“O medo não é maior que a urgência”, diz ao DCM a deputada Talíria Petrone, ameaçada de morte e sem escolta

Atualizado em 30 de junho de 2019 às 12:45
Talíria Petrone

Talíria Petrone tem 34 anos e é deputada federal pelo PSOL. Foi jogadora de vôlei e tornou-se vereadora por Niterói em 2017. Por ser militante dos direitos humanos, do movimento negro, do feminismo e dos direitos LGBT, Talíria sofre ameaças de morte desde quando optou pela vida pública.

Há dois meses, a Polícia Federal informou a parlamentar de um plano para assassiná-la que existe desde 2018, incluindo ameaças de morte. Talíria solicitou, então, ao governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, uma escolta.

Witzel negou a escolta armada para a deputada eleita por Niterói. Para entender o caso, as ameaças e o descaso das autoridades, o DCM entrevistou Talíria Petrone.

Diário do Centro do Mundo: A polícia disse que há um plano pra te assassinar. Não parece o caso do Marcelo Freixo? A polícia disse se isso tem ligação com o caso Marielle Franco?

Talíria Petrone: Não. É impossível relacionar com um ou outro. Não divulgamos mais detalhes por orientação da própria Polícia Federal e não tem nenhuma relação com outros casos que possa ser comprovada. A Deep Web é um local muito difícil de identificar quem são os infratores e eu não poderia dizer que existe essa relação.

DCM: As informações são da Dark Web. A gente teve outros casos que vieram de lá, como o crime em Suzano. O seu caso também tem conexão com fóruns de chans, por exemplo?

TP: O que eu posso dizer, a partir de um compromisso que firmei com a PF, é que está lá. Tenho medo de falar mais e acabar atrapalhando as investigações deles. Não tenho condição de te falar mais, infelizmente.

DCM: O governo Witzel disse que submeteu o pedido de segurança para a PF. É só desculpa para se omitir, certo?

TP: Primeiramente, ele teve dois meses pra se posicionar. A gente não tinha pretensão nenhuma de divulgar nada, mas foram dois ofícios através do presidente Rodrigo Maia e um pela bancada do PSOL pra nada. Houve uma resposta negativa antes e outra somente depois que a imprensa pressionou, o que é grave e vergonhoso para um governador.

Witzel ignorou que uma parlamentar que nem está no estado dele foi ameaçada. Em seguida, sua resposta foi negando essa proteção.

A gente reafirma, então, que uma parlamentar eleita ameaçada é uma ameaça à democracia. É uma obrigação do Estado garantir a segurança do povo e de seus representantes.

DCM: No final das contas, você vai ter a escolta da Polícia Federal no Rio?

TP: Olha, a gente vai tentar uma nova conversa com o governador do estado ou até com o Rodrigo Maia para tentar uma solução. A própria Polícia Federal afirmou que não é uma atribuição dela esse tipo de proteção. É uma atribuição dos estados. Tô no limite de agenda e é inadmissível cercear o trabalho pelo qual foi eleita.

DCM: A gente sabe que você não pode dar detalhes para não comprometer as investigações, mas sabemos que você sofre ameaças desde a época que era vereadora. Essas novas são mais graves?

TP: Na verdade é um conjunto de coisas. Eu já tive ameaças na época de vereadora nas redes que hoje acabam normalizadas.

DCM: A gente acaba normalizando, né?

TP: Sim, nesses espaços já ouvi que: ‘você merece uma 9 milímetros na sua nuca’. Outros disseram que eu deveria tomar pauladas. No entanto, depois, aconteceram ameaças mais concretas. Teve um homem que ligou por muitas horas na sede do PSOL em Niterói falando que queria me matar. Pedindo o telefone ‘da piranha que o PSOL elegeu’. Monitoramos gente armada diante do nosso comitê de campanha nessa última eleição.

Eu já tive escolta da Polícia Militar depois da morte de Marielle. Então, eu já vi de fato situações mais concretas antes desse último episódio. A diferença nesse é que a polícia federal foi quem entrou em contato pedindo cautela e medidas de proteção. Isso se soma como mais um episódio de violência política que, desde quando topei ser parlamentar, eu enfrento. Vivencio.

DCM: Como você tá vivendo isso?

TP: Tento o máximo possível manter minha família fora da vida pública. Não quero envolver essas pessoas embora elas estejam automaticamente envolvidas. Tento mudar hábitos, sair menos. É uma restrição muito grande.

A gente tá acostumada a pensar o Estado Democrático de Direito brasileiro e parlamentares, não só o meu caso específico, formam um conjunto preocupante. Temos uma parlamentar que foi executada há um ano e meio quase, sem solução. Temos mais dois [David Miranda e Marcelo Freixo] também em situação delicada.

Pessoalmente muda muito minha forma de viver. Sou uma pessoa da rua, das praças, e isso é bastante grave, né? Lamentavelmente a democracia brasileira está em risco.

DCM: Mesmo com tantas ameaças, é formidável ainda assim ver o desempenho do PSOL no Legislativo, barrando os retrocessos de Bolsonaro…

TP: Acho que a gente não tem escolha, sabe? Especialmente depois da execução da Marielle. Isso, que já existia, ficou ainda mais explícito. Os males não começaram na eleição de Bolsonaro. O golpe institucional que a presidenta Dilma sofreu, mesmo eu sendo oposição, e as execuções no campo deram o início.

A eleição de Jair Bolsonaro inaugura um tempo em que não se importam com o povo nas ruas. Eles acham que tem que matar mesmo.

Isso é grave e dá medo. Mas o medo não é maior do que a certeza e a urgência que foram despertados com a morte da Marielle. Não é uma escolha a luta, é uma necessidade que o PSOL se agarra e não temos como abrir mão.