O pernosticismo de Karnal, o amigo de Moro, ajuda a entender como Olavo ocupou espaço no Brasil. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 11 de abril de 2019 às 9:23
Karnal (dir.) com Moro e o ex-ministro de Temer Marcelo Callero: palestra no Ministério da Justiça

Platão fez Sócrates zombar de Tales de Mileto, considerado o primeiro filósofo do Ocidente.

Tales olhava para as estrelas e caiu num poço.

“Uma decidida e espirituosa rapariga da Trácia zombou dele, dizendo que procurava conhecer o que passava no céu, mas não via o que estava à sua frente, junto dos próprios pés”, diverte-se Sócrates.

Quando você depara com um nefelibata rico como Leandro Karnal, entende como um Olavo de Carvalho acabou ocupando espaço no Brasil.

Karnal tem lugar amplo e garantido na mídia, é best seller, dá conferências em universidades, empresas, batizados, tem aquela careca e o sorriso alvo que lhe conferem um certo carisma.

Sucesso. Poderia ser um contraponto à barbárie de Olavo no campo, digamos, intelectual.

Prefere esvaziar a mente de um público quer tem preguiça de ler livro.

E cabeça vazia é oficina do Olavo.

Dia desses, a convite de Sergio Moro, palestrou no Ministério da Justiça sobre o artigo 37 da Constituição e “o patrimonialismo do Estado”.

“Compartilhei espaço de fala com o deputado Marcelo Callero e seu enfrentamento no governo Temer”, escreveu.

“Espaço de fala” é de chorar sentado, mas sigamos.

Karnal serviu de papagaio de pirata para Moro — a quem tietou num jantar famoso em 2017 —, cujo projeto anticrime contém abjeções morais.

O que o professor acha do “excludente de ilicitude”?

E da ideia de reduzir a pena do policial até a metade ou deixar de aplicá-la caso “o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção”?

Provavelmente acha muita coisa, mas não vai revelar.

Está mais preocupado com o “pensamento cetáceo”, tema de sua coluna no Estadão de ontem.

É uma das coisas mais pernósticas jamais publicadas em qualquer lugar desde o início dos tempos.

Resumindo um blábláblá idiota, trata-se de um conceito que Karnal inventou, o “costume de voltar a um foco já largado em oceano passado e sem nenhuma introdução”.

Toma Fosfosol, amigo.

Eu vou reproduzir um trecho porque não quero sofrer rindo sozinho:

As baleias são mamíferos que podem mergulhar a profundidades abissais. Porém, o apelo da respiração acaba chegando. Como os golfinhos, podem morrer afogadas nas águas em que nasceram.

Boas nadadoras e exímias mergulhadoras, porém, continuam mamíferas e dependentes dos pulmões. Na superfície, só as vemos quando respiram. A superfície é a conversa audível. Ali, estamos nos vendo, baleias, golfinhos, navegadores e flutuadores em geral.

O tema submerge na vastidão dos oceanos. Em graciosos movimentos ondulatórios, o tópico volta mais adiante, quando, para quem está na superfície, ninguém mais pensa nele.

Talquei?

Enquanto o Brasil afunda, Leandro Karnal, como Roberto Carlos, conversa com as baleias.