doces. Esta não é a nossa função.

Captura de Tela 2016-06-18 às 14.30.47

O que esperavam de uma Presidenta, afinal? O que sempre esperaram de todas nós: sorrisos, recato, doçura e beleza. Dilma nos deu muito mais do que isto, nos deu o que realmente importa, representou e representa a mulher da nova geração, que não precisa e não quer ser apenas uma figura amável.

O fato é que a direita – e para o seu próprio desgosto, suponho – deu à presidenta eleita algo que ela jamais teve, ao menos não para quem enxerga figuras políticas de uma maneira lamentavelmente superficial: carisma.

Agora, Dilma não tem apenas a admiração de seus eleitores: ela conquistou um sentimento de ternura que poucas vezes antes se viu um povo nutrir por uma figura política. Agora, ela é chamada de Dilmãe – aqui, especialmente, Dilmainha – e de guerreira da pátria brasileira.

O povo gritava em coro, quase indelicadamente, palavras de conforto e apoio a cada frase que ela proferia. Centenas de cartazes com os dizeres “Volta, querida” a recebiam, músicas compostas em sua homenagem eram entoadas por uma banda, crianças amontoavam-se nos ombros de seus pais para vê-la.

Em outros tempos, tamanha adoração me preocuparia – demasiada adoração a uma figura política é quase sempre perigosa – mas hoje, cada palavra de apoio que proferi junto com as centenas de pessoas na Assembleia Legislativa só puderam me deixar feliz.

O sentimento não é de um apoio ignorante e incondicional. Apoiando Dilma, sabemos, nós estamos apoiando a democracia, os direitos sociais, e, em última análise, estamos apoiando os nossos próprios interesses enquanto povo brasileiro.

A injustiça desperta nos maus satisfação e nos justos uma necessidade incontrolável de proteger a quem tenha sido injustiçado – neste caso, um país inteiro, especialmente as mulheres, representados pela figura imbatível de Dilma Rousseff.

Tive hoje uma certeza reconfortante: o legado do golpe, quer queiram os conspiradores, quer não, é o amor do povo brasileiro pela Presidenta Eleita. É como flores que nascem nas rochas, e isto nenhum golpista poderá mudar.