A notícia de que a Fundação Bill & Melinda Gates estaria processando a Petrobras por perdas com ações em decorrência da operação Lava Jato partiu da agência Reuters no dia 25 de setembro e estava nas publicações americanas, como o Wall Street Journal. A imprensa brasileira, como era de se esperar, logo deu destaque para uma tradução do texto sem apurar nada.
O desmentido só apareceu três dias depois, partindo da sucursal da Folha em Nova York. O próprio Bill Gates, dono da Fundação e fundador da Microsoft, marcou um encontro no domingo com a presidente Dilma Rousseff no hotel em que ela estava hospedada para as conferências da ONU em Nova York.
O empresário disse que estava “constrangido” pelas notícias e que ocorreu um “mal-entendido”.
No processo, que está disponível na internet, consta que a WGI Emerging Markets Fund, LLC e a Bill & Melinda Gates Foundation Trust seriam os responsáveis. O documento foi protocolado no dia 24 de setembro. Um dia depois, a própria fundação de Gates emitiu uma nota explicando do que se tratava.
É um investidor externo da empresa, envolvido com a WGI e a LLC, que alega ter perdido investimentos em commodities com a Petrobras. O nome do advogado representante do processo é Kenneth E. Warner, que também critica a auditoria da PriceWaterCoopers, responsável pela fiscalização da Petrobras durante a operação Lava Jato.
O nome de Warner aparece no noticiário brasileiro? E a menção ao investidor? Claro que não. Consta no processo que ele é vinculado à Fundação Bill & Melinda Gates. Mas o próprio empresário explicou à presidente que se trata de um advogado de um investidor externo da entidade, e não o próprio Bill Gates.
É bem diferente de “Bill Gates processa a Petrobras”, como a mídia brasileira estava estampando em suas principais manchetes.
A própria Folha, Estadão, Veja e outros veículos deram destaque ao factoide sem fazer a correção apropriada depois do desmentido.
Mas os equívocos que envolvem a Petrobras não começaram ontem.
Em 16 de janeiro deste ano, a petroleira emitiu um comunicado à imprensa esclarecendo que Paulo Roberto Costa e Nestor Cerveró deixaram os cargos de diretoria, respectivamente, em 2012 e 2014. Portanto, para a Petrobras, os ex-diretores não têm ligação com os atuais gestores. No mesmo release, a empresa reclamava de textos que os descreviam como “diretores”.
No dia 20 de maio, a petroleira anunciou que assinou um contrato de financiamento de US$ 1,5 bilhão com o Banco de Desenvolvimento da China. Esta manchete passou batido na imprensa brasileira.
Já a produção de petróleo atingiu a marca de 2,88 milhões de barris de óleo equivalente por dia (boed), um recorde histórico, de acordo com a Petrobras, no mês de agosto. A empresa também perfurou o terceiro poço na área de Carcará (Bloco BM-S-8), localizado em águas ultraprofundas da Bacia de Santos, e confirmou a descoberta de petróleo leve e de boa qualidade nos reservatórios do pré-sal. Essa última informação apareceu no dia 28 de setembro.
Nenhum destes dados foi destaque na mídia nacional. Porque o que importa, enquanto a Lava Jato for destaque e o antipetismo for a moda da vez, é se Bill Gates está processando a Petrobras.