Algum tempo atrás, fiz para uma revista uma lista com os 10 melhores romances eróticos da história da literatura.
Só fui me dar conta da injustiça que cometi quando reli um grande livro: O Amante de Lady Chatterley, de DH Lawrence.
Não o coloquei na lista. Errei.
É um primor, e não apenas pelo intenso conteúdo sexual. A força da narrativa, a limpidez da prosa, o ritmo da história são primorosos.
Lady Chatterley merece um lugar ao lado de Madame Bovary, Capitu e Ana Karênina como uma das mais notáveis adúlteras da ficção. O marido, impotente e aleijado por um ferimento na Primeira Guerra, não a pode satisfazer como mulher. Ela tem fogo, e ele se transformou em gelo. O resto é consequência.
É tamanha a importância da obra de Lawrence que um intelectual situou o início do movimento de libertação sexual em algum ponto entre o fim do banimento de O Amante de Lady Chatterley e a chegada dos Beatles. (O livro permaneceu proibido do final dos anos 20 até o começo dos 60, sob o argumento de que é obsceno.)
Há uma sabedoria notável no romance de Lawrence.
Numa conversa, perguntam a um homem se ele acredita no amor. A resposta é não. “No que você acredita?, então?”, continuam. “Eu? Ah, intelectualmente eu acredito em ter um bom coração, um pênis firme, uma inteligência vívida e a coragem de dizer ‘merda’ na frente de uma dama.”
Sócrates não diria coisa mais sábia.
O homem feliz é essencialmente o homem potente. Nm livro, Philip Roth conta o dilema de um homem entre a vida e a potência. Cardíaco, teria que tomar remédios que o inviabilizariam como amante. Ele prefere morrer potente.
São atuais e provocativas as conversas que você vê no livro de Lawrence sobre homens e mulheres em sua eterna luta para se compatilizar e se satisfazer sexualmente.
Lawrence traça um retrato soberbo da classe privilegiada inglesa nos primórdios do século XIX. O império britânico já começava a se desintegrar. Lady Chatterley, numa cena, é sodomizada pelo caseiro da propriedade de seu marido.
É simbólico.
Mais que apenas uma lady, era toda uma casta de privilegiados e esnobes – a upper middle class, cultivada ao longo de muitas décadas de exploração das colônias – que estava sendo submetida a uma sodomização da qual jamais se recuperaria inteiramente.
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