O Problema da China

Atualizado em 12 de junho de 2013 às 18:26
Russell

Estou lendo “O Problema da China”, de Bertrand Russell, um dos grandes intelectuais ingleses do início do século 20.

Dele li – e jamais me desfi em minhas periódicas arrumações na biblioteca – a História da Filosofia Ocidental, em três volumes.

“O Problema da Índia” é um livro já com quase 100 anos – e estranhamente oportuno e atual. É um livro ao mesmo tempo de viagem (Russell esteve na China), de história e de filosofia.

Chamou a atenção de Russell, nas conversas que teve com chineses, que eles pareciam tentar entendê-lo e não convencê-lo de que as idéias deles eram melhores.

Russel relembra o momento em que o Ocidente esticou os olhos pela primeira vez para a China. Foi em meados do século XIX.  Uma  enorme comitiva naval britânica, liderada por Lord McCartney, foi à China para tentar vender produtos novos, como telescópios.

O imperador respondeu polidamente que a China não precisava de nenhuma das engenhocas que os estrangeiros produziam. Os chineses estavam felizes com o que eles próprios faziam.

Não foi uma resposta que agradasse aos vendedores. Os ocidentais, então como agora, estavam simplesmente malucos pelas possibilidades oferecidas pelo monumental mercado chinês. Esse mercado seria conquistado não pela negociação, não pelo convencimento, mas pelas armas.

Não muito depois da fracassada viagem de McCartney, veio o que seria conhecido como “O Século da Humilhação” da China. As duas Guerras do Ópio, primeiro. Nelas, ajudada por forças americanas, alemãs e francesas, a Inglaterra impôs aos chineses que aceitassem o comércio de ópio livremente no país. (Na Inglaterra, naturalmente, o ópio era proibido.) O dinheiro que a Inglaterra fazia com o ópio equilibrou enfim as suas despesas de importação com o chá, a porcelana e a seda.

Eram assim portanto as relações comerciais entre a China e a Inglaterra. De um lado, na marra, era vendido o ópio. De outro, por opção, eram comprados chá, porcelana e seda.

Depois, o Japão derrotaria a China numa guerra. O pacote da humilhação receberia ainda o acréscimo do massacre dos Boxers. O nome “boxer” deriva exatamente de boxe. Eram guerreiros chineses que adotavam técnicas de combate parecidas com as do boxe. Revoltados com a presença ocidental, eles foram à luta. Imaginavam ter defesas divinas contra as balas ocidentais, mas a realidade logo os desmentiu.

Foram chacinados.

Russell lembra detalhes interessantes. Os “Poderes”, como ele chama os ocidentais vitoriosos, dominavam até a alfândega chinesa. O principal funcionário da alfândega na China, no tempo de Russel, era um inglês.

Os “Poderes” estipularam uma taxa insignificante de importação na China. No início, havia a justificativa de que também a Inglaterra agia assim. Era o primado do livre comércio. Só que depois os ingleses criaram uma lei que protegia a indústria local e taxava fortemente os produtos estrangeiros. Mas o “livre comércio” perdurou, pela força dos canhões, na China.

Russell nota que nós, ocidentais, temos a “ilusão” de que nossa civilização é superior, muito mais por ignorância do que por fatos objetivos.

Militarmente, sem dúvida, o Ocidente está acima. Enorme como é, a China jamais foi uma potência militar. No Tao Te King, um dos livros fundamentais para os chineses, está escrito que os melhores soldados são aqueles que “não lutam”.

O livro centenário de Russel (que achei no Ibooks do iPad) ajuda você a entender a China.

É uma pena, uma enorme pena, quenão exista uma versão em português.