O Partido Comunista da China e o marxismo, 104 anos depois. Por Elias Jabbour

Atualizado em 1 de julho de 2025 às 10:03
O secretário-geral do Comitê Central do Partido Comunista da China (PCCh), Xi Jinping

POR ELIAS JABBOUR, professor Associado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Escrito em colaboração com o Grupo de Mídia da China

No dia 1º de julho de 1921, foi fundado o Partido Comunista da China (PCCh). Antes disso, a primeira versão do “Manifesto Comunista” de Marx e Engels havia sido traduzida ao mandarim em 1920. Em 1917, a Revolução Russa abriu as portas para uma nova era histórica, que moldou a trajetória da humanidade até os dias atuais, com um impacto profundo sobre a China. A grande questão que muitos políticos e intelectuais tentam responder é como uma força política com apenas 28 anos de existência em 1949 não só alcançou o poder político, mas o manteve, e mais ainda, como ela foi capaz de transformar não só profundamente seu próprio país, mas também o mundo.

Em um discurso alusivo ao centenário de fundação do PCCh, o presidente chinês Xi Jinping apresentou uma explicação clara, sem ser simplista: “Temos de continuar a adaptar o marxismo à realidade chinesa. O marxismo é o pensamento-guia fundamental do nosso Partido e do nosso país. Ele é a alma e a bandeira do PCCh. É por aderir aos princípios básicos do marxismo, buscar a verdade nos fatos e partir das condições chinesas que o PCCh conseguiu enxergar as principais tendências dos tempos, tomar a iniciativa histórica e realizar árduas buscas, promovendo sem cessar a adaptação do marxismo ao contexto chinês e às necessidades do nosso tempo e orientando o povo chinês no avanço da nossa grande revolução social. Por que o PCCh é capaz? Porque, em última análise, o marxismo funciona.”

Essa é a grande razão pela qual o PCCh não apenas alcançou rapidamente o poder nacional, mas também tem sido capaz de superar grandes desafios históricos e conjunturas desfavoráveis. Como disse Xi Jinping, “o marxismo funciona”. E só pode funcionar quando se desenvolve em plena consonância com a realidade particular de cada país. Na China, os comunistas criaram sua própria estratégia de tomada de poder, baseada no cerco das cidades pelo campo, tendo o marxismo como base fundamental. O marxismo venceu na China por ter se tornado uma doutrina científica chinesa. Desde a década de 1930, o PCCh tem demonstrado uma impressionante capacidade de adaptação do marxismo, tanto à realidade chinesa quanto às tarefas impostas pelo processo de revolução e construção no país.

O conceito-força de “socialismo com características chinesas” é um desdobramento do socialismo científico de Marx, Engels e Lênin, que tem sido enriquecido por cada geração dirigente do país. As “características chinesas” nos impulsionam a observar o nível de desenvolvimento das forças produtivas do país, assim como a integração do marxismo com a vasta herança filosófica desenvolvida ao longo dos 5.000 anos de civilização chinesa.

O desafio atual é o desenvolvimento do “marxismo chinês” à luz do “pensamento de Xi Jinping sobre o socialismo com características chinesas na nova era”. Essa “nova era” é caracterizada pelo aumento dos desafios impostos pela conjuntura internacional ao projeto chinês, bem como pelas novas contradições que surgem à luz de décadas de rápido e acelerado desenvolvimento das forças produtivas no país. Um exemplo do desenvolvimento teórico chinês é a tarefa de construir um mundo com um futuro compartilhado, em contraposição ao imperialismo e ao hegemonismo.

Nas palavras de Xi Jinping: “Temos de continuar a promover a criação de uma comunidade de futuro compartilhado para a humanidade. Paz, concórdia e harmonia são ideias que a nação chinesa vem perseguindo e desenvolvendo por mais de cinco milênios. E em seus genes, a nação chinesa não carrega traços agressivos ou hegemônicos. O PCCh se preocupa com o futuro da humanidade e deseja avançar de mãos dadas com todas as forças progressistas do mundo. A China se dedica sempre a promover a paz mundial, contribuir para o desenvolvimento global e salvaguardar a ordem internacional.”

Outro importante avanço do marxismo chinês é a “filosofia do desenvolvimento centrado no povo”. Na história do capitalismo, a ciência econômica propôs vários modelos de desenvolvimento econômico que poderiam ser “liderados pelo Estado” ou “guiados pelo mercado”. As primeiras experiências socialistas replicaram muitos dos modelos de desenvolvimento guiados pelo Estado, o que não foi um problema por si só, mas a moldura de “Estado x mercado” limita muito a capacidade de observar, não apenas como o desenvolvimento ocorre, mas também a quem interessa determinado modelo de desenvolvimento.

A filosofia do “desenvolvimento centrado no povo” é uma filosofia sem apriorismos, portanto fiel ao pensamento de Mao Zedong, baseado na “busca da verdade nos fatos” e na transformação da “prática no único critério para aferir a verdade”. A verdade, neste caso, é se o desenvolvimento é centrado em resultados práticos e positivos na vida do povo. Trata-se de uma filosofia que se constrói na prática e é sustentada por poderosas noções-chave criadas ao longo do tempo pela governança comunista chinesa. Refere-se às noções de “servir o povo” e “o povo em primeiro lugar”.

O marxismo na China deixou de ser uma abstração para se tornar uma força concreta que dá direção a um poder político de novo tipo. Colocar o povo em primeiro lugar é um princípio-chave que une o pensamento clássico chinês ao marxismo.

O presidente Xi Jinping sintetiza este princípio da seguinte forma: “Como dizia um antigo filósofo: ‘aquele que compartilha os interesses com o povo de todo o mundo será apoiado por todo o mundo; aquele que monopoliza os interesses para si mesmo terá pessoas de todo o mundo conspirando contra ele.’ O Estatuto do nosso Partido estipula que o nosso Partido não tem outros interesses particulares e, a todo momento, antepõe a tudo os interesses das massas. Trata-se de uma característica óbvia que distingue o PCCh, partido marxista, dos demais partidos políticos.”

Um poderoso corpo científico marxista, construído à luz da prática sintetizada, é um grande ponto a ser destacado neste centenário de fundação do PCCh.