“O governo está prestes a acabar”, diz ao DCM deputado que está exigindo que Bolsonaro mostre seu exame

Atualizado em 16 de abril de 2020 às 21:25
Rogério Correia

O deputado federal Rogério Correia, do PT de Minas Gerais, virou notícia esta semana depois que a Câmara autorizou o envio à Presidência da República de um pedido de informações sobre os resultados dos exames de Covid-19 realizados por Bolsonaro.

Como se sabe, o presidente está escamoteando esse resultado desde que voltou da fatídica visita a Trump na Flórida.

Autor do pedido, Correia baseou-se no parágrafo 2º do artigo 50 da Constituição Federal, o qual determina que no caso de “recusa, ou não atendimento” à solicitação em 30 dias, pode ocorrer crime de responsabilidade.

O parlamentar falou ao DCM sobre este e outros assuntos. Confira:

DCM: Com o pedido da Câmara, Bolsonaro, finalmente, vai mostrar o exame? O que pode acontecer se ele negar? 

Rogério Correia: Agora ele é obrigado a mostrar. Se não mostrar, estará omitindo dados relevantes e, portanto, como diz o artigo 50 da Constituição, cometendo crime de responsabilidade, que pode levar ao impeachment. Ou seja, se ele não apresentar em 30 dias o exame, a Câmara dos Deputados tem que abrir o processo de impedimento. Eu acho difícil o presidente Rodrigo Maia negar, porque a Constituição é explícita sobre o assunto. O presidente da República estaria negando uma informação ao poder Legislativo. Se a Câmara não agir nesse caso, perde o seu poder completamente.

O fato de o Hospital das Forças Armadas (HFA) enviar os testes, todos dando positivo, e não mostrar dois, provavelmente o do Bolsonaro e o da esposa, coloca em xeque a declaração do presidente. 23 pessoas ligadas a ele testaram positivo, todos os líderes estão mostrando seus testes. O Trump, por exemplo, deu negativo e mostrou. O Boris Johnson testou positivo, e mostrou. A mesma coisa o Wilson Witzel (governador do RJ) e o Helder barbalho (governador do Pará). Só o Bolsonaro que não mostra. Por quê?

Então, um presidente que aposta no obscurantismo, incentivando a população a ir para as ruas nesse momento, incentivando o uso de remédios que ainda não têm a eficácia comprovada cientificamente, um presidente que faz isso, tem de prestar contas do que ele andava fazendo, espalhando o vírus.

Até porque a tese dele é “quanto mais rápido espalhar, melhor”. Mesmo que morra mais gente, acaba mais rápido e retoma a economia, não importando a vida dos cidadãos vitimados. Olha a loucura da tese. É uma medida higienista. Lembra Hitler, que queria fazer uma “limpeza” com a raça ariana, perseguir socialistas e judeus. Como se só alguns escolhidos tivessem o direito de viver. Isso é humilhar os mais pobres.

O que você acha da declaração do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, dando a entender que a redução de mortes por coronavírus é pior para a economia?

Nossa senhora! Exatamente como eu falei. É uma política de higienização, fascista. O capitalismo, antigamente, quando se via em crise profunda, “resolvia” a situação com guerra. Foi assim na Primeira Guerra e Segunda Guerra. O Exército de reserva do proletariado foi levado à morte, e com o que “sobrou” capitalismo foi reconstruído.

A ideia do governo federal é um pouco essa, apoiada no discurso que privilegia a economia em detrimento da vida. “Ah, já que tem esse vírus, vamos infectar o máximo de pessoas possível”. Muitos vão morrer e só os mais fortes, segundo essa tese fascista, vão sobreviver. É uma higienização, como a política de perseguição a judeus de Hitler e como o capitalismo pós-Primeira Guerra Mundial. Política para dizimar pessoas.

Como combater essa rede de fake news que, seguindo o discurso contra o isolamento social, está infectando a mente de muitos brasileiros, apoiadores do presidente?

Primeiro, as nossas propostas têm de ser disseminadas o máximo possível, seja nas redes sociais ou nas ruas; segundo, acho que a própria realidade, infelizmente, vai se impondo, como se impôs com o Trump, nos Estados Unidos. Nova Iorque, ontem (15), registrou mais de dois mil mortos. Lamentavelmente, essa realidade vai chegar aqui, e por culpa da posição do Bolsonaro. Além disso, ontem saiu um levantamento, da consultoria Atlas Político, que mostra 58% de rejeição ao Bolsonaro. Então, essas ideias neofascistas, bolsonaristas, já começam a apresentar desgaste.

Na Câmara e no Senado ele também já está enfraquecendo. Então, é um governo que vai perdendo a capacidade de governar, se isolando.

O governo Bolsonaro está prestes a acabar. É necessário, agora, que a esquerda entre na jogada de organizar o “fora, Bolsonaro”. O PT não aderiu a isso ainda, homogeneamente. Precisamos organizar esse movimento, senão a retirada virá por meio do “Centrão”, numa suposta conciliação que vai garantir a continuidade dessa política de exploração. Ou seja, a esquerda precisa criar um movimento concreto de “fora, Bolsonaro”. Um movimento que organize o povo para substituir o governo atual por algo democrático, numa reconstrução popular do País, fora das mãos do centrão e da direita. A maioria do PT, infelizmente, ainda não compreendeu isso. Precisamos avançar nesse sentido.

O que falta para o PT entrar de vez no “fora, Bolsonaro”? 

Alguns companheiros de partido imaginam que deixar o Bolsonaro desgastar até 2022 seja uma alternativa. Eu acho um equívoco, porque o país não aguenta o Bolsonaro até lá. Não se pode deixar o País ser destruído dessa forma. Além disso, as elites podem tirá-lo num movimento transicional próprio, o que seria ruim. Então, é o momento de a esquerda forçar que essa transição não seja conservadora, e sim pela via de novas eleições. É preciso entrar nesse debate político. Infelizmente, a maioria do PT ainda não quer. Mas estamos organizando um movimento interno para rever essa posição e também convencer o conjunto da esquerda. Talvez o pedido para mostrar o exame pode ajudar nesse processo.

Bolsonaro na CNN

Como você vê o “contrato de trabalho verde e amarelo”, aprovado sob a justificativa de que vai gerar mais empregos entre jovens de 18 a 29 anos e entre idosos?

Terrível. Nós tentamos de tudo para impedir a aprovação na Câmara, mas a pressão do setor empresarial foi imensa. Ainda tem o Senado. O PT, no Senado, vai obstruir para tentar caducar a matéria, que vence segunda. Vamos ver. Na Comissão que tratou do tema fizemos o possível. Foram apresentadas mais de duas mil emendas, relatório em separado, conseguimos nos reunir, apesar do coronavírus, mas o Rodrigo Maia conseguiu maioria para pautar, colocou em votação e aprovou, com o apoio, claro, da Confederação Nacional das Indústrias, da Fiemg e Fiesp e dos bancos. A ordem veio daí.

Ou seja, apesar de haver o acordo de não pautar, nas sessões remotas, matérias que não fossem sobre coronavírus, o Maia colocou a MP 905 em votação. Ela tem uma série de problemas, que alteram completamente a relação empregador-empregado. Entre eles, eu destaco o fim do décimo terceiro, do um terço de férias, a redução da multa para demissão de 40% para 20% e o fim do FGTS desses trabalhadores.

Eles alegam que o projeto apenas divide o pagamento do décimo terceiro em 12 parcelas, mas, na prática, isso acaba com o direito. Então, a carteira verde e amarela retira direitos básicos previstos na Constituição e incentiva, ou possibilita, a demissão de outros trabalhadores. Já que, para o empregador, a redução da multa vale a pena. O patrão vai poder demitir o trabalhador que tem a carteira azul para contratar, até 25% dos trabalhadores, com a carteira verde e amarela. Isso é um verdadeiro absurdo. O que eles chamam de novos empregos é, na verdade, a substituição de empregos com direitos por jovens entre 18 e 29 anos e idosos sem direitos.

Além disso, conseguiram colocar o que o Temer não havia conseguido na reforma trabalhista: a prevalência do negociado sobre o legislado. E isso para todos os trabalhadores. Não apenas em relação à nova carteira. Ou seja, com exceção do que está na Constituição, o que é da CLT pode ser flexibilizado por contrato individual do trabalhador. Em momentos de crise e de desemprego, o que acontece? Ou o trabalhador aceita ou é substituído por outro. Então, retira os direitos por meio de uma negociação, “individual”, que não precisa nem do respaldo dos sindicatos. Um verdadeiro absurdo, que acaba com toda a legislação trabalhista num artigo. Isso só para citar dois pontos.

O que você acha do discurso de que é preferível “ter empregos do que ter direitos”, repetido por muitos durante a aprovação da MP?

Eles falavam a mesma coisa na época da escravidão: “é preferível ficar na senzala e ter o que comer, do que ficar livre e morrer de fome”. A lógica é a mesma, é o mesmo discurso. O presidente Rodrigo Maia ter pautado isso abalou muito a união que vinha sendo construída no parlamento para o enfrentamento ao coronavírus. Fazer isso sem que pudéssemos estar lá, foi muito ruim. Votar isso remotamente não foi legal. O acordo era votar projetos relacionados à covid-19. Nesse caso, juntou a fome com a vontade de comer. Ou seja, na hora de retirar direitos dos trabalhadores, o centrão se junta com a extrema direita com enorme facilidade. A oposição foi contra a inclusão da matéria na pauta, mas o Maia conseguiu maioria, pautou e aprovou.

E o problema não é agora, mas, sim, depois que a crise passar. O achatamento dos salários, a retirada de direitos, vai acontecer após o coronavírus. Então, pautaram isso para garantir a recuperação dos lucros nas costas dos trabalhadores, acelerando a exploração.  Aprovaram com a bênção dos bancos, beneficiados, por exemplo, com o aumento da jornada para oito horas e a autorização para trabalho aos sábados. Conseguimos retirar do texto o trabalho aos domingos.