Bolsonaro

O poder militar entrou em estado de torpor langoroso. Por Moisés Mendes

Reprodução

Por que o senador Hamilton Mourão revisou, um dia depois, o discurso que havia feito na tribuna, incitando uma rebelião dos militares contra o Supremo?

Porque o general sabe que hoje, nas complicadas circunstâncias políticas vividas por seus colegas golpistas, não conseguiria liderar nem mesmo a organização de um torneio de peteca no Clube Militar.

Os generais entraram em estado letárgico. Mourão e qualquer outro general brasileiro, da ativa ou da reserva, não têm condições de afrontar, com algum efeito, nenhuma instituição da República. Hoje, nenhuma.

Os alarmistas sabem que não há como Mourão organizar levante algum. Mas mesmo assim há quem continue disseminando alarmes de que Mourão pode isso e aquilo.

Ao se declarar legalista, no dia seguinte ao grito de guerra em defesa dos estafetas de Bolsonaro, Mourão substitui o blefe por um pouco de razão, algo raro há muito tempo nos estoques de sentimentos da extrema direita.

Mourão sabe que foi a razão precária dos que resistiram, combinada com uma boa porção de covardia de Bolsonaro e dos golpistas fardados, que atrapalhou o golpe armado com os generais Braga Netto e Augusto Heleno e seus subalternos.

Se generais da reserva e da ativa, desfrutando do poder que eles tutelavam, não conseguiram levar o golpe adiante, quem imagina que agora, com todos cercados, o bravo Hamilton Mourão, sem tropas e sem poder, possa fazer uma afronta prosperar?

Mourão blefou porque colegas ofendidos o empurraram para a gritaria, cobrando posição de quem tem mandato. Foi só isso. Foi o blefe de um político levado na marra para a tribuna.

Um impulso que ele corrigiu no dia seguinte. Já passou. Mourão cumpriu carnê, fez a sua parte, jogou para a torcida e vai se aquietar, por saber que nem sob a proteção das almas de todos os generais da ditadura conseguiria atiçar uma rebelião hoje. A chance é nenhuma. Zero.

Mas isso significa que tudo está sob controle? Claro que não está. A melhor análise da situação vivida por Mourão e seus colegas, ativos e inativos, foi feita por Tereza Cruvinel, no Brasil 247.

O momento, escreveu a jornalista, é não só de contenção no curto prazo, mas de ação no sentido de evitar repetições e a preservação da índole militar golpista.

O resumo do artigo está no título: “Lula tem sua melhor hora para fazer a reforma militar”. Tereza escreve que “o DNA da tutela, que se traduz em ímpetos golpistas, continua lá”. Um DNA que não desaparecerá com a punição dos articuladores do golpe pela Justiça e tampouco com penas disciplinares, nem mesmo com expulsões.

As Forças Armadas estão caindo aos pedaços, com a exposição das provas do golpe, produzidas pelo líder da reunião filmada, e essa é a hora de Lula agir para a condução de reformas em quatro frentes fundamentais (leiam o artigo de Tereza).

É nesse contexto que se encontram Hamilton Mourão, seus colegas com camuflagens ou com pijamas e todos os que eram orientados pelos militares.

Não há como imaginar que Mourão possa organizar e levar adiante afrontas ao STF. O que não exclui as iniciativas do PSOL para que se investigue se houve crime de incitação do general contra as instituições.

Mourão pode ter fingido que era possível incitar um levante, mas está satisfeito com o que já fez e convencido de que não precisa fazer mais nada. Tem mandato como senador medíocre, com um poder político a ser construído. Poder que nunca teve no governo.

O grande blefe do golpe que não deu certo não precisa da compensação de outros pequenos blefes para que as Forças Armadas sejam defendidas. Que os militares tirem lições também desse momento de torpor langoroso.

Publicado originalmente no Blog do Moisés Mendes

Participe de nosso canal no WhatsApp, clique neste link

Entre em nosso canal no Telegram, clique neste link

Moisés Mendes

Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/

Disqus Comments Loading...
Share
Published by
Moisés Mendes

Recent Posts

Promotor do Tribunal Penal Internacional pede prisão de Netanyahu e de líder do Hamas

O Promotor-chefe do Tribunal Penal Internacional, Karim Khan, solicitou à corte que emita mandados de…

26 minutos ago

Chora por ti Rio Grande. Por Aldo Fornazieri

Por Aldo Fornazieri Chora por ti Rio Grande. O teu choro é o choro do…

39 minutos ago

Crise no RS revela identidade ideológica de Leite com ideário da extrema-direita. Por Jeferson Miola

O governador tucano Eduardo Leite confessou em entrevista [FSP, 20/5] que recebeu com antecedência os…

47 minutos ago

Eduardo Leite sugere adiar eleições no RS: “Podem atrapalhar”

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), sugeriu o adiamento das eleições…

1 hora ago

Família paga resgate milionário, mas esposa de herdeiro continua desaparecida

O caso envolvendo o desaparecimento de Anic de Almeida Peixoto Herdy, de 54 anos, teve…

2 horas ago

Leite admite que não investiu em prevenção de enchentes no RS por “questão fiscal”

Em entrevista à Folha de S.Paulo, publicada nesta segunda-feira (20), o governador do Rio Grande…

2 horas ago