O “lindão” Carlos Fernando precisa vir a público pedir desculpas por ter ficado calado até hoje. Por Mauro Donato

Atualizado em 19 de julho de 2019 às 0:21
Carlos Fernando dos Santos Lima

Dos novos diálogos da ‘vazajato’ revelados hoje, uma conversa entre Deltan Dallagnol e o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima é altamente reveladora (como se tudo o mais não fosse).

“O que vejo agora é um tipo de barganha onde se quer jogar para a plateia, dobrar demasiado o colaborador, submeter o advogado, sem realmente ir em frente. Não sei fazer negociação como se fosse um turco. Isso até é contrário à boa-fé”, escreveu Carlos Fernando.

“A boa-fé nos acordos de colaboração premiada deve ser interpretada de forma a ter em consideração o équo e concreto balanceamento dos direitos e dos deveres das partes no que abrange a investigação e a condução do processo criminal”, explica Andrea Marighetto, professor e advogado, doutor em Direito pela Universidade de Roma La Sapienza.

Sergio Moro impunha condições para aceitar delações. Muitas vezes exigindo que o colaborador ficasse preso durante um ano, no mínimo.

As mensagens hoje divulgadas demonstram que já havia procuradores incomodados com a postura de Sergio Moro (impondo penas até que o delator confessasse o desejado) e com a subserviência do chefe da força-tarefa.

Para chegar onde chegou, está mais do que evidente que Moro atropelava a tudo e a todos, e subordinado é subordinado. Manda quem pode, obedece quem tem juízo. Mas Carlos Fernando dos Santos Lima deixou a operação Lava Jato em setembro de 2018. Continuou conivente. E aí?

A nova compilação de diálogos traz um Deltan profundamente submisso, que não dá um passo sem consultar Moro ou então desestimulando seus subordinados que reivindicassem uma autonomia mínima.

“Carlos, eu apoiei todos os acordos que vc fez. Essa autonomia não está existindo em nenhum setor”;

“A título de sugestão, seria bom sondar Moro quanto aos patamares estabelecidos”;

“Podemos até fazer fora do que ele colocou, mas tem que falar com ele sob pena de ele dizer que ignoramos o que ele disse”;

“Carlos Vc quer fazer os acordos da Camargo mesmo com pena de que o Moro discorde? Acho perigoso pro relacionamento fazer sem ir FALAR com ele”.

Estas foram as mensagens enviadas por Deltan para Carlos Fernando (a quem chama de ‘lindão’) quando a interferência de Moro já dava sinais que transbordaria a legalidade. O papel de Deltan sempre foi o de escudeiro do juiz.
Um escudeiro ameaçador. O que quis dizer com ‘perigoso’?

“O procedimento de delação virou um caos. Creio que se a sua divisão de serviço pressupõe que eu e Januário estamos encarregados dos acordos, eles devem ser tratados por nós (…) Eu desejo que sejam estabelecidas pautas razoáveis, e que eu e Januário possamos trabalhar com mais liberdade”, pedia Carlos Fernando.

Em vão. A cada passo da equipe, Deltan pedia a benção ao todo poderoso: “Vejo vantagens pragmáticas de homologar por aqui, mas não quisemos avançar sem sua concordância. Podemos prosseguir”, escreveu ele a Moro.

Dava para trabalhar assim? A própria equipe enxergava “barganha”, “jogar para a plateia”, além de uma ingerência irregular do juiz que julgaria (não há redundância aqui).

Mesmo não sendo ‘noviças virgens’ (palavras do lindão), alguns procuradores percebiam que andavam fora da linha. Por que não gritaram?

Esse comportamento acabou por se diluir e Moro teve caminho livre para alcançar seus objetivos. Todos eles, mesmo os mais improváveis. Pergunte a qualquer juizeco de primeira instância qual a possibilidade ele vê em tornar-se ministro da Justiça num espaço de 3 ou 4 anos.

Moro permanece com a ladainha de que não reconhece as mensagens como autênticas. Mas a quantidade de delatores que agora admite terem sido coagidos e o cruzamento cronológico dos fatos com as mensagens, irá demandar um pouco mais de criatividade na justificativa ‘hacker’.