O pedido de intervenção militar é o fruto maduro de uma sociedade apodrecida. Por Tiago Barbosa

Atualizado em 30 de maio de 2018 às 13:39

POR TIAGO BARBOSA

O temor de uma metamorfose dos protestos dos caminhoneiros em adesão maciça a uma intervenção militar é exemplo notório de como a ignorância política produz um exército de alienados quando adubada, por anos, com seletividade e manipulação das notícias.

O clamor difuso por uma solução autoritária constatada agora nos para-brisas e asfaltos do Brasil expressa a continuidade de uma campanha difamatória sobretudo contra políticos do campo progressista, cultivada diuturnamente há mais de uma década sob a alcunha de antipetismo.

A engrenagem da idiotização coletiva tem sido propositadamente azeitada para distrair as massas com infundados ataques de ódio e patriotismo de araque enquanto viabilizava o sequestro do estado e dos bens públicos por forças políticas conservadoras e vassalas do capital financeiro internacional.

Às vésperas das eleições de 2002, revistas pintavam Lula – hoje, convenientemente preso e impedido de disputar as eleições – como ameaça demoníaca aos (poucos) direitos conquistados pela sociedade.

A debacle petista no mensalão, anos depois, serviu como teste para a direita tentar, sem êxito, usurpar o poder. A aversão à esquerda, no entanto, era gestada com manchetes capazes de escamotear e desvalorizar conquistas cidadãs advindas com o sucesso de programas públicos igualitários.

A sucessão das passeatas dos amarelos da CBF a partir de 2013 representou a etapa seguinte da degeneração política coletiva e da consolidação do ódio.

A pretexto de derrubar Dilma, manifestações de violência, exortações militares (puníveis pela lei brasileira) e ode ao fascismo foram deliberadamente escondidas pela mídia e a Justiça para não arranhar a imagem simbólica de “um país contra o PT”.

Cabia, ali, a crítica aos levantes fascistas sem a necessidade de endosso às políticas do governo. O vale tudo ideológico deveria ser freado pela conscientização do brasileiro e pelo estímulo à participação responsável na sociedade. Mas o oportunismo venceu.

A alienação travestida de combate à corrupção, noticiada como arqui-inimiga ao país, fiou a atuação parcial, seletiva e persecutória do judiciário, patrocinou o desmonte da Petrobras, respaldou o esfacelamento da engenharia nacional e atirou a atividade política na berlinda – nem os golpistas, chafurdados na lama, escaparam.

A súplica pela intervenção militar em 2018 como saída para a crise política e econômica é o triunfo dessa cegueira tão cortejada.

A face mais cruel dela é o paradoxo de pobres avessos a causas populares, empresários contrários a medidas de estímulo ao consumo, nacionalistas a favor da entrega da Petrobras e “democratas” entusiastas de um regime autoritário.

Não à toa, como evidencia o noticiário de hoje, militares de patente mais baixa ensaiam descumprir ordens em claro ato de insubordinação contra as chefias.

Não adianta se esconder no medo e culpar o acaso pela bagunça criada pelo cultivo da desinformação: a ignorância política, fertilizada anos a fio, só exibe os frutos maduros de uma sociedade apodrecida.