O exército quer saber o que seus coronéis faziam no Ministério da Saúde? Por Moisés Mendes

Atualizado em 6 de julho de 2021 às 23:13
Comandante do Exército é condecorado por Bolsonaro.Crédito: Marcos Correa/PR

Publicado originalmente no blog do autor

Por Moisés Mendes

O Exército continua em silêncio porque ainda deve estar tentando entender a aparição de nomes de oficiais em notícias e delações com suspeitas e indícios de participação de militares nos rolos do governo Bolsonaro, quase sempre associados à corrupção na compra das vacinas.

Mas talvez os altos comandos devessem prestar atenção também nos oficiais que, compartilhando os mesmos espaços de poder, com cargos de chefia e sob o assédio do Centrão, não aparecem em lista nenhuma.

A relação de nomes citados em situações constrangedoras não é pequena. Começa pelo nome óbvio de Eduardo Pazuello, acusado de participar da rede de proliferação da cloroquina, que não envolveria apenas “questões ideológicas”, mas delitos com negócios bilionários em várias pontas.

Bolsonaro era o chefe de Pazuello, e Pazuello era o chefe de todos os militares citados até agora por ligações, dentro do Ministério da Saúde, com pilantras avulsos e do Centrão, que tentaram enriquecer vendendo vacinas.

Depois de Pazuello, vem o coronel Antonio Elcio Franco (foto), ex-secretário executivo do Ministério, o segundo logo abaixo do general. Era o homem que centralizava todas as decisões sobre compras de vacinas.

Franco saiu da Saúde com Pazuello, em março, mas ganhou outro bom cargo. É assessor especial do general Braga Netto na Casa civil.

O coronel comandava a turma acusada de pressionar para que fosse fechada a compra da Covaxin e da Astrazeneca, em tempo recorde e/ou com preço superfaturado. O oficial interagiu, em nome do governo, com vendedores sob suspeita.

Abaixo de Franco, já foram citados nos rolos das vacinas, em circunstâncias variadas, os coronéis Marcelo Blanco da Costa, Alexandre Martinelli Cerqueira, Marcelo Pires e Alex Lial Marinho. Todos eles, em algum momento, ocuparam cargos no Ministério da Saúde.

Surgiu no domingo, em reportagem do Fantástico, o nome de mais um coronel, identificado pela Globo apenas como Guerra, que também teria deixado rastros por interesses comerciais na intermediação das vacinas.

No Rio, há o caso do coronel George Divério, acusado, quando era superintendente da Saúde no Estado, da contratação de serviços superfaturados e sem licitação. As empresas contratadas eram de amigos dele.

E ressurgiu agora, em outra frente, mais de atuação familiar, a figura do coronel Guilherme dos Santos Hudson. É amigo de Bolsonaro e acusado de ser um dos arrecadadores das rachadinhas de Flavio Bolsonaro.

Só este último, com atividades mais antigas, não tem ligação com os casos da área da Saúde. Todos os outros aparecem com frequência em notícias sobre pressões e suspeitas de corrupção e propinas na compra de vacinas.

Os cinco citados acima têm ou tiveram cargos no Ministério. Todos foram levados por Pazuello para a Saúde, desde maio do ano passado, quando o general assumiu, inicialmente como interino, a chefia da pasta.

Pazuello militarizou a Saúde levando 11 oficiais de alta patente para postos de comando. Isso quer dizer que, além desses cinco que aparecem sempre em confusões, há outros seis, da mesma turma, que não foram expostos até agora ou talvez nem apareçam.

O personagem mais intrigante de todos é o coronel Elcio Franco, que talvez seja também o mais poderoso. Repetem que ele era quem de fato mandava na Saúde, e não Pazuello.

O coronel já passou pela CPI, mas os senadores ainda não sabiam, entre outras coisas, do rolo com a vacina indiana Covaxin e do caso da negociação da Astrazeneca intermediada por um cabo da Polícia Militar de Minas.

O oficial deveria ser chamado de novo, porque em poucos dias ampliou-se a percepção do que ele representava como chefe absoluto da área de compras de vacinas.

Será que os seis oficiais com postos de chefia na Saúde, e que não aparecem nas denúncias, não estariam dispostos a falar, não necessariamente para a CPI, mas para alguém que se dispusesse a ouvi-los?

Não vale, em momentos ruins, agarrar-se à desculpa de que todos os homens de Pazuello (general da ativa) são oficiais da reserva, porque nas horas boas o que se ouve é que um oficial será sempre um oficial.

Esses seis oficiais podem ter informações relevantes que ajudem o Exército a entender o que seus homens faziam como subalternos de Pazuello, se é que o Exército deseja entender.